“Eu Sou o bom pastor. Conheço as minhas
ovelhas e sou conhecido por elas.
Jo 10,14.
Jesus é o Bom Pastor que veio para que todos tenham vida em abundância. O
pastor era a imagem e o símbolo do líder. Jesus diz que muitos se apresentavam
como pastor, mas na realidade eram ladrões e assaltantes. Hoje acontece a mesma
coisa. Muitas pessoas se apresentam como líderes, mas na realidade são ladrões
e assaltantes, pois, em vez de servir, buscam os seus próprios interesses. E,
às vezes, têm uma fala tão mansa e fazem uma propaganda tão inteligente, que
conseguem enganar o povo.
Situando
1. O discurso sobre o Bom Pastor
traz três comparações ligadas entre si:
a) pastor e assaltante (Jo 10,1-5);
b) comparação: Jesus é a porteira das ovelhas (Jo 10,6-10);
c) comparação: Jesus não é simplesmente um pastor, e sim o Bom Pastor
(Jo 10,11-18).
2. Temos aqui outro exemplo de
como foi escrito o Evangelho de João.
O discurso de Jesus sobre o Bom Pastor (Jo 10,1-18) é como um tijolo
inserido numa parede já pronta. Com ele a parede ficou mais forte e mais
bonita. Imediatamente antes, em Jo 9,40-41, João falava da cegueira dos
fariseus. A conclusão natural desta discussão sobre a cegueira está logo
depois, em Jo 10,19-21. Ora, o discurso sobre o Bom Pastor foi inserido aqui,
porque, como veremos, ensina como tirar esse tipo de cegueira dos fariseus.
Comentando
1. João 10,1-5: 1ª Imagem: entrar
pela porteira e não por outro lugar
Jesus inicia o discurso com a comparação da porteira: “Quem não entra pela
porteira, mas sobe por outro lugar, é ladrão e assaltante! Quem entra pela
porteira é o pastor das ovelhas!” Para entender esta comparação, temos que
lembrar o seguinte. Naquele tempo, os pastores cuidavam do rebanho durante o
dia. Quando chegava a noite, levavam as ovelhas para um grande redil ou curral
comunitário, bem protegido contra ladrões e lobos. Todos os pastores de uma
mesma região levavam para lá o seu rebanho. Um porteiro tomava conta durante a
noite. No dia seguinte, de manhã cedo, o pastor chegava, batia palmas na
porteira e o porteiro abria. O pastor entrava e chamava as ovelhas pelo nome.
As ovelhas reconheciam a voz do seu pastor, levantavam e saíam atrás dele para
a pastagem. As ovelhas dos outros pastores ouviam a voz, mas não se mexiam,
pois era uma voz estranha para elas. De vez em quando, aparecia o perigo de
assalto. Ladrões entravam por um atalho ou derrubavam a cerca do redil, feita
de pedras amontoadas, para roubar as ovelhas. Eles não entravam pela porteira,
pois lá havia o guarda que tomava conta.
2. João 10,6-10: 2ª Imagem: Jesus
é a porteira
Os ouvintes, os fariseus (Jo 9,40-41), não entenderam o que significava
“entrar pela porteira”. Jesus então explicou: “Eu sou a porteira das ovelhas.
Todos os que vieram antes de mim eram ladrões e assaltantes.” De quem Jesus
está falando nesta frase tão dura? Provavelmente, se referia a líderes
religiosos que arrastavam o povo atrás de si, mas que não respondiam às
esperanças do povo. Não estavam interessados no bem do povo, e sim no próprio
bolso e nos próprios interesses. Enganavam o povo e o deixavam na pior. Entrar
pela porteira é o mesmo que agir como Jesus agia. O critério básico para
discernir quem é pastor e quem é assaltante, é a defesa da vida das ovelhas.
Jesus pede para o povo tomar a iniciativa de não seguir o fulano que se
apresenta como pastor, mas não busca a vida do povo. É aqui que ele disse
aquela frase que até hoje cantamos: “Eu vim para que todos tenham vida, que
todos tenham vida plenamente!” Este é o critério.
3. João 10,11-15: 3ª Imagem: doar
a vida pelas ovelhas
Jesus muda a comparação. Antes, ele era a porteira das ovelhas. Agora, diz
que é o pastor. Todo mundo sabia o que era um pastor e como ele vivia e
trabalhava. Mas Jesus não é um pastor qualquer, e sim o Bom Pastor! A imagem do
bom pastor vem do AT. Dizendo
que é o
Bom Pastor, Jesus
se apresenta como
aquele que vem realizar
as promessas dos
profetas e as
esperanças do povo.
Há dois pontos em que ele
insiste. Na defesa da vida das ovelhas: o bom pastor dá a sua vida. No mútuo
entendimento entre o pastor e as ovelhas: o pastor conhece as suas ovelhas e
elas conhecem o pastor. Assim, para quem quer vencer sua cegueira é importante
conferir a própria opinião com a do povo. Era isso que os fariseus não faziam.
Eles desprezavam as ovelhas e chamavam-nas de povo maldito e ignorante (Jo
7,49; 9,34). Jesus, ao contrário, dizia que no povo há uma percepção infalível
para saber quem era o bom pastor. Os fariseus pensavam ter o olhar certo para
discernir as coisas de Deus. Na realidade eram cegos. O discurso sobre o Bom
Pastor ensina duas regras de como tirar este tipo de cegueira. 1) Prestar muita
atenção na reação das ovelhas, pois elas reconhecem a voz do pastor. 2) Prestar
muita atenção na atitude daquele que se diz pastor para ver se o interesse dele
é a vida das ovelhas, sim ou não, e se ele é capaz de dar a vida pelas ovelhas.
4. João 10,16-18: A meta aonde
Jesus quer chegar: um só rebanho e um só pastor
Jesus abre o horizonte e diz que tem outras ovelhas que não são deste
redil. Elas ainda não ouviram a voz de Jesus, mas quando a ouvirem, vão
perceber que ele é o pastor e vão segui-lo. Aqui transparece a atitude
ecumênica das comunidades do Discípulo Amado, de que falamos na Introdução.
Alargando
A imagem do pastor na Bíblia
Na Palestina, a sobrevivência do povo dependia em grande parte da criação
de cabras e ovelhas. A imagem do pastor guiando suas ovelhas para as pastagens
era conhecida por todos, como hoje todos conhecem a imagem do motorista de
ônibus. Era normal usar a imagem do pastor para indicar a função de quem
governava e conduzia o povo. Os profetas criticavam os reis por serem maus
pastores que não cuidavam do seu rebanho e não o conduziam para as pastagens (Jr
2,8; 10,21; 23,1-2). Esta crítica dos maus pastores cresceu na mesma medida em
que, por culpa dos reis, o povo foi levado para o cativeiro (Ez 34,1-10; Zc
11,4-17).
Diante da frustração sofrida com os desmandos dos maus pastores, aparece a
comparação com o verdadeiro pastor do povo, que é o próprio Deus: “O Senhor é
meu pastor nada me falta!” (Sl 23,1-6; Gn 48,15). Os profetas esperam que, no
futuro, Deus venha, ele mesmo, como pastor guiar o seu rebanho (Is 40,11; Ez
34,11-16). E esperam que, desta vez, o povo saiba reconhecer a voz do seu
pastor: “Oxalá ouvísseis hoje a sua voz!” (Sl 95,7). Esperam que Deus venha
como Juiz que fará o julgamento entre as ovelhas do rebanho (Ez 34,17). Surgem
o desejo e a esperança de que, um dia, Deus suscite bons pastores e que o
messias seja um bom pastor para o povo de Deus (Jr 3,15; 23,4).
Jesus realiza esta esperança e se apresenta como o Bom Pastor, diferente
dos assaltantes que roubavam o povo. Ele se apresenta também como o Juiz do
povo que, no final, fará o julgamento como um pastor que sabe separar as
ovelhas dos cabritos (Mt 25,31-46). Em Jesus se realiza a profecia de Zacarias
que diz que o bom pastor será perseguido pelos maus pastores, incomodados pela
denúncia que ele faz: “Vão bater no pastor e as ovelhas se dispersarão!” (Zc
13,7). No fim, Jesus é tudo: é a porteira, é o pastor, é o cordeiro!
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