A
Essencialidade na Arte
Cláudio Pastro
A luz em si se basta.
Ela é já sinal de Deus, a luz incriada.
Não há necessidade de acumular numa vela
sinais, cores, outros brilhos.
Pior ainda, inventar velas falsas, elétricas
“O olho é a luz do corpo.
Se
teu olho é são, todo o teu corpo
será iluminado. Mas se o teu olho está
doente, todo o teu corpo estará nas trevas.
Se
a luz que está em ti são trevas,
quão espessas deverão ser as trevas”.
(Mt 6, 22-23)
Olhar, a forma, a cor, o perfume, a arte,
linguagem universal e referencial para a vida, é uma expressão do espírito e do
homem. A obra de arte namora o espectador e ambos se transformam. Nosso olhar
está ofuscado na sociedade em que vivemos.
Não é um olhar límpido. Tudo está
poluído: as ruas, as casas, os negócios, os parques, as igrejas... Há uma
poluição visual e sonora intensa.
Assim, vamos nos acostumando a tudo o que
é contrário à luz, harmonia e beleza. Estamos desorientados (o contrário da luz
que nasce no oriente a cada manhã), perdidos, violentos e violentados.
Acostumamo-nos ao feio e passamos a
chamá-lo de belo. Esquecemos que o feio é parente da morte, nos desestrutura,
nos devora. O homem violento, desequilibrado, procura compensar acumulando
coisas, pessoas, sons, barulhos, prazeres... “Quanto mais melhor!”. Assim
pensamos atualmente.
Nem nos damos conta de que, acumulando,
nos distanciamos do minúsculo, do centro, do mínimo que é o pólo da vida. Já
não nos comunicamos, não enxergamos uma forma, uma cor, não ouvimos um pequeno
som básico que nos recuperaria, nos reorganizaria após experiências agitadas e
traumáticas. Os elementos da vida não precisam ser somados para nos dar a vida.
Um só elemento nos coloca no eixo vital:
um olhar, uma cor, um som ... O bom relacionamento não só com as pessoas, mas
com todos os elementos que compõem a vida, garante a própria vida.
Uma luz, uma cor, uma pedra, um pedaço de
madeira, um horizonte, um gesto... falam e têm vida em si. Ninguém tem vida
sozinho.
A obra de arte é reflexo do homem de seu
tempo, da cultura. É termômetro. Casas desorganizadas, ruas carregadas de
cartazes, jardins e monumentos pichados refletem um povo, uma cultura doente,
pobre, sem rumo.
A obra de arte é indicador, referencial,
farol.
Uma praça ou rua bem arrumada, limpa,
profissionalmente traçada, reflete no ser que por aí passa ou vive.
Organiza-se, também, interiormente, o morador ou transeunte.
Contemplar uma luz, a forma e a matéria
ou cor de um objeto, suas linhas agradáveis, ou sons que não alteram o
silêncio, comum a todos, faz bem, traz paz, reorganiza, reequilibra-nos quando
estamos decaídos.
Quando o olhar não sabe mais ver ou vê
apenas espaços desarrumados, então, podemos dizer que o olho está doente e “a
luz fictícia do desenvolvimento” é treva, escuridão e “não luz para os nossos
passos”.
No atual cristianismo, onde repousamos o
nosso olhar? Séculos e séculos foram mascarando a nossa fé. Acúmulos e pesos de
dogmas, de cartas morais, de títulos variados de santos e de “Nossas Senhoras”,
construções variadas de igrejas, santinhos comercializados... são acréscimos,
desrespeito para com o centro e razão da própria fé.
Basta entrarmos numa igreja católica e
veremos acúmulos de materiais, de formas, de barulhos, de elementos impostos
pelas próprias pessoas “em nome da fé”. Na frente do “muito”, não sabemos ser
UM com o UM (Deus), o princípio e único necessário para a vida. O Único Santo
que tudo santifica.
Vamos reaprender a olhar, a ser. Vamos
limpar o nosso olhar?
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