PROF. ERNESTO L SIENNA
O quarto evangelho, a princípio tem a mesma estrutura dos evangelhos
sinóticos: inicialmente mostra o testemunho de João Batista sobre Jesus, depois
apresenta várias passagens e acontecimentos da vida de Cristo, e termina com os
relatos de sua paixão, morte e ressurreição. No entanto destaca milagres ou
aspectos da pregação de Jesus que não são relatados pelos sinóticos: o início
da vida pública de Jesus nas bodas de Cana; a ressurreição de Lázaro; o lava
pés; a questão do paráclito; o longo discurso sobre o pão da vida que vem após
a multiplicação dos pães; é o único a apresentar as três grandes festas
judaicas; Jesus toma posse da fórmula “Eu sou”, que é própria de Deus. O
evangelho segundo João é o evangelho mais puro, o mais radical, o mais
teológico, com uma cristologia mais desenvolvida que se preocupa em apresentar
a divindade de Cristo.
Para o povo judeu do AT a fé está na lei de Moisés, no culto centrado em
Deus efetuado no templo, João vai colocar o eixo em Jesus. Jesus é a Lei, Jesus
substitui o templo e a fé está na pessoa de Cristo.
1. O Autor
A tradição antiga da Igreja identificou a autoria deste evangelho como
sendo de João o discípulo amado de Cristo. “Este é o discípulo que dá
testemunho dessas coisas e foi quem as escreveu: e sabemos que o seu testemunho
é verdadeiro” (21,24).
Santo Ireneu de Lião (+/- 125/140 dC) é o autor mais antigo que afirma a
autoria do quarto evangelho à João: “Em seguida, o discípulo do Senhor, o mesmo
que repousou sobre o seu peito, publicou também o evangelho durante sua estada
em Éfeso”.
2. A data
Provavelmente no final do primeiro século, entre os anos 90 e 100 dC, na
localidade de Éfeso.
3. Destinatário
Diferente dos evangelhos sinóticos que tem um destinatário concreto, Marcos
escreve para Romanos, Mateus para Judeus e Lucas para Gregos, João tem um
destino universal, pois escreve não para uma comunidade específica, mas para
todas as comunidades cristãs.
4. Objetivo de João
O propósito de João é inspirar nos leitores a fé em Jesus e está claro nas conclusões
finais do capítulo 20,30-31:
• Crer que Jesus é o Filho de Deus
• Para ter vida
5. Particularidades de
João
João usa de um material especial para desenvolver seus escritos, possui
bons conhecimentos históricos e topográficos. João não está preocupado em
mostrar um Jesus “histórico” do ponto de vista moderno, mas seu interesse é
levar o leitor, pelos olhos da fé, a raiz dos acontecimentos. Comparando as
parábolas vivas e cheias de sinais dos sinóticos com os discursos profundamente
teológicos de Jesus no evangelho de João mergulhamos numa realidade onde ele
procura revelar as verdades mais secretas e divinas.
Enquanto os sinóticos proclamam o Reino de Deus ou o Reino dos Céus no
escrito joanino a grande revelação é o próprio Jesus.
5.1 “Eu Sou”
A fórmula “Eu Sou” como a vemos no livro do Êxodo quando Deus se apresenta
à Moisés dizendo “Eu sou aquele é”, é própria do Criador, no entanto Jesus toma
posse desta expressão para auto-definir-se:
6,35 “Eu sou o pão da vida”
9,5 “Eu sou a luz do mundo”
10,7-9 “Eu sou a porta”
10,11-14 “Eu sou o bom pastor”
11,25 “Eu sou a ressurreição”
14,6 “Eu sou o caminho, a verdade e a vida”
15,1 “Eu sou a videira”
5.2 O Paráclito
João não usa a palavra Espírito Santo mas a expressão Paráclito várias
vezes nos discursos de despedidas dos discípulos, no entanto diferente do
evangelho de Lucas que apresente Jesus como cheio do Espírito Santo para João é
pelo Espírito Santo que se perpetua a presença de Jesus entre seus seguidores,
é o Espírito que nos ilumina e nos dá a conhecer profundamente a pessoa de
Jesus. (Espírito = Paráclito, Espírito da Verdade, Espírito Santo).
• Espírito enviado pelo Pai: 14,15-17: “e rogai ao Pai e ele vos dará outro
Paráclito, para que convosco permaneça para sempre”;
• Espírito enviado por Cristo: 16,7: “se eu não for o Paráclito não virá a
vós, mas se for envialo-ei à vós”;
• Para recordar todas as coisas: 14,26: “mas o Paráclito, o Espírito Santo
que o Pai enviará em meu nome, vos ensinará tudo e vos recordará tudo o que vos
disse”;
• Para revelar as coisas futuras e glorificar a Jesus: 16,13: “quando vier
o Espírito da Verdade, ele vos guiará na verdade plena...e vos anunciará as
coisas futuras”;
• Para testemunhar a Cristo: 15,26: “quando vier o Paráclito...dará
testemunho de mim”.
Conforme a tradução da Bíblia Ave Maria paráclito é uma palavra grega que
significa advogado, intercessor.
5.3 Os milagres de Jesus
João não utiliza a palavra milagres para falar das grandes realizações de
Jesus mas utiliza-se da expressão grega “semeion” que significa sinais.
Sinais significam o indício revelador de alguma coisa, pode ser um milagre
ou não. João apresenta seis sinais como forma de provar que Jesus é o enviado
do Pai e que o que interessa realmente não é o sinal em si mas o autor deste:
1º Bodas de Cana: 2,1-11;
2º Cura do filho do funcionário real: 4,46-54;
3º Cura do enfermo na piscina de Betesda: 5,2ss
4º Multiplicação dos pães: 6,5-14;
5º Cura do cego de nascença: 9,1-16;
6º Ressurreição de Lázaro: 11,1-44;
Sendo que o grande sinal, o de número sete, é sua própria ressurreição,
como forma de apresentar a perfeição dos tempos no Cristo ressuscitado.
Para o povo da Bíblia os números são muito significativos, o número 7
significa intensidade, perfeição. Porisso que quando Pedro pergunta à Jesus:
quantas vezes devemos perdoar 7? Jesus responde não 7 mas, deveis perdoar 70 x
7.
5.3 Eucaristia
Para os sinóticos Jesus instituiu a Eucaristia na quinta-feira santa. João
coloca na quinta-feira o relato do lava-pés, para dizer que a Eucaristia deve
levar à um gesto concreto, mostra Jesus como aquele que serve, como escravo.
(diakonia em grego = serviço).
Para João a Eucaristia se dá no capítulo 6,11 (multiplicação dos pães) onde
o que importa e dar graças e distribuir.
5.4 Jesus é o templo
Os evangelhos sinóticos narram a expulsão dos vendilhões do Templo como
acontecida na última Páscoa, no final do mistério de Jesus.
Para João este fato está na primeira Páscoa (2,13ss), quando Jesus começa a
pregar, pois para encontrar Deus o lugar não é mais o Templo, mas a própria
figura de Jesus. A partir de agora se adora em Espírito e Verdade.
5.5 As Festas Judaicas
Os Evangelhos sinóticos não têm interesse pelas festas Judaicas, e com
referência a Páscoa, sua principal festa, apresentam apenas a passagem de uma
Páscoa que se dá no último ano do Ministério de Jesus.
O Evangelista João mostra que conhece profundamente a cultura judaica,
apresentando no ministério de Jesus três Páscoas (três anos de vida pública),
além das outras principais festas Judaicas, como o Pentecostes, Tendas e a
Festa da Dedicação.
1ª Páscoa: Jo 2,13-22; acontece após o início de seu ministério com as
bodas de Cana.
Festa de Pentecostes: Jo 5,1, embora o texto não revele que era
pentecostes, subentende-se por que se dá logo após a descrição da primeira
Páscoa. (Pentecostes em grego significa qüinquagésimo, é a festa da colheita ou
das primícias realizada pelos judeus cinqüenta dias após a Páscoa).
2ª Páscoa: Jo 6,4; é a Páscoa precedida da multiplicação dos pães.
Festa das Tendas ou Tabernáculos: Jo 7,2, recordava os quarenta anos de
permanência do povo no deserto quando saíram do Egito.
Festa da Dedicação: Jo 10,22, dedicação ou purificação do Templo que havia
sido profanado no ano 200 aC.
3ª Páscoa: Jo 11,55; 12,1 e 13, 1, é a Páscoa da morte e Ressurreição de
Jesus, esta é apresentada pelos quatro evangelistas.
Com este estilo teológico de escrever João quer mostrar que com a vinda de
Jesus termina o culto antigo representado pelas festas e pelo Templo. O novo
Templo agora é Jesus e a Ele se deve o culto, este é o sentido da vida de
Cristo.
5.6 Jesus é o Logos
Para os sinóticos a divindade de Jesus vai se revelando aos poucos.
João apresenta Jesus desde o princípio como o messias o filho de Deus
(1,1-2.14).
João ainda usa a palavra verbo para dar dinâmica a Jesus.
5.7 Títulos de Jesus
Mateus: Emanuel (1,23 – 28,20);
Marcos: Filho de Deus (1.1 – 15,39);
Lucas: não há título específico mas Jesus é o possuído pelo Espírito Santo;
João apresenta Jesus como o cordeiro de Deus 1,29 – 19,36.
5.8 O discípulo que
Jesus amava
A expressão “o discípulo que Jesus amava” aparece em João cinco vezes, isto
é um fato enigmático:
1. no anúncio da traição (13,22): “Estava à mesa, ao lado de Jesus, um de
seus discípulos, aquele que Jesus amava”;
2. aos pés da cruz (19,25-26): “Perto da cruz de Jesus permaneciam de pé
sua mãe, a irmã de sua mãe, Maria mulher de Cleofas, e Maria Madalena. Jesus,
então, vendo sua mãe, e perto dela, o discípulo a quem amava”;
3. no sepulcro (20,2): “Maria Madalena...corre, então e vai a Simão Pedro e
ao outro discípulo, que Jesus amava”;
4. reconhece Jesus a beira do lago de Tiberíades (21,7): “Aquele discípulo
que Jesus amava disse então a Pedro: É o Senhor”;
5. Pedro vê o discípulo (21,20): “Pedro, voltando-se, viu que o seguia o
discípulo que Jesus amava”.
5.9 Interlocutores de
Jesus
Ao invés das parábolas João usa de vários diálogos com Jesus. Seus
principais interlocutores são: Nicodemos, a Samaritana, a multidão, as irmãs de
Lázaro....
5.10 Oração
Mateus e Lucas apresentam o Pai nosso.
Lucas mostra Jesus orante em muitos momentos decisivos.
João apresenta a Oração sacerdotal no capítulo 17: oração pelos 12
5.11 Eclesiologia
Profissão de amor de Pedro 21,15-17, “apascenta minhas ovelhas”.
Barca, pesca, rede...
Quadro sintético Evangelhos Sinóticos
7 - Referências
bibliográficas
• BÍBLIA. Português. Bíblia de Jerusalém. Paulus: São Paulo, 2004.
• BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada. Editora Ave Maria: São Paulo, 2004.
• BÍBLIA. Português. Tradução Ecumênica da Bíblia – TEB. Edições Loyola:
São Paulo, 1997.
• CHOURAQUI, André. A Bíblia – João (O Evangelho segundo João). Imago
Editora Ltda: Rio de Janeiro, 1996.
• DATTLER, Frederico. Sinopse dos Quatro Evangelhos. Paulus: São Paulo,
2003.
•FONSATTI, José Carlos. Introdução à Bíblia. Editora Vozes: Petrópolis,
2002.
• HARRINGTON, Wilfrid John. Chave para a Bíblia: a revelação: a promessa :
a realização. Paulus: São Paulo, 1985.
• LIBÂNIO, João Batista. Jesus na perspectiva de Marcos, Mateus, Lucas e
João. Paulinas: São Paulo, 1994.
• MCKENZIE, John L. Dicionário Bíblico. Paulus: São Paulo, 2003.
• MORACHO, Felix. Como ler Os Evangelhos – para entender o que Jesus fazia
e dizia. Paulus: São Paulo, 1997.
• SCHÖKEL, Luís Alonso. Bíblia do Peregrino. Paulus: São Paulo, 2002.
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