Mariologia é o conjunto de estudos teológicos acerca de Maria, mãe de Jesus
Cristo na Igreja Católica, que compreende uma vasta produção bibliográfica que
visa a salientar a importância da figura feminina de Maria e a profunda e
piedosa crença dos fiéis a ela, com o objetivo de enriquecer o âmbito teológico
cristão.
A Mariologia tradicionalmente subdivide-se em Mariologia Histórica (estuda
os dados históricos, sociais e afins que permitem aceder à figura histórica de
Maria), Mariologia Bíblica (versa sobre os fundamentos bíblicos das afirmações
sobre Maria), Mariologia "popular" (trabalha os dados que as devoções
populares sobre Maria receberam da Tradição eclesiástica e vice-versa) e
Mariologia Sistemática (aprofunda os dados da história, das Escrituras e da
piedade sistematizando-os em coerência com as doutrinas cristológicas e
eclesiológicas).
1. Typus de Maria no Antigo Testamento
Grande parte dos estudiosos da Bíblia está de acordo neste ponto: não há
nenhum texto nas escrituras judaicas, ou primeiro testamento, com a intenção
explícita de fazer um anúncio antecipado sobre Maria. Na realidade, depois que
Maria se tornou reconhecida na comunidade cristã, a partir do século 3,
aconteceu uma releitura dos textos bíblicos. Ampliou-se o sentido original.
Assim, algumas imagens e alegorias, como “a descendência da mulher que esmaga a
cabeça da serpente” (Gn 3,15), passaram a ser compreendidas em relação à mãe de
Jesus.
Desde o Antigo Testamento temos algumas passagens que se referem a Maria,
anunciam Cristo de uma maneira velada e profética, mas também projetam o rosto
de Maria (Arca da Aliança, Arca de Noé, Sarça Ardente, Tabernáculo do
Altíssimo, Templo de Deus, Filha de Sião). O primeiro texto da Bíblia que se
refere a Mãe do Messias é este:” Porei inimizade entre você e a mulher, entre a
descendência de você e os descendentes dela” (Gn 3,15). Este texto do
protoeveanglho ressoa em Jo 2,4 e Jo 19,26; passagens em que Jesus dá a sua Mãe
o nome de mulher.
Por exemplo, em Is 7,12, o profeta, em nome de Deus propôs o sinal: “Sabei
que o Senhor mesmo vos dará um sinal: Eis que a jovem concebeu e dará à luz um
filho, e por-lhe-á o nome de Emanuel” (Is 7,14). Quem é o Emanuel? – Há quem
veja nele o rei Ezequias, filho e Acaz, só que este não preenche o título “Deus
conosco”. Isaías tem em vista, o
Messias, que é a garantia de que a dinastia de Davi não será destronada. Em Is 9,5s “Um menino nasceu para nós, um
filho nos foi dado. Traz o cetro do principado e se chama ‘Conselheiro
Admirável, Deus Forte, Pai Eterno, Príncipe da Paz’. O seu glorioso principado
e a paz não terão fim, no trono de Davi e no seu reino, firmando-o e
consolidando-o sobre o direito e sobre a justiça”.
E quem é a mãe do Emanuel? – É dita “almah” – Há quem veja nela a esposa do
rei Acaz, mãe de Ezequias, cabe lembrar que jamais na Bíblia a palavra “almah”
designa uma mulher casada ou jovem que tenha perdido a virgindade. O grego em Alexandria, ao criar a versão dos
LXX usou o vocábulo “parte-nos”, virgem, e em Mt 1,23 “Eis que a ‘virgem’
conceberá e dará à luz um filho e lhe dará o nome de Emanuel”.
A virgindade da mãe do Messias põe em relevo o caráter extraordinário do
seu parto. O filho dessa Virgem Mãe é
especial dom de Deus aos homens, como a salvação é dom de Deus. E, em conclusão: Isaías garante a Acaz a
incolumidade do seu trono. É a salvação
a ser trazida em plenitude pelo Messias; a grande bênção do Deus-conosco exerce
ação antecipada nos tempos de Acaz.
Para entender bem o valor do sinal assim dado por Isaías, devemos entender:
estamos acostumados a ver a história, como algo que se desdobra do passado para
o futuro. No caso dos profetas,
requer-se outro modo de conceituar a história, ela tem seu ponto de partida no
futuro. A história sagrada tem seu
centro no Messias ou em Jesus Cristo e é a partir deste que os eventos se
sucedem e desenvolvem. Assim, Davi é
função de Jesus Cristo, em vez de Jesus Cristo ser função de Davi.
Miquéias, capítulo 5, verso 1 e seguintes: “E tu, Belém Éfrata, pequena
demais para ser contada entre os clãs de Judá, de ti sairá para mim aquele que
deve governar Israel. Suas origens são de tempos antigos, de dias imensuráveis. Por isto Deus os abandonará até o tempo em
que dará à luz aquela que deve dar à luz. Então o que houver restado de seus
irmãos, se reunirá aos filhos de Israel”.
Este texto pode não ser tido como profecia messiânica; seria explicável
simplesmente como anúncio de salvação e restauração do povo de Israel após o
exílio babilônico. Miquéias foi
contemporâneo de Isaías. A própria
tradição judaica, antes dos cristãos, viu nestes versículos uma profecia
messiânica a anunciar a vinda de um novo Davi, que governaria com firmeza e
segurança o povo de Deus. São Mateus
mostra que tal profecia se cumpriu por ocasião do nascimento de Jesus (Mt
2,6). Os sacerdotes e escribas de Israel
citaram Mq 5,1s para indicar o lugar em que o Messias devia nascer (Mt 2,4-6).
Não se pode esperar encontrar no AT um quadro Mariológico muito
nítido. Importa, porém, verificar que as
profecias messiânicas mais antigas já delineiam alguns traços de Maria,
concebida como Mãe do Salvador.
A esperança fundamental do AT é a do Messias. Por isto Maria Santíssima é aí esboçada
estritamente como mãe do Messias. Sendo a prerrogativa principal de Maria a
maternidade messiânica, Isaías não tenciona exaltar a virgindade, mas tem em
vista realçar o dom gratuito do Filho do Messias. Não é o homem quem, por sua
própria capacidade, gera a sua salvação.
O Salmo de Ana - (1 Sm 2:1-10)
“Então, orou Ana e disse: O meu coração se regozija no Senhor, a minha
força está exaltada no Senhor; a minha boca se ri dos meus inimigos, porquanto
me alegro na tua salvação. Não há santo como o Senhor; porque não há outro além
de ti; e Rocha não há, nenhuma, como o nosso Deus. Não multipliqueis palavras
de orgulho, nem saiam coisas arrogantes da vossa boca; porque o Senhor é o Deus
da sabedoria e pesa todos os feitos na balança. O arco dos fortes é quebrado,
porém os débeis, cingidos de força. Os que antes eram fartos hoje se alugam por
pão, mas os que andavam famintos não sofrem mais fome; até a estéril tem sete
filhos, e a que tinha muitos filhos perde o vigor. O Senhor é o que tira a vida
e a dá; faz descer à sepultura e faz subir. O Senhor empobrece e enriquece;
abaixa e também exalta. Levanta o pobre do pó e, desde o monturo, exalta o
necessitado, para o fazer assentar entre os príncipes, para o fazer herdar o
trono de glória; porque do Senhor são as colunas da terra, e assentou sobre
elas o mundo. Ele guarda os pés dos seus santos, porém os perversos emudecem
nas trevas da morte; porque o homem não prevalece pela força. Os que contendem
com o Senhor são quebrantados; dos céus troveja contra eles. O Senhor julga as
extremidades da terra, dá força ao seu rei e exalta o poder do seu ungido.”
Neste Salmo de louvor foi o pano de fundo do Magnificat de Maria.
O Cântico dos Cânticos apresenta o amor entre um jovem e uma jovem, desde o
início do namoro até o contrato matrimonial, como tipo ou figura do amor do
Senhor Deus pela Filha de Sião. (Ct 6,10) – “Quem é esta que avança como a
aurora que desponta, bela como a lua, incomparável como o sol, terrível como um
exército em linha de batalha?” Esta é
tida pelos Profetas como Esposa de Javé (Is 54,1-8; 62,4s; Os 1-3). Já no NT a Esposa de Javé é a Igreja (2Cor
11,2; Ef 5,25-29), da qual Maria é a miniatura, protótipo e o estado final que
tocará a todos os justos. A Alma de
Maria, cheia de graça, estava (e está) unida ao Senhor Deus mais do que
qualquer criatura.
Os livros de Provérbios e Eclesiástico personificam a Sabedoria, e os
respectivos autores não a conceberam como simples atributo de Deus, mas como
uma pessoa que assistiu a Deus na obra da criação (Pr 8,22-31 e Eclo 24,3-21).
Merecem registro duas mulheres do AT: Judite e Ester. Judite é viúva,
figura desprotegida e fraca do ponto de vista humano, fortalecida pela oração e
jejum, realiza a extraordinária façanha; matou o general Holofernes, que se
fazia de grande “deus”. (Jd 13,18) “Por sua vez, dirigindo-se a Judite, falou
Ozias: “Tu és bendita, ó filha, pelo Deus altíssimo, mais que todas as mulheres
da terra. Bendito é o Senhor, nosso Deus, que criou o céu e a terra, e te
conduziu para ferires na cabeça o chefe dos nossos inimigos” Judite foi
hipócrita e mentirosa junto a Holofernes, mas estava no seu papel de espiã
adversária; o procedimento de Judite foi lícito, dado que estava em situação de
guerra. À Virgem Santíssima, na
Liturgia, são aplicados os louvores tributados pelo povo a Judite: “Tu és a
glória de Jerusalém! Tu és o supremo orgulho de Israel! Tu és a grande honra do
nosso povo! ... Abençoada sejas tu pelo Senhor na sucessão dos tempos!” (Jd
15,9s).
Ester, figura frágil, israelita na corte do rei Assuero da Pérsia,
fortalecida pelo Senhor Deus, sabe encaminhar os acontecimentos de modo a
livrar seu povo do grave perigo de extermínio planejado pelo Primeiro Ministro
Amã; foi a grande intercessora junto ao rei em prol de sua gente. Est 7,3 –
“Ela respondeu: “Se encontrei graça a teus olhos, ó rei, e se te agrada,
concede-me a vida, pela qual suplico, e a vida do meu povo, pelo qual te peço”.
Judite e Ester, lembram que é Deus quem salva os homens como Ele quer,
servindo-se dos instrumentos mais precários aos olhos humanos. Maria foi certamente a humilde serva do
Senhor, que a Providência Divina quis elevar à categoria de nova Eva,
intimamente associada à obra de salvação do gênero humano.
Maria, filha de Sião. (Sl 87, este nela nasceu).
2. O Proto-Evangelho
O Antigo Testamento não fala de Maria, com palavras explícitas. Alguns de
seus textos referem-se à Mãe do Messias, contendo profecias sobre Maria. A
Constituição Dogmática “Lumen Gentium” sobre a Igreja, no Capítulo VIII: A
Bem-Aventurada Virgem Maria Mãe de Deus, no mistério de Cristo e da Igreja (nº
55), refere-se à mulher, Mãe do Redentor (Gn 3,15); a Virgem Mãe que dará à luz
um Filho chamado Emanuel (Is 7,14 – cf. Mt 1, 22-23), o qual nascerá em Belém
(Mq 5,2-3 – cf. Mt 2, 5-6).
“Proto-Evangelho” (Gn 3,15)
Gn 3,15: “Porei hostilidade entre ti e a mulher, entre tua linhagem e a
linhagem dela. Ela te esmagará a cabeça e tu lhe ferirás o calcanhar”. Esse
texto da Bíblia é chamado o “Proto-Evangelho” (primeiro evangelho). A primeira
“Boa-Nova” da salvação. Deus compromete-se a dar aos homens um Redentor. É o
primeiro anúncio da vitória do Messias Redentor, nascido de uma mulher. Quem é
a mulher? Em sentido literal se refere à Eva, a primeira mulher que se deixou
seduzir pela serpente; Eva como mãe da linhagem que há de vencer a serpente.
Quem obteria a vitória final sobre a serpente, num sentido coletivo, seria todo
o gênero humano fiel a Deus Entende-se por “Sentido literal”: “É não apenas
legítimo mas indispensável procurar definir o sentido preciso dos textos tais
como foram produzidos por seus autores, sentido chamado “literal” ... O sentido
literal da Escritura é aquele que foi expresso diretamente pelos autores
humanos inspirados”. Conforme a letra do texto, e este tomado isoladamente,
Maria, bem como Jesus Cristo, não aparecem na passagem bíblica. Sob o aspecto
mariológico, se bem que o texto não fale diretamente de Maria, explica o
Concílio Vaticano II, Maria “já é profeticamente esboçada na promessa dada aos
primeiros pais caídos no pecado, quando se fala da vitória sobre a serpente
(cf. Gn 3,15)”. (Constituição Dogmática “Lumen Gentium” Sobre a Igreja, nº 55).
Além do “sentido literal”, a Igreja reconhece um “sentido pleno”.
“Define-se o sentido pleno como um sentido mais profundo do texto, desejado por
Deus, mas não claramente expresso pelo autor humano. Descobre-se sua existência
em um texto bíblico quando se estuda esse texto à luz de outros textos bíblicos
que o utilizam ou em sua relação com o desenvolvimento interno da revelação.
Trata-se, então, ou do significado que um autor bíblico atribui a um texto
bíblico que lhe é anterior, quando ele o retoma em um contexto que lhe confere
um sentido literal novo, ou ainda do significado que a tradição doutrinal
autêntica ou uma definição conciliar dão a um texto da Bíblia”. 3 João Paulo
II, na Carta apostólica “Fides et Ratio” Sobre as relações entre fé e razão
esclarece: “...não se deve subestimar o perigo que existe quando se quer
individuar a verdade da Sagrada Escritura, com a aplicação de uma única
metodologia, esquecendo a necessidade de uma exegese mais ampla que permita o
acesso em união com toda a Igreja, ao sentido pleno dos textos.” (Nº 55).
Sentido pleno faz crescer na Igreja, o significado mais profundo das palavras
da Escritura, quando são estudadas considerando-se os caminhos do Senhor na
história da salvação. “A Bíblia se explica pela Bíblia por inteiro”. O
Catecismo da Igreja Católica ensina: “O Concílio Vaticano II indica três
critérios para uma interpretação da Escritura conforme ao Espírito que a
inspirou:
1) Prestar muita atenção “ao conteúdo e à unidade da Escritura inteira”.
Pois, por mais diferentes que sejam os livros que a compõem, a Escritura é una
em razão da unidade do projeto de Deus, do qual Cristo Jesus é o centro e o coração,
aberto depois da sua Páscoa...
2) Ler a Escritura dentro “da Tradição viva da Igreja inteira” ... Com
efeito, a Igreja leva na sua Tradição, a memória viva da Palavra de Deus, e é o
Espírito Santo que lhe dá a interpretação espiritual da Escritura...
3) Estar atento “a analogia da fé”. Por “analogia da fé” entendemos a
coesão das verdades da fé entre si e no projeto total da Revelação “(nº
112/114). Aplicando esses princípios a Gn 3,15, pode-se dizer que o descendente
da mulher foi o Messias. Com o Messias Jesus fica implicada sua mãe. O sentido
pleno aponta para Jesus e Maria.
Interpretação da Tradição
A tradição católica interpreta Gn 3,15 como o anúncio da vitória do
Messias, nascido de uma mulher. É o primeiro anúncio da salvação que Cristo trouxe
destruindo as obras do demônio. A tradição católica reconheceu aqui a pessoa de
Maria e o papel importante da mãe do Messias. No século II, encontramos nos
Padres da Igreja o tema da comparação Eva/Maria. Eles viram a pessoa de Maria
associada com Jesus para a salvação de todos os homens, como Eva com Adão no
pecado. O paralelismo Maria nova – Eva associado com Cristo novo- Adão, na luta
contra o diabo, luta que termina pela vitória total sobre o demônio
(protoevangelho). Somente depois de realizada a obra redentora compreendemos
que Cristo é o “segundo Adão” (Rm 5,12-19).
São Justino (+ 165) afirma: “<Jesus> se fez homem por meio da Virgem,
de sorte a ser finalizada a desobediência, oriunda da serpente, por ali mesmo
onde havia começado. Eva era virgem e incorrupta; concebendo a palavra da
serpente, gerou a desobediência e a morte. A Virgem Maria, porém, concebeu fé e
alegria quando o anjo Gabriel lhe anunciou a boa nova”... (citado em C. Folch
Gomes, Antologia dos Santos Padres, Paulinas, 1979, p. 79). Santo Irineu (+
202) acrescenta: “Ora, como Eva..., que tendo-se feito desobediente, se tornou
causa de morte tanto para si quanto para todo o gênero humano, também
Maria...obedecendo, tornou-se causa de salvação tanto para si quanto para todo
o gênero humano...” (citado em S. Fiores e S. Meo, Dicionário de Mariologia,
Paulus, 1995, p. 1006). Santo Epifânio (+ 403) diz:” Numa consideração exterior
e aparente, dir-se-ia que de Eva derivou a vida de todo o gênero humano, sobre
a terra. Mas na verdade é de Maria que deriva a verdadeira vida para o mundo, é
ela que dá à luz o Vivente, ela a Mãe dos viventes. Portanto, o título de “mãe
dos viventes” queria indicar, na sombra e na figura Maria.”(Ibidem C.F.Gomes,
p. 306). Daí o título de “Nova Eva”. Maria é a mulher “mãe dos vivos”, pois deu
a luz o vencedor da morte.
3. Typus de Maria nas cartas de São Paulo
Maria, a ignorada – Os primeiros escritos do Novo Testamento foram as
cartas de São Paulo. E nelas há 3 referências ao nascimento de Jesus, porém
nunca se fala de Maria. A primeira está na Carta aos Filipenses, na qual ele
diz que Jesus “nasceu à semelhança dos homens” (2,7). A segunda, na Epístola
aos Romanos, diz que Jesus nasceu “como homem, da família da Davi” (1,3). A
terceira, a mais explícita, em Gálatas 4,4: “quando chegou a plenitude dos
tempos, Deus enviou seu Filho, nascido de uma mulher”. Vemos, pois, que Paulo
nunca menciona Maria. O fato é que Paulo concentrou toda sua pregação
unicamente na morte e ressurreição de Jesus. Tudo mais ficou em segundo plano
para ele.
No NT os relatos a respeito de Maria são incompletos, não sistemáticos e,
as vezes, contraditórios. Também referem-se a Maria, as palavras do Evangelho
de João, as mesmas dirigidas a Igreja: “Mas o Paráclito, o Espírito Santo, que
o Pai enviará em meu nome, ensinar-vos-á todas as coisas e vos recordará tudo o
que vos tenho dito” (Jo 14,26) e “Quando vier o Paráclito, que vos enviarei da
parte do Pai, o Espírito da Verdade, que procede do Pai, ele dará testemunho de
mim” (Jo 15,26).
As cartas de São Paulo são as mais antigas do NT. O mais antigo testemunho
do NT a respeito de Maria está em Gal 4,4: “Mas quando veio a plenitude dos
tempos, Deus enviou seu Filho, que nasceu de uma mulher e nasceu submetido a
uma lei”. Esta carta foi escrita nos anos 57/58 na cidade de Corinto, assim
coma a carta aos Romanos.
Paulo não fala da maternidade de Maria, ele não se preocupa como o Filho de
Deus tornou-se homem, mas diz que assim aconteceu. Paulo fala que Jesus é
verdadeiro homem e verdadeiro Deus. Em sua carta aos Gálatas escreve
assim: "Dos outros apóstolos não vi
mais nenhum, a não ser Tiago, irmão do Senhor”. Gal 1,19. Paulo afirma que o Senhor teve irmão, põem,
não explica em que sentido usa a palavra irmão: no sentido exato ou no sentido mais
amplo.
Aos Romanos ele escreve: “Paulo, servo de Jesus Cristo, escolhido para ser
apóstolo, reservado para anunciar o Evangelho de Deus; este Evangelho Deus
prometera outrora pelos seus profetas na Sagrada Escritura, acerca de seu Filho
Jesus Cristo, nosso Senhor, descendente de Davi quanto à carne, que, segundo o
Espírito de santidade, foi estabelecido Filho de Deus no poder por sua
ressurreição dos mortos” Rm 1,1-4. Aqui
Paulo não informa que Jesus é descendente de Davi. O mesmo está em 2 Tm 1,8; “Lembra-te
de Jesus Cristo, saído da estirpe de Davi e ressuscitado dos mortos, segundo o
meu Evangelho” - como esta promessa dada a Davi passou para Jesus – através do
pai ou da mãe – aqui isso não está explicado.
Paulo não estava interessado na família de Jesus nem os seus pais. Falando
da dignidade messiânica ele usa dois termos a vida “segundo a carne”’ e
“segundo o espírito”. Em Gal 4,4, fala sobre a mãe de Jesus como aquela que lhe
transmitiu a existência terrestre, e não o pai, e fala do nascimento do
espírito. Assim, a pergunta sobre a função de Maria na historia da salvação, em
Paulo, é uma questão aberta.
Maria no Novo Testamento
A ordem cronológica, dos livros bíblicos do Novo Testamento que falam
explicitamente de Maria. São eles:
A Carta aos Gálatas que contém as informações mais antigas sobre Maria –
(livro escrito por volta do ano 50 d.C.).
O Evangelho de Marcos (escrito por volta do ano 60 d.C.)
O Evangelho de Mateus (escrito por volta do ano 70 d.C.)
O Evangelho de Lucas (escrito por volta do ano 70 d.C.)
O Livro dos Atos dos Apóstolos (também escrito por volta do ano 70 d.C.)
O Evangelho de João (escrito por volta dos anos 90-100 d.C.)
Apocalipse (também escrito por volta dos anos 90-100 d.C.)
3. A nova família de Jesus: o enfoque de Marcos
Marcos apresenta um retrato de Maria convidada para entrar na escola do
seguimento de Jesus (Mc 9,7) e a proclamar a sua fé com valentia (Mc 6,7. 13;
16,15). Logo depois de escolher os doze, Jesus sobe à montanha, lugar do
encontro com o Pai, e aí cria uma nova família, a família dos seguidores,
inclusive Maria, sua mãe, é convidada a fazer parte deste discipulado
tornando-se uma "peregrina da fé".
No evangelho de Marcos, o primeiro a ser escrito, Maria aparece no meio dos
familiares de Jesus, sem qualquer destaque. O evangelista mostra com clareza
que, para Jesus, importa sobretudo uma nova família, não mais formada por laços
de parentesco. A verdadeira família de Jesus será, de agora em diante, a dos
seus seguidores, ou seja, os discípulos e discípulas que fazem a vontade do
Pai. Sobre Maria tem duas passagens, que nos referem algo a respeito de Maria:
1. Mc 3,31-35 – sua mãe e sues irmãos procuravam Jesus. Jesus precisa romper com a família para ter
liberdade de anunciar o Reino de Deus (Mc 3)
2. Mc 6,1-3: Jesus é o filho de Maria
O Evangelho de Marcos:(+ou-60) Maria = Mãe clânica ou canal do Messias.
4. Maria em Mateus
O Evangelho de Mateus: (+ou-70) Maria= Mãe virginal do Messias segundo as
profecias Mateus destaca Maria como mulher descendente do povo de Deus e sua
ação é colaborar no cumprimento das Escrituras. "Eis que a virgem
conceberá e dará a luz um filho" (Is 7,14). Ela, mesmo no seu silêncio,
tem uma missão especial a favor de Jesus, o Salvador do povo. Maria aparece
como aquela mulher que vive plenamente o seguimento a Jesus e é fiel às
exigências feitas por Ele: Maria ama a Jesus acima de tudo (Mt 10,37), Ela
acompanha o Filho em todos os momentos, mesmo que lhe custe dor e sofrimento
(Mt 10,38). Maria é capaz de perder tudo para manter-se unida a Jesus (Mt
10,39). Maria, com sua vida, sua obediência e sua proximidade junto a seu
Filho, é a perfeita discípula e modelo de seguimento para todos nós.
Mateus acrescenta um dado novo. Ele prepara o anúncio da vida pública de
Jesus com os “relatos de infância”, que estão centrados na figura de José, o
homem justo que sempre age de acordo com o apelo de Deus. Assim, José acolhe a
Maria como sua esposa e não tem relações intimas com ela até o nascimento.
Adota Jesus como seu filho, mesmo não sendo o pai biológico e protege a ambos
dos perigos que surgem. Maria é apresentada como aquela que concebe pela ação
do Espírito e está unida ao filho, como mostra a expressão “o menino e sua
mãe”, repetida 5 vezes.
• A mãe virginal do Messias (Mt
1)
• Com José, cuida do menino
Jesus (Mt 2)
Interessa-nos o Evangelho da infância em Mt 1-2
Mt 1,1-17 – a genealogia de Jesus. Entre tantos homens, somente quatro
mulheres, além de Maria, são citadas por Mateus nessa lista genealógica: Tamar,
Raabe, Rute e a mulher de Urias (Betsabé), respectivamente: uma incestuosa, uma
prostituta, uma estrangeira (era proibido aos israelitas casarem-se com
estrangeiras) e a que foi tomada como esposa pelo rei Davi, que para obter isso
encomendou a morte de seu marido, Urias, significando aqui o assassinato e o
adultério. O versículo 16, quebra o ritmo...Jacó quebrou José, o esposo de
Maria, da qual nasceu Jesus chamado Cristo” No mistério de Jesus foi enquadrado
o mistério de Maria, a Mãe de Jesus.
Mt 1, 18-23 “A origem de Jesus Cristo deu-se do seguinte modo: Maria sua
mãe... Este trecho afirma que José era o homem justo. Cita-se Is 7,14,
referencia a palavra almah – que significa apenas a jovem mulher, sem
especificar se é casada ou não.
5. E agora, José? - Mt 1,18-25
José era da família real, descendente de Davi. Cuidou de Jesus até os doze
anos…depois um grande silêncio. O anjo disse “Toma contigo Maria”. “Tu lhe
porás o nome de Jesus” - Mt 1,20-21. “Teu pai e eu te procurávamos aflitos” Mt
2,48. Era homem justo em três níveis:
- frente à lei – respeito,
- na relação com as pessoas,
- perante Deus.
É dezenove vezes citada no Novo Testamento, entre elas: «A virgem
engravidará e dará à luz um filho... Mas José não teve relações com ela
enquanto ela não deu à luz um filho. E ele lhe pôs o nome de Jesus. » (Mateus
1:23-25), "Você ficará grávida e dará à luz um filho, e lhe porá o nome de
Jesus... será chamado Filho do Altíssimo." Maria pergunta ao anjo Gabriel:
"Como acontecerá isso, se sou virgem (literalmente: se não conheço
homem)?" O anjo respondeu: O Espírito Santo virá sobre você, e o poder do
Altíssimo a cobrirá com a sua sombra. Assim, aquele que nascer será chamado
santo, Filho de Deus (Lucas 1:26-35)
6. Síntese sobre Maria nos Evangelhos
1. O aparecimento do arcanjo Gabriel, e anúncio de que seria ela a mãe do
Filho de Deus, o prometido Messias (ou Cristo), (Lucas 1:26-56) a (Lucas
2:1-52); compare com Mateus 1:2).
2. A visitação à sua prima Isabel e o Magnificat (Lc. 1,39-56).
O nascimento do Filho de Deus em Belém, a adoração dos pastores e dos reis
magos (Lc. 2,1-20).
3. A sua purificação e a apresentação do Menino Jesus no templo (Lc.
2,22-38).
4. À procura do Menino-Deus no templo debatendo com os doutores da lei (Lc.
2,41-50).
5. Meditando sobre todos estes fatos (Lc. 2,51).
6. Nas bodas de Casamento em Caná, na Galiléia (João 2:1-11).
7. À procura de Cristo enquanto este pregava e o elogio que Lhe faz (Lc.
8,19-21) e (Mc. 3, 33-35).
8. “Stabat Mater” - Ao pé da Cruz quando Jesus aponta a Maria como mãe do
discípulo e a este como seu filho (Jo, 19,26-27).
9. Depois da Ascensão de Cristo aos céus, Maria era uma das mulheres que
estavam reunidas com os restantes discípulos no derramamento do Espírito Santo
no Pentecostes e fundação da Igreja Cristã. (Atos 1:14; Atos 2:1-4).
E não há mais nenhuma referência ao seu nome nos restantes livros do Novo
Testamento, salvo em Lucas (11, 27-28): “Felizes as entranhas que te trouxeram
e os seios que te amamentaram”.
7. As palavras de Maria
Nos Evangelhos, Maria faz uso da palavra sete vezes, três delas dirigidas
ao Anjo da Anunciação, o Magnificat, em resposta a Isabel, duas dirigidas ao
seu Filho e uma só e última vez dirigida aos homens (aos servos das bodas de
Caná) que a Igreja Católica conserva com todo o valor de um testamento.
1. “Como poderá ser isto, se não conheço varão? (Lc. 1,34),
2. "Eis a escrava do Senhor". (Lc. 1,38),
3. "Faça-se em mim segundo a tua palavra." (Lc. 1,38),
4. "A minha alma engrandece o Senhor." (Lc. 1,46-55),
5. "Filho, porque fizeste isto conosco? eis que teu pai e eu te
procurávamos angustiados." (Lc 2,48),
6. "Não têm mais vinho"...
(Jo. 2,3),
7. "Fazei tudo o que Ele vos disser" (Jo. 2,5).
8. As palavras dirigidas a Maria
Nos Evangelhos oito vezes a palavra é dirigida a Maria:
1. A saudação do anjo: “Ave, cheia de graça, o Senhor está contigo”. (Lc
1,28).
2. O anúncio da Encarnação: “Eis que conceberás no teu seio e darás à luz
um filho a quem porás o nome de Jesus” (Lc. 1,30-33).
3. Por obra e graça do Espírito Santo: “O Espírito Santo descerá sobre ti e
o poder do Altíssimo te cobrirá com a sua sombra; por isso também o que nascer
será chamado Santo, Filho de Deus” (Lc. 1,35-37).
4. Simeão lhe fala da espada que trespassará o coração: ...” e uma espada
trespassará a tua própria alma a fim de que se descubram os pensamentos de
muitos corações” (Lc. 2,34).
5. Isabel, ao responder a sua saudação: “Bendita és tu entre as mulheres e
bendito é o fruto do teu ventre!” (Lc 1, 42-45).
6. O Menino-Deus lhe responde no templo: “Por que me buscáveis? Não sabíeis
que devo estar na casa de meu Pai?” (Lc. 2,49).
7. Jesus em Caná respondeu-lhe: “Mulher, isso compete a nós? Minha hora
ainda não chegou” (Jo.2,4).
8. Cristo na cruz: "Mulher, eis aí o teu filho" (19,26-27).
As Escrituras fazem-nos compreender que Jesus passou com ela trinta anos,
sem contar o período de gravidez e os anos de vida pública (Lc 2,51). O Apocalipse diz-nos que ela é a verdadeira
Arca, que estava no cerne de todo o Antigo Testamento (Ap 11,19). Maria
"bendita entre todas as mulheres" (Lc 1,42), "cheia de
graça" (Lc 1,28) sobre quem o Espírito Santo repousa (Lc 1,35) deve, ela
mesma, declarar que "todas as gerações a chamarão de bem-aventurada"
(Lc 1,48).
É importante tentar compreender e aprofundar, com a Igreja (At 8,31), todo
o alcance da Palavra de Deus. Jesus disse que se deve julgar a árvore pelos
frutos e que a qualidade do fruto constitui uma medida da qualidade da árvore
(Mt 7,20; 12,33; Lc 6,43). Ora, não pode haver fruto mais belo que o Próprio
Jesus. E como Jesus é o Fruto Bendito (Lc 1,42) do seio dessa extraordinária
árvore que é Maria, só olhando para Ele Próprio poderemos ter uma idéia da
grandeza e da bondade da Mãe de Deus... Voltemos às Escrituras, pois como
Hugues de Saint Victor resumia, retomando Santo Afonso de Ligório: "Tal
Cordeiro, tal Mãe, pois a árvore conhece-se pelo fruto".
9. As expressões bíblicas mais bonitas a respeito de Maria - as sete jóias
1. Ave cheia de graça – kecharitomenee (Lc 1,28);
2. A bendita entre as mulheres (Lc 1,42);
3. A mãe do meu Senhor (Lc 1,43);
4. Aquela que acreditou (Lc 1,45);
5. Aquela que todas as gerações proclamarão bem-aventurada (Lc 1,48);
6. Deus faz nela as grandes coisas (Lc 1,49);
7. Ela é a Mulher, nova Eva (Jo 2,4), (19,26) e (Ap 12,1).
Maria na Sagrada Escritura Lucas e João
Perfeita discípula e peregrina: Maria em Lucas
O evangelho da infância em Lucas 1-2 compreende dois quadros de duas cenas:
1. Os anúncios (Lc 1,5-56)
1. Anúncio do nascimento de João Batista 2.
Anúncio do nascimento de Jesus
Lc 1,5-25 Lc 1, 26-38
3. A visitação – Lc
1,39-56
2. Os nascimentos (Lc 1,75-2,52
4. Nascimento de João Batista 1,57s 6.
Nascimento de Jesus 2, 1-2-
5. Manifestação de João Batista 1,58-80 7.
Circuncisão e manifestação de Jesus 2,21-40
Conclusão: o minuano crescia... 8.
Jesus no templo – 2,41-53
Conclusão: o menino crescia...
As alusões às Escrituras
Malaquias Lucas
2.6 – Ele converteu a muitos 1,16
– converterá muitos filhos de Israel
3,1 – preparará um caminho diante de mim 1,17
– caminhará à frente do Senhor
Sofonias Lucas
3,14 Alegra-te, Filha de Sion 1,28
Alegra-te
3,15 O senhor está no meio de ti 1,18
O Senhor está contigo
3,16 Não tenhas medo, Sion 1,30
Não tenhas medo, ó Maria
Êxodo Lucas
40,35 A nuvem cobriu com a sombra o tabernáculo 1,35 O poder do Altíssimo te cobrirá com a sua sombra
O evangelho que mais se refere a Maria é Lucas. A começar pela quantidade
dos relatos nos quais ela aparece ou se diz algo sobre a mãe de Jesus: anunciação,
visita a Isabel, cântico do Magnificat, nascimento de Jesus, apresentação no
templo, profecia de Simeão, desencontro no templo aos 11 anos, a vida em
Nazaré, as palavras de Jesus sobre a família, o diálogo com a mulher na
multidão, a presença de Maria na comunidade nascente, preparando a vinda do
Espírito Santo. Através de todos estes relatos, Lucas nos apresenta Maria como
a figura da/o perfeito discípulo de Jesus, que ouve a Palavra de Deus, guarda-a
no coração e dá frutos na perseverança.
Além disso, Maria trilha um caminho na fé. Totalmente entregue aos projetos
de Deus, ela não entende tudo o que lhe acontece, e por isso mesmo precisa
continuamente meditar o sentido dos acontecimentos. Passa por momentos belos e
difíceis, alegres e sofridos. O fato de ter que aprender o “jeito novo” de ver
o mundo que Jesus propõe causa-lhe conflitos, que lhe atravessam o coração como
uma espada. Como mulher proveniente de Nazaré da Galiléia, Maria vive e anuncia
a opção preferencial de Deus pelos pobres, tal como Jesus o vive e anuncia no
sermão da planície.
Por fim, Maria é uma pessoa especialmente contemplada pelo Espírito Santo,
que a cobre com sua sombra na concepção de Jesus e atua na comunidade dos
discípulos em Pentecostes, como línguas de fogo. “Nuvem” e “fogo” são os
símbolos da presença de Deus junto de seu povo peregrino, desde a libertação do
Egito. Nuvem quer dizer proteção e fecundidade. Já o fogo alude a energia, amor
e vitalidade. Este é perfil de Maria em Lucas: perfeita discípula, peregrina na
fé, sinal da opção de Deus pelos pobres, mulher contemplada pelo Espírito
Santo.
Em Lucas: Maria, a imagem do seguidor de Jesus (discípula)
Em Lucas Maria é uma mulher ativa, comprometida, que se oferece livremente
para colaborar no plano da salvação sentindo-se, ela mesma, discípula e serva
do Senhor. Mulher disposta a servir e a anunciar a Boa Nova da Salvação. Maria
representa o povo de Israel que espera o Libertador. Ela é jovem, virgem, cheia
de graça e com uma fé parecida com a fé de Abraão. Sua figura inicia o povo
novo de Deus. Maria é a primeira a dar o seu sim para que o projeto de Deus
aconteça. Mulher de oração, que cultiva uma sadia vida interior. Ela guarda e
medita os acontecimentos no coração (cf. Lc 2,19-52). É terra boa que acolhe a
semente e faz produzir frutos. Por isso Maria é também mulher missionária que
abre caminho em meio às dificuldades.
O Evangelho de Lucas: Maria= mulher livre, a crente por excelência e a Mãe
do Messias. Em Lucas, Maria já é uma personalidade: mulher responsável,
autônoma, determinada. Tem um rosto, um perfil, um caráter. Tem, em suma, uma
identidade própria. Maria é uma pessoa que caminha como discípula ideal. (Lc 1,
25-38), que está aberta aos riscos da fé, (Lc 1, 38), ajuda aqueles que mais
precisam, (Lc 2, 22-24) e está sempre presente na comunidade cristã (At 1, 14).
Maria acolhe a palavra
Anunciação: um sim generoso e inteiro a Deus
Maria guarda a palavra no coração
Lc 2,19: Maria conservava todos estes fatos e meditava sobre eles em seu
coração + Lc 2,50
Rezar como Maria rezou
“Magnificat” (Lc 1,46-55) – a oração de Maria. Possui a estrutura de
bênção. Este tipo do gênero literário é chamado “beraka”. Ao receber a visita,
Isabel chama Maria de “bendita” e bendito é também o fruto do seu ventre. Então
Maria exclama: “A minha alma engrandece o Senhor”. O Magnificat é a síntese da
experiência de Maria, e ela agradece pelo presente; Deus viu a pequenez, e pela
misericórdia de Deus. Antes deste canto temos o cântico de Ana – (1Sm 2,1-10).
As idéias próprias do canto de Maria são as seguintes:
- Deus é poderoso,
- O Seu nome é santo,
- Seu amor é para todos,
- Dispersa os orgulhosos e exalta os humildes
O retrato de Maria no Magnificat
1. É a mulher de alegria. Alegra-te... são as primeiras palavras do anjo.
2. Maria é mulher inteligente – O Senhor fez em mim maravilhas…todas as
gerações vão proclamá-la ditosa.
3. Mulher humilde, sem orgulho.
4. Maria de coração modelado pelo Espírito.
5. Enraizada na história do seu povo.
6. Mulher de fé profunda
7. Mulher que sabe dizer obrigado.
• No encontro com Isabel:
“Bendito é o fruto do teu ventre” -> fidelidade a Deus é a condição para a
fecundidade.
• Lc 8,21: Minha mãe e meus
irmãos são os que ouvem a Palavra de Deus e a realizam.
• Lc 11,27s: Antes, felizes os
que ouvem a Palavra de Deus e a estão guardando (vigiando).
2. Maria em Lucas: síntese
Lucas apresenta o mais belo e diversificado perfil de Maria na Bíblia. Para
o evangelista, o discípulo de Jesus é aquele(a) que ouve seu apelo, segue-o e
aprende com ele no caminho (Lc 5,10s; 13,22). Ser aprendiz de Jesus significa
também fazer parte de sua comunidade, peregrinar na fé e participar da causa de
Jesus, que é o Reino de Deus. O seguidor de Jesus é aquele que “ouve a Palavra
de Deus num coração generoso, conserva no coração e frutifica na perseverança”
(Lc 8,15: explicação da parábola da semente e dos tipos de terra). Ora, a
grande novidade de Lucas é apresentar Maria como a imagem viva do discípulo(a)
de Jesus.
Podemos resumir as seguintes características de Maria no terceiro
evangelista: a seguidora de Jesus, a peregrina na fé, o sinal da opção de Deus
pelos pobres e a mulher contemplada pelo Espírito Santo.
(1) Seguidora de Jesus: Maria realiza as três qualidades básicas do
discípulo fiel. Ela acolhe a palavra de Deus com fé (relato da anunciação: Lc
1,28-38), conserva a palavra no coração e a medita, confrontando-a com os fatos
(Lc 2,19 e Lc 2,51) e frutifica esta palavra viva; sendo uma pessoa de intensa
fé (“feliz de você que acreditou”: Lc 1,40) e a mãe do messias (“bendito é o
fruto do teu ventre” em Lc 1,42). Somente Lucas relata a cena da mulher na
multidão que grita: “Feliz o ventre que te gerou e o seio que te amamentou”, em
claro elogio à maternidade biológica. Mas Jesus lhe responde: “Antes, felizes
os ouvem a palavra de Deus e a realizam” (Lc 11,27). Antes de ser uma crítica à
Maria, este texto revela sua real importância. A maternidade é conseqüência e
expressão de sua fé. Neste sentido também, Lucas refaz a expressão final do (des)encontro
de Jesus com os familiares, com a expressão: “Minha mãe e meus irmãos são os
que ouvem a Palavra de Deus e a realizam” (Lc 8,21). Há portanto uma prioridade
da fé, enquanto adesão à Jesus e à sua causa, sobre o simples fato de ser mãe
de Jesus.
(2) Peregrina na fé: Somente Lucas relata as palavras de Simeão a Maria:
“Quanto a ti, uma espada transpassará tua alma” (Lc 2,25). Não se trata de uma
alusão ao sofrimento de Maria na hora da cruz, pois nos evangelhos sinóticos
Jesus morre sozinho e Maria não está incluída entre as mulheres que o observam,
de longe. A espada tem um sentido metafórico. Alude a Jesus, que é a
palavra-gesto do Pai, conforme Hb 4,12s: "A Palavra de Deus é viva, eficaz
e mais penetrante do que qualquer espada de dois gumes. Julga as disposições e
as intenções do coração. E não há criatura oculta à sua presença". Maria,
como os outros aprendizes de Jesus, não sabia tudo. Foi fazendo descobertas no
correr de seu caminho espiritual. Neste sentido, o relato da perda no templo
confirma que Maria e José não entendem naquele momento as palavras e os gestos
de Jesus (Lc 2,41-50). Por isso mesmo, ela precisa refletir e buscar o sentido
dos fatos. A interpretação nova que Jesus dá à Lei, ao sábado, ao templo e às
tradições questionava seus seguidores, trazia conflitos e lhes provocava
mudanças na sua visão religiosa. Era uma espada! Maria passou pelo crivo da
espada da Palavra, e cresceu com isso.
(3) Sinal da opção de Deus pelos pobres: Lucas é o evangelista que mais
desenvolve a dimensão social da Boa Nova de Jesus. Coerente com esta
orientação, Maria é apresentada por ele como uma mulher pobre, da desconhecida
terra de Nazaré da Galiléia. Jesus nasce num lugar sem recursos e é envolvido
em faixas (Lc 2,12). Como são pobres, os pais de Jesus oferecem pássaros no
templo, em vez do cordeiro (Lc 2,24). O cântico de Maria, chamado “Magnificat”
resume, de forma poética, a proposta de Jesus nas Bem-Aventuranças (Lc 2,46-55
em comparação com Lc 6,20s). Sinaliza, com clareza, que a Boa Nova de Jesus
propõe uma mudança nas atitudes das pessoas e nas estruturas sociais. Deus se
volta sobretudo para os mais pobres, pois são os que mais necessitam. Sua
misericórdia permanece para sempre.
(4) Mulher contemplada pelo Espírito Santo: Em Lucas, Jesus começa a missão
recordando a profecia de Isaías: “O Espírito de Deus está sobre mim” (Lc 4,14).
É o Espírito que age em Jesus e nos seus seguidores, após pentecostes. Maria é
apresentada então como a mulher sobre a qual “a sombra do altíssimo” se
estende, para possibilitar a concepção de Jesus. Ela também participa da
comunidade que prepara a vinda do Espírito (At 1,14). Portanto, Maria é
“contemplada” duplamente pelo Espírito Santo: no nascimento de Jesus e no
nascimento da comunidade cristã, após a ressurreição de Jesus.
A partir de Lucas, descobrimos traços originais da figura de Maria. O
“sim”, pronunciado com inteireza no início da juventude, se renova no correr da
vida. Ela passa por crises e situações desafiadoras, que a fazem crescer e
caminhar sempre mais na adesão ao Senhor. Maria nos recorda que Deus escolhe
preferencialmente os simples e humildes para iniciar o Reino de Deus, esta
recriação da humanidade e dos cosmos. A partir do Magnificat, ouve-se o apelo
por novas relações interpessoais, econômicas, políticas, culturais e
ecológicas. Maria simboliza o ser humano em construção, aberto a Deus, tocado
pelo Espírito Santo, cultivando um coração solidário.
Essas características marianas inspiram atitudes de vida de cada cristão e
da Igreja-comunidade. Sentimo-nos chamados a sermos discípulos fiéis de Jesus,
ouvindo, acolhendo, guardando no coração e praticando sua Palavra. Renovamos o
nosso “sim”, mesmo no meio das crises, pois sabemos que somos “bem-amados de
Deus” (Ef 1,6). Alimentamos, como Maria, um coração agradecido a Deus, que O
louva por todo o bem que Ele realiza em nosso meio e através de nós. E nos
empenhamos pela solidariedade e pela cidadania planetária, construindo uma
sociedade mais próxima do projeto de Deus.
3. O Evangelho de João
Maria, mediadora da fé (Caná), mãe da comunidade (sob a cruz) e figura da
Igreja e da nova criação. Para João, Maria é mais que mera personalidade
(pessoa): é personalidade corporativa. Seu significado supera a pessoa
individual. Ela possui uma imensa ressonância simbólica, ela representa a
comunidade eclesial, a Humanidade salva. João tem uma alta mariologia, uma
mariologia simbólica. A Maria de João transcende infinitamente a Maria de
Nazaré. Assim, existe um processo de carecimento do entendimento sobre a figura
de Maria e do Mistério da virgem nos evangelhos. Carecimento este que é
continuo e que está evoluindo ainda hoje.
No Novo Testamento, todos os evangelistas, de acordo com a realidade da sua
comunidade de fé, apresentam um retrato de Maria. Mas, todos eles nos
apresentam Maria como Discípula e Mensageira do Evangelho. Vamos voltar nossa
atenção para Maria que é nossa mestra e modelo de discipulado, para que sejamos
bons discípulos e mensageiros da Boa Nova de Jesus.
João destaca a presença de Maria no início e no final do Evangelho. Ela é
sempre chamada de "Mãe de Jesus" e tratada como "mulher".
Nas Bodas de Caná, Maria é mulher atenta as necessidades. Ela percebe a falta
de vinho e toma providencia. É mulher de iniciativa. Com esta atitude, Maria
mostra que a Igreja precisa de pessoas com iniciativa, capazes de perceber as
necessidades do povo e dispostos a fazer tudo o que Jesus mandar. No final do
Evangelho, Maria aparece junto a cruz de Jesus. É mulher forte que fica de pé
diante da cruz. Aí, Maria é encomendada aos cuidados do discípulo e o discípulo
encomendado aos cuidados da mulher. Maria recebe a missão de ser a mãe da
comunidade de Jesus, mãe de todos aqueles e aquelas que acolhem e vivem a
Palavra de Deus. Maria é a Mãe de Jesus e a Mãe da Igreja.
O papel que Maria ocupa na Bíblia é discreto. Os dados estritamente
biográficos derivados dos Evangelhos dizem-nos que era uma jovem donzela virgem
(em grego παρθένος), quando concebeu Jesus, o Filho de Deus.
Era uma mulher verdadeiramente devota e corajosa. O Evangelho de João menciona
que antes de Jesus morrer, Maria foi confiada aos cuidados do apóstolo João e a
Igreja Católica viu aí que nele estava representada toda a humanidade, filha da
Nova Eva.
4. Jo 2,1-11 – As bodas de Caná. A mãe da comunidade, no quarto evangelho
Em João Maria aparece duas vezes, porém seu nome não é citado, ela é
chamada apenas de ‘mãe “e depois de “mulher”.
É o episódio cristológico, e Maria aparece exercendo um papel de Mãe e
Medianeira.
Jo 2,3 – eles não têm mais vinho... o teor de pergunta e de pedido
Jo 2, 4 – que queres de mim mulher?
Jo 2,5 fazei tudo... aqui tem uma correlação com faraó – Gn 41,55 – Jesus
pode ser visto como um novo José, que dá pão e vinho.
e a resposta é messiânica...06 talhas de 80 litros = 480 litros
Bodas de Caná: a ação simbólica de Maria
Continuemos a percorrer o texto da cena da Caná. Vejamos os símbolos no
relato de Jo 2,5-11. Assim, pode-se compreender o sentido profundo da ação de
Jesus e da intervenção de Maria.
A ação e a palavra de Maria (v.5): É comum no quarto evangelho que haja
momentos de impasse e “mal entendido” entre Jesus e seus interlocutores.
Enquanto eles estão num nível de compreensão superficial, de “baixo”, Jesus
fala das realidades “do alto”, mais profundas e além das aparências. É preciso
dar um salto de fé, para passar de um nível ao outro. Às vezes, há discussões
longas, com vários mal entendidos Assim acontece, por exemplo, nos diálogos com
Nicodemos e com a Samaritana (Jo 3,1-12 e Jo 4,6-27), ou na conversa com a
multidão, sobre o pão da vida (Jo 6,26-58). Jesus fala em nascer de novo e
Nicodemos entende de forma literal, como se alguém tivesse que voltar ao útero
materno. Jesus anuncia a água viva à Samaritana, e ela pensa na água do poço. Jesus
fala do pão como “minha carne” e eles se escandalizam.
Ao contrário dos outros interlocutores, Maria rapidamente salta para o
nível de fé, sem discutir com Jesus. Entende o que ele quer. Compreende que não
se trata somente de resolver um problema de falta de vinho, de atender a uma
necessidade concreta. Mas sim, o que este fato vai ajudar as pessoas a
conhecerem melhor quem é Jesus e se posicionarem diante dele.
Maria se volta para os serventes: “Façam tudo o que ele lhes disser” (Jo
2,5). Essas palavras têm uma grande força simbólica. Você se recorda da frase
de Maria ao final da anunciação, em Lucas: “Eis aqui a servidora do Senhor. Eu
desejo que se faça em mim conforme sua palavra” (Lc 1,36). Segundo João, Maria
não só realiza a vontade de Deus na sua vida, mas também orienta os outros a
fazerem o que Deus lhes pede. Há um deslocamento do foco e uma ampliação de
sentido. Da perfeita discípula e seguidora de Jesus, em Lucas, para a pedagoga
e guia dos cristãos, em João.
Da água para o vinho (v. 6-10): Jesus faz o primeiro sinal de forma
discreta. Nem sequer dá uma benção ou evoca o nome de Deus. Tudo na
simplicidade. O bom vinho alegra as pessoas e faz a festa ficar melhor ainda.
Mas por que João coloca como primeiro sinal de Jesus a transformação da água em
vinho, numa festa de casamento? Porque não uma cura ou expulsão de demônios? O
primeiro sinal de Jesus pretende começar a revelar quem ele é para nós. A
partir do sinal, entendemos que Jesus é o vinho novo para e existência humana.
Ele é capaz de transformar as situações desafiadoras em festa e alegria
compartilhadas.
Nas Escrituras Judaicas, o vinho simboliza a felicidade e a abundância que
acontecerá para todos, quando o Messias chegar (Ver Os 2,23s e 14,8; Am 9,13s;
Is 25,6 e 62,5; Jr 31,12; Zc 9,17). No livro do Cântico dos Cânticos, o vinho
lembra o desejo entre o homem e a mulher, o amor que os fascina e os une, uma
imagem do grande amor de Deus pelo seu povo (Ct 1,2-4; 2,4; 4,10). Com o sinal
do vinho, Jesus está dizendo que ele é o vinho novo, que o dia do Messias está
chegando. Começou o tempo da graça, superando as situações de miséria e
tristeza.
Cada detalhe do relato tem um sentido simbólico. As seis vasilhas de pedra,
destinadas à purificação dos judeus, aludem ao número da imperfeição, da
finitude humana (o seis), à frieza e dureza da lei judaica, que será superada
com Jesus. O chefe da festa não sabe da origem do vinho, como os chefes
judaicos não conhecem que Jesus vem do Pai. Somente os que servem sabem! As
talhas são enchidas até a borda, e têm muito vinho, quase 700 litros. Isso
significa que Deus nos oferece seus bens em abundância. Quem está com Jesus tem
vida sobrando. Jesus é o bom vinho, guardado até o momento do início da
manifestação dos sinais. Com ele, começa o tempo novo, que os evangelhos
sinóticos chamam de “Reino de Deus”.
O sinal de Caná e a fé (v.11): Qual é o resultado da ação de Jesus, devido
à intervenção de Maria? João nos diz que Jesus “manifestou sua glória e seus
discípulos creram nele”. Jesus começa a mostrar quem ele é: não somente o
carpinteiro de Nazaré, mas uma pessoa que comunica vida e alegria, como Filho
de Deus. A glória para Jesus não é o poder e a fama mundanos, mas a capacidade
de realizar o bem e tornar Deus conhecido e amado.
Os sinais de Jesus são uma ocasião para os discípulos exercitarem sua fé.
Quem crê, vê além do sinal. O sinal não força ninguém a acreditar, só abre a
porta do coração para a fé (Jo 2,11.23; 3,3, 4,54). Jesus mesmo não gosta das
pessoas que só acreditam quando vêem sinais. Ele até desconfia desse tipo de fé
que necessita sempre de sinais (Jo 2,23s). Jesus não gosta das pessoas que
buscam milagres só para resolverem seus problemas pessoais (Jo 6,26). À medida
que avança a missão de Jesus, os sinais também se mostram polêmicos. O último
sinal de Jesus, que é trazer Lázaro de volta a essa vida, causa divisão entre
os judeus. Uns acreditam nele, outros não (Jo 12,37), e alguns se posicionam de
forma violenta, organizando-se para matá-lo (Jo 11,45-54). Portanto, os sinais
são uma oportunidade para a fé, não uma prova miraculosa. Eles interpelam as
pessoas. E o primeiro sinal, o de Caná, abre caminho para os discípulos
entrarem na aventura da fé.
O sinal que unifica (v.12): Depois que Jesus faz seu sinal, os discípulos
crêem nele e saem juntos, com “sua mãe e seus irmãos”. O sinal de Caná une o
grupo dos seguidores de Jesus em torno a ele. A partir do gesto de Caná começa
a se formar o gérmen da comunidade cristã, com os discípulos, os familiares e a
mãe de Jesus.
Em Caná: aquela que aponta para Jesus
• Jo 2,1-11: Maria leva os
servidores-amigos de Jesus a “fazer tudo o que ele disser” para que creiam nele
e se reúnam em torno a Ele.
Fonte: A.Murad, Maria Toda de Deus e tão humana. Paulinas.
5. Jo 19, 25-27 Maria ao pé da cruz
Nesta cena Maria aprece em companhia de João e de duas mulheres, entre elas
Madalena. O apelativo “mulher” chama a atenção, e há de ser compreendido em
consonância com Gn 3,15 e Jo 2,4. Maria é a mãe dos vivos, nova Eva. Ela não
estava junto da cruz de Jesus, perto dele só no sentido geográfico, mas também
espiritual. Se em Caná a hora de Jesus não tinha chegado, no Calvário foi a
hora de Jesus
As duas cenas; das bodas e da cruz, possuem correlação: em ambas aparece o
termo “hora”, “Mãe de Jesus” e “mulher”. Cada uma das mulheres representa a
comunidade de uma aliança: a mãe. A da antiga aliança, o resto de Israel, a
esposa fiel; Madalena, a comunidade da nova aliança. O papel da mãe, a antiga
comunidade, termina na cruz; o de Madalena começa nela...
Na cruz (Jo 19)
• Maria persevera na fé, quando
não há mais sinais.
• Maria é adotada como Mãe da
comunidade. Começa nova etapa de sua missão.
Maria junto à cruz de Jesus
A mãe de Jesus, que aparece no
início de sua missão, em Caná (Jo 2,1-11), levando seus discípulos a
acreditarem nele, volta de novo à cena. Dessa vez, não há nenhum sinal
extraordinário. Ao contrário, o momento da cruz desafia a fé. Maria faz parte
do pequeno grupo que perseverou, que não fugiu no momento da perseguição e da
crucifixão de Jesus. É a corajosa seguidora de Jesus, que permanece no seu
amor. Manter-se de pé significa persistência, constância e adesão. Junto com
ela estão algumas mulheres-discípulas: a irmã de Maria, Maria de Clopas (ou
Cléofas) e Madalena. E somente um homem, o “discípulo amado”, que a tradição
cristã identificou com o jovem apóstolo e evangelista João. Ele representa a
comunidade cristã, o grupo dos que seguem os passos de Jesus, tornando-se mais
do que seus servidores. São seus amigos (Jo 15,15).
Uma característica importante do seguidor de Jesus é a perseverança, ou
seja, o compromisso de vida que se prolonga no tempo, vencendo as crises.
Quando Jesus pede para: “permanecer em mim e eu nele” (Jo 6,56; 15,4) ou
“permanecer no meu amor” (Jo 15,9) expressa uma sintonia profunda, uma comunhão
de mente e de coração. Este é o sentido da imagem da videira e dos ramos
(15,1-11). Como também: “Se vocês permanecerem na minha palavra, serão
verdadeiramente meus discípulos. Vocês conhecerão a verdade, e a verdade fará
de vocês pessoas livres” (cf. Jo 8,31s). Jesus promete: “Se vocês permanecerem
em mim e as minhas palavras permanecerem em vocês, peçam o que quiserem, e o
Pai lhes concederá” (Jo 15,7). Na primeira epístola de João também se diz desta
atitude de vida: “Quem pretende permanecer nele, deve também andar no caminho
que Jesus andou” (1 Jo 2,6).
Manter-se junto à cruz expressa a atitude de estar em sintonia com Jesus,
exercitando a fé no momento de crise da morte e de sua passagem para o Pai.
Maria, as mulheres e o discípulo amado são os que perseveram neste momento
crucial. Permanecem com Jesus e em Jesus. É certo que este momento significou
um grande sofrimento para Maria. Mas, parece que perseverar assume mais
importância do que sofrer.
Qual é o sentido do encontro de Maria com o discípulo amado, ao pé da cruz?
Não é resolver um problema de família, ou seja, quem iria tomar conta da mãe de
Jesus depois da morte dele. Nesse momento tão importante da cruz, João quer nos
dizer algo mais. Ele deixa impresso na memória de todos os cristãos que Maria
não é somente a mãe, que concebeu, gestou, deu à luz, nutriu e educou Jesus.
Novamente, ela é chamada de “mulher”, como em Caná (Jo 2,4 e 19,25). Seu lugar
está além dos laços de sangue e das relações familiares. Por vontade de Jesus,
Maria é adotada como mãe pela comunidade cristã de todos os tempos. O discípulo
amado, que representa a comunidade, recebe-a como mãe. E Maria é investida nessa
nova missão. Acolhe os membros da comunidade cristã como seus filhos.
A morte-ressurreição é o momento no qual se constitui a comunidade-Igreja.
Jesus irá “reunir todos os filhos de Deus dispersos” (Jo 11,51s). Este é o
sentido simbólico da cena que antecede o encontro na cruz. Os soldados tomam as
roupas de Jesus e as repartem em quatro partes (os quatro cantos da terra). Mas
a túnica permanece inteira (Jo 19,23s). A Igreja, nova comunidade messiânica,
será edificada em sua unidade a partir da cruz do Senhor.
O discípulo amado representa a comunidade cristã, agraciada e escolhida por
Jesus, para a qual ele dedica seu afeto e atenção. Esta comunidade recebe Maria
como sua mãe. O evangelista diz “a partir daquela hora, o discípulo a acolheu
em sua familiaridade” (Jo 19,27). Isto é, naquilo que lhe é próprio, que o
constitui como pessoa. Ele não usa a palavra grega “oikos” (casa), mas sim
“ídia/ídios” (o que é característico de alguém).
Em que consiste a missão de Maria, como mãe da comunidade? Provavelmente, a
mesma de Caná. A nossa mãe Maria poderá intervir junto ao Filho, pelos seus
filhos. Levará os servidores e amigos de Jesus a fazer o que ele disser.
Possibilitará que novas gerações de cristãos, como os primeiros discípulos,
creiam em Jesus, vejam sua glória, e se reúnam em torno dele. A cena de Maria
junto à cruz reúne, portanto, dois elementos fundamentais. A mãe de Jesus é a
mulher perseverante na fé até o último momento, junto com outros membros da
comunidade dos seguidores e amigos de Jesus. E, por vontade do próprio Jesus, é
adotada como mãe do discípulo amado, imagem e símbolo da Igreja.
5. O teor de Apocalipse 12, 1-17
A mulher que aparece aqui, no último livro da Bíblia, é aquela de que se
fala na primeira página da Bíblia, em conflito com a serpente (Gn 3,15). É Eva,
a primeira mulher. É também a humanidade toda enquanto gera filhos que lutam
contra as forças da morte e da maldição. É o povo de Deus, chamado a defender a
vida humana, transmitir a benção de Deus a todos os homens e mulheres (cf. Gn
12,1-3) e consertar o mundo estragado pela maldição. A mulher (também) é Nossa
Senhora, em que se afunilou toda esta luta contra a maldição e a morte. É
Maria, a moça humilde e pobre de Nazaré, enquanto gera o menino Jesus,
esperança de libertação para todos.
Esta mulher, gritando em dores de parto, representa a esperança de vida que
existe no coração de todos, sobretudo dos pobres. Esperança, ao mesmo tempo,
frágil e forte. É frágil como a mulher na hora de dar à luz: não tem defesa,
nem pode lutar, pois está totalmente entregue a doar a vida nova a um novo ser
humano. Mas, por isso mesmo, ela é forte, o ser mais forte do mundo! Sem as
mulheres frágeis com coragem de dar à luz, a vida já teria cessado sobre a face
da terra e nós não teríamos nascido.
Aquela luta, anunciada por Deus, desde a primeira página da Bíblia, atinge
agora o seu ponto decisivo em Maria que dá à luz ao menino Jesus. Maria
representa todas as mães que geram filhos e que garantem, assim, o futuro da
humanidade. (Representa também) as mães que lutam para transmitir aos filhos a
sua esperança, a sua vontade imensa de ser gente. Simboliza todas as pessoas
que acreditam no bem e na vida, que lutam para que a vida possa vencer a
maldição que entrou no mundo pela serpente. Ela representa sobretudo o “povo
humilde e pobre que busca a sua esperança unicamente em Deus” (Sf 3,12).
Dois grandes sinais aparecem no céu: Uma mulher e um dragão. Uma batalha – o menino é arrebatado. O dragão
é destronado. Mulher é abrigada no deserto por 1260 dias = 3 anos e meio. Aqui
há referência ao nascimento do Messias, que é perseguido por Satanás. A figura
feminina não pode ser identificada com alguma personagem individual. Essa
mulher bela é a Filha de Sion, o povo messiânico. A mulher do Apocalipse assume
sucessivos aspectos no decorrer da história: Filha de Sion, Maria Santíssima e
Santa Mãe Igreja. A mulher de Ap 12 é mulher como tal, em sua função da
maternidade, já designada pelo nome de Eva, Em Gn 3,15, o Senhor quis colocar a
mulher, e não o homem, como protagonista da obra da Redenção.
A ausência do nome de Maria nos escritos joaneus. Marcos usa o nome de
Maria 01 vez; Mateus 05 vezes; Lucas 13 vezes no evangelho e 01 vez nos Atos.
João nunca. Isso não é ocasional, mas proposital. João fala de José (Jo 6,42),
ele atribui o nome Maria a várias mulheres: Maria de Cléofas, Maria Madalena,
Maria de Betânia, Maria, irmã de Lázaro. ...dentro de todos os discípulos que
devia conhecer a Mãe de Jesus, era João, porque João não usa o nome de Maria,
Mãe de Jesus?
Podemos considerar duas respostas: 1. João omitiu o nome de Maria, porque
lhe parecia um nome muito comum, sendo o nome comum não preencheria a função em
relação a Mãe de Jesus. 2. O quarto
Evangelho fala muito do Pai de Jesus; (10,30;14,9). A expressão “Mãe de Jesus
“pode ser entendida como um paralelo a “meu Pai = o Pai de Jesus”.
João completa o perfil de Lucas acrescentando duas outras características.
Ao apresentar Maria no início da missão de Jesus (bodas de Caná) e no momento
derradeiro (junto à cruz), expressa que é uma pessoa significativa para Jesus e
sua comunidade. Nos dois relatos, Jesus não a chama de “mãe”, e sim de
“mulher”, como o faz com outras mulheres importantes, como a Samaritana e
Madalena. Em Caná, Maria é apresentada como a “pedagoga da fé”, que orienta os
servidores para “fazer tudo o que Jesus disser”. Ajuda a reunir os discípulos
em torno a Jesus. Possibilita a realização do primeiro sinal, que inicia o
processo de acreditar em Jesus e compreender quem ele é. Já na cruz, Maria aparece
junto com as mulheres e o discípulo amado, perseverante na fé, no momento em
que cessam os sinais. Por vontade de Jesus, há uma adoção recíproca. Ela assume
a missão de mãe da comunidade cristã, representada pelo “discípulo amado”, e a
comunidade a acolhe como tal.
O texto de Apocalipse 12 não é originalmente mariano. A mulher, revestida
de sol, com as estrelas debaixo dos pés e as doze estrelas significa, em
primeiro lugar, a comunidade-igreja, que já experimenta neste mundo os frutos
da glorificação de Jesus. De outro lado, também sofre os ataques das forças do
mal na história, é frágil, vive no deserto (lugar de tentação e de encontro com
Deus) e sente a solidariedade da Terra. Como aconteceu com textos do Antigo
Testamento, houve posteriormente uma releitura de Ap 12, dando-lhe uma
conotação mariana. Ela se apóia no fato de Maria ser mulher e mãe do messias.
Nas comunidades cristãs do século 4 nasce assim a intuição de que ela
participa, de forma singular, da glorificação que será concedida a todos os
seguidores de Jesus.
O perfil bíblico de Maria é fundamental para elaborar uma mariologia
consistente, equilibrada e centrada em Jesus. A partir dele, corrige-se os
exageros do devocionismo e do maximalismo mariano. Estabelece-se assim
elementos para o diálogo enriquecer com outras Igrejas cristãs
6. A atitude de Jesus para com Maria
Jesus parece ser descortês para com a Mãe.
1. Lc 2,49 – Jesus no Templo aos 12 anos
2. Jo2, 1-1, e 19,26 – Mulher... o que há entre nós? Ou por que tal pedido?
Tu e eu, que poderemos fazer nessa situação? Não chegou a minha hora, mas
realizou o milagre.
3. Mt 12, 46-49; Mc 3,31-35; Lc 8,19 – “Quem é minha Mãe...
Quando Jesus responde.... Eis a mina Mãe e meus irmãos, ele não é
indelicado, mas quer indicar que acima do parentesco carnal está o parentesco
espiritual que se baseia na fidelidade à Palavra e à Vontade de Deus
4. Lc 11, 27s – Bem-aventurados...Bem-aventurados os que ouvem...tal
exaltação aplica-se perfeitamente a Maria.
5. Gl 4,4 e 1Tm 2,15 – A mulher por excelência
Fonte:
http://mariologiapopular.blogspot.com.co/2015/03/mariologia-biblica.html
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