domingo, 29 de novembro de 2015

Imagens do Sagrado - Claúdio Pastro


Imagens do Sagrado
Claúdio Pastro

A seguir, mostramos um pouco da obra do brasileiro Cláudio Pastro, que está toda baseada nas proposições do Concílio Ecumênico Vaticano II. As imagens aqui mostradas são parte do livro Arte Sacra, recentemente publicado pela Editora Paulinas.

PLANETA – Toda sua obra é voltada para a arte sacra. O que levou você a escolher especificamente essa área?

Cláudio Pastro – Primeiro, eu me formei em ciências sociais, em 1972, pela PUC. Depois, talvez por uma formação cristã muito boa e por influência de algumas pessoas, eu achei que deveria entrar pela arte sacra. Sobretudo porque, há 30 anos, essa área não era nada valorizada. Aliás, para o Brasil, a arte sacra é barroco, e barroco, na verdade, é arte religiosa.

PLANETA – Qual a diferença básica entre arte religiosa e sacra?

Cláudio Pastro – A arte sacra é objetiva, ela vem da essência do mistério da própria religião. A arte religiosa é devocional, é subjetiva; ela vem do freguês, que opta por esse ou aquele santinho; não tem nada a ver com o mistério do cristianismo.

PLANETA – A arte sacra está mais ligada ao cristianismo primitivo...

Cláudio Pastro – Primitivo e na essência. Se o Concílio Vaticano II foi ecumênico, ela busca a essência das coisas, principalmente trazendo uma ecumine com as demais religiões sobretudo cristãs – luterana, presbiteriana, etc. Quer dizer, é um concílio que pede a unidade, que se faz na essência do mistério. A arte religiosa é muito particular. Por exemplo, Nossa Senhora de Fátima é subjetiva do povo português; ela não faz nenhuma falta para o mistério da Igreja.

 Cláudio Pastro: busca pessoal que resultou em 30 anos de dedicação à arte sacra.

PLANETA – Ao que parece, você foi criado muito próximo a padres, monges, mosteiros...

Cláudio Pastro – Sim, mas eu nunca estudei em colégio católico, estudei sempre em colégio do Estado, que aliás eram ótimos. Quando eu tinha cerca de 20 anos, minha vontade era ser monge, mas não cheguei a ter nenhuma ligação grande com os mosteiros. Tive ligação com certos monges, com certas pessoas do cristianismo, que me ajudaram muito, principalmente na própria arte sacra. Eram pessoas de vanguarda na Europa, que eu tive a sorte de encontrar. Elas me alertaram muito para a linha do meu trabalho.

 

PLANETA – Em 30 anos de profissão, você já pintou, reformou e concebeu arquitetonicamente mais de 230 igrejas e capelas no Brasil e no Exterior. Entre as suas obras, quais as que você elegeria como as principais, as suas preferidas?

Cláudio Pastro - Uma das principais é a Capela das Andrelinas, aqui no Bairro da Pompéia, que é justamente a que abre meu livro – Arte Sacra. Ela é bem clean...

PLANETA – Toda a sua obra é clean...

Cláudio Pastro – Mas essa, em especial. Depois, a gente pode citar a capela dos beneditinos de Brasília, que tem uma boa concepção arquitetônica e litúrgica a partir do Concílio Ecumênico. Ele está no livro também. Um outro trabalho bonito, que está sendo extremamente mal usado, é a capela da Rede Vida de Televisão. Eu fiz um terno para o caipira usar... Os padres não sabem usá-la, são cafonas, não sabem o valor dos gestos, do espaço. O próprio diretor da Rede Vida é um caipirão que tem muito dinheiro... Uma outra igreja bonita é a catedral de Campo Limpo, na zona Sul de São Paulo. A arquitetura não é minha, mas o interior é meu. Nesse caso, eu trabalhei com o Fábio Gonçalves, que é professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP. Eu gosto muito da Capela do Advento, na Alemanha; suas paredes são todas pretas...

PLANETA – Você não teve uma educação artística, mas é escultor, pintor, faz arquitetura... Como você explica isso?

Cláudio Pastro – Foi a minha busca, busca de criar espaços bonitos, expressivos dentro da Igreja católica. No início – eu comecei quando tinha cerca de 20 anos de idade –, eu buscava uma arte muito indígena e africana, bem primitiva. Eu queria caminhar naquela linha, porque não podia entender que o cristianismo no Brasil não pegou essa espiritualidade dos nossos índios e negros. Mas, assim que eu comecei a trabalhar, a Igreja católica me podou. Eu tenho de trabalhar para sobreviver, e as pessoas queriam aquela coisa melodramática, bonitinha, chorosa. Então, não pude avançar nessa área. Quando eu faço exposições na Europa, até que entro por aí. Os europeus se sentem felizes e compram adoidado. Mas aqui eu não posso nem ousar.

Por outro lado, em termos de arte, eu trabalhei nos 30 piores anos da Igreja católica no Brasil. Nessa época, por causa da situação local – ditadura, pobreza, etc. –, a Igreja deu ênfase apenas à questão social, não se preocupando com o ser espiritual, com a linguagem espiritual, com a cultura cristã. Era só eu que me debatia. O que levei de pontapé de bispos e de padres que hoje me adoram... Você não pode imaginar como eu sofri. Hoje já há equipes de arquitetos e de artistas que estão sendo promovidos pela CNBB, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. Eles começam a se destacar, mas estão encontrando “a cama pronta”, como a gente diz na linguagem mais simples; eu preparei tudo.

PLANETA – Qual é, para você, a finalidade da arte sacra?

Cláudio Pastro – A finalidade da arte sacra é permitir que o sagrado se manifeste ao homem, e não o contrário: o homem para Deus.

PLANETA – Você diria, então, que ela é uma arte de inspiração divina?

Cláudio Pastro – Na Igreja oriental, até hoje, e no primeiro milênio do cristianismo, a arte sacra e o artista faziam parte dos sagrados mistérios da Igreja. Logo depois do bispo, do padre, do diácono, vinha o artista, como um ministério dentro da Igreja. A partir do Concílio de Verona, a Igreja católica latina rompeu com o artista; ela o tirou do seu quadro de ministérios. Então, o artista foi se desenvolvendo como auto-suficiente. E aí surgiram Humboldt, Giotto, mais tarde Michelangelo, Rubens, Rafael, etc. Esses já são artistas autônomos, dos quais a Igreja se aproveitou. O padre estava precisando fazer uma pintura na sua igreja e convidava um artista famoso, Michelangelo, por exemplo. Necessariamente ele não tinha de ter fé, não tinha de fazer parte dos sagrados ministérios, etc. Ele era simplesmente um grande artista.

Esses artistas trabalharam muito na Igreja católica latina e não passaram uma arte sacra, mas uma arte religiosa, que é muito mais humana do que divina. Ela é muito mais reflexo do próprio artista, de sua concepção do que vem a ser o sagrado, o religioso como manifestação, quer dizer, não há a universalidade da arte sacra.
 

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