terça-feira, 25 de outubro de 2016

Contemplação para alcançar amor - II

CONTEMPLAÇÃO PARA APRENDER A AMAR COMO DEUS


Síntese e recapitulação de toda a experiência dos Exercícios e ao mesmo tempo ponto de partida que se destina a introduzir o exercitante na vida diária, com uma visão universal profundamente cristã, a “Contemplação para alcançar Amor” é um novo modo de  orar, ou seja, um modo de “encontrar Deus em todas as coisas”.
                   
É a disponibilidade total ao Senhor, agora interiorizada e assimilada existencialmente. Alimentado com a fonte de energia que foram as 4 semanas, o Ad Amorem transforma-se em luz e calor que vão iluminar e alimentar a 5ª Semana do exercitante.
                                              
Duplo dinamismo: para trás, recolhe os esforços dos Exercícios; para frente, de iluminação e força propulsora.

Contemplação para “alcançar”
– dimensão ascética: nosso esforço; estender a mão para atingir o objetivo (ativo);
- dimensão mística: estender a mão para receber; atitude de humildade, acolher o Dom (passivo).

Aqui o exercitante encontra-se como que no centro do mistério único, que é ao mesmo tempo o mistério do Deus Criador e do Deus Redentor, do Deus que “dá a Vida”  e que conserva o universo, do Deus de quem tudo procede e para quem tudo retorna; em síntese, trata-se do mistério do Amor de Deus.
O exercitante encontra-se, assim, envolvido pelo Amor de Deus.
       
Este Amor ativo e primeiro de Deus suscita nele a gratidão profunda que o leva a responder com a consagração da própria vida ao maior serviço e glória de Deus: “Tomai, Senhor, e recebei...”
Verdadeiro e contínuo ato de Amor, esta contemplação é a expressão ao mesmo tempo heróica e humilde da “mística do serviço”  por puro amor.

Os quatro pontos da Contemplação ( EE. 234-237) indicam uma verdadeira via espiritual que para o exercitante será o lugar natural de sua oração. Trata-se de níveis de aprofundamento para descobrir a presença amorosa de Deus em tudo e em todos.

São quatro graus de profundidade da fé, é um todo dinâmico: cada ponto aprofunda o outro, num movimento espiral. É todo um novo modo de orar que significa um convite a entrar mais profundamente nas maravilhas e bens do Senhor, a penetrar no seu sentido e significado e a  inserir-se no seu dinamismo.
                            
O ponto de partida e, ainda uma vez, uma história, ou seja, o exercitante deve recordar a sua história pessoal de graça, ponderar o quanto Deus tem feito por ele e o quanto Deus deseja dar-se a ele.
                 
“... y consequenter el mismo Señor desea darseme en cuanto puede según su ordenación divina”.
                                   
O texto espanhol deixa mais patente a infinitude e a inesgotabilidade do Dom, o qual só tem como limite a liberdade do homem e sua capacidade de acolher e suportar o Dom de Deus sem morrer.

Em segundo lugar, considerar como Deus se manifesta presente em todos os seus dons; tudo está inundado de Deus. S. Inácio olha o mundo como sacramento de Deus.
                                
Deus quer que vivamos reconciliados com o mundo. Esta presença de Deus é ativa: Deus está trabalhando na história da Salvação.
Finalmente, Deus como fonte da qual procede todo bem como participação de seu infinito ser e perfeição.

“Reflectir en mi mismo”:  “Reflectir”- “reflejarse la luz en un cuerpo opaco” (Dicion. de Nobles).
                               
- quer expressar a refração em minha própria existência do mistério contemplado.
                               
- Como operação ativa equivale a pôr-se diante de Deus como um espelho para deixar-se orientar e “ordenar” por Ele e, consequentemente, é oferecer e devolver  a Deus o que Ele me deu.
                               
-“Reflectir” é um eco da expressão que S. Paulo utiliza em 2Cor.3,18.
                               
-“Deixar refletir” é não permitir que minha própria razão seja a medida das coisas, ou o censor que as seleciona, em minha relação com o Senhor.
                               
- Contemplar implica “dejarse reflejar”, não querer mediatizar nem controlar o mesmo processo orante; é evitar comparações e moralismos.

Portanto, a pedagogia do Ad Amorem abre nossos olhos para contemplar e buscar Deus em todas as coisas, a viver sempre na sua presença; é estar unido com Deus na ação; é trabalhar com Deus na mesma direção, ou seja, fazer as mesmas obras que Deus está fazendo.

Enfim, ser contemplativo na ação – agir de tal maneira que na própria ação devemos contemplar Deus.

Contemplação para alcançar amor - I


Contemplação para alcançar Amor
( EE 230-237)

A Contemplação para alcançar o amor é o coroamento dos Exercícios Espirituais. A partir daqui podemos perceber o sentido unitário e global de todo o caminho. O Princípio e Fundamento e a Contemplação para alcançar o amor são inseparáveis, como chaves que se enriquecem mutuamente.
Os dois momentos do exercício, o inicial e o final proporcionam visões de conjunto de toda a existência humana. O Princípio e Fundamento é por assim dizer a porta de entrada dos EE e a CAA –  a porta de saída.
A CAA é uma espécie de grande acorde final que nos lembra que tudo “ é graça”. É a mais profunda e íntima satisfação de sentir  “filho/a  amado/a”  pelo Pai.
Se o amor de Deus tem uma constituição trinitária, talvez nos ajude a contemplar esse amor, considerar o mistério das divinas pessoas como fonte e como fim dos dons que o amor nos faz experimentar.
Os EE são cristológicos; assim, o amor de Deus é lido na ótica cristológica, pois só por Cristo, em Cristo temos acesso a Deus. Não há acesso ao Pai a não ser pela mediação de Cristo. Quem revela a Trindade é Cristo.
Uma das coisas mais importantes da CAA  é focalizar  a comunicação  entre Deus e a criatura. Antes de iniciar a CAA, Santo Inácio dá a orientação que o exercitante deve levar em  conta  a respeito do significado da palavra “amor”.
Ø O amor deve estar mais nas obras que nas palavras.
Ø O amor que se dá na comunicação das duas partes:  amado x amante.
Deus é Amor. Entrar no caminho de Deus “significa” viver no amor, transformar-se nele, no “Amor”.
A iniciativa do amor, não vem do exercitante e sim de Deus. Ele nos amou primeiro. Deus colocou sua “Palavra” em todas as coisas: na vida, natureza, história, culturas, religiões, e em nós. É preciso descobrir essas sementes do Verbo e admirar o amor em tudo. O amor se põe mais em obras que nas palavras, e na troca de bens entre o amante e o amado.
No Princípio e Fundamento o exercitante se encontra diante da tarefa para um mês... Na CAA se encontra diante de uma tarefa para a vida inteira.
Nos retiros de 8 dias, passa despercebida entre malas a serem feitas, arrumação do quarto, ligações, despedidas, etc...
A última contemplação não é um enfeite dos Exercícios. Muito pelo contrário, é lá onde o exercitante tem a chance de recolher o fruto do retiro.
A permanente tarefa de um coração contemplativo é impedir   “opacidade” das coisas, que pouco a pouco vai fechando a nossa capacidade de ver a Deus de maneira “transparente” em todas as coisas e de ver todas as coisas em Deus.
Em nossa experiência espiritual o problema de nossos olhos “não enxergar”, na realidade é sempre um problema do coração. Os que têm o coração limpo vêem a Deus. Falando espiritualmente, precisamos mais de “cardiologistas” do que de “oftalmologistas”.
A tentação da “opacidade” faz-nos esquecer Deus, o autor dos dons, e daí a desordem de nossas afeições, desviando-nos do sentido do fim para o qual fomos criados.
A “transparência” consiste na capacidade de ler a própria vida, descobrindo os dons de Deus, sua presença, sua atividade. Santo Inácio apresenta uma visão da vida que permite encontrar Deus e unir-se a Ele em todas as coisas.  Nas coisas criadas revela-se a presença de Deus que se dá (1), que se aproxima das pessoas (2), que trabalha por elas    ( 3 ), e é a fonte da qual provém todo bem ( 4 ).
Esse amor ativo e primeiro de Deus, suscita em nós a gratidão profunda que nos leva a responder com a própria vida, para fazê-lo mais conhecido e amado por todos os seres humanos de Deus.
Santo Inácio coloca duas notas que é preciso ter presente:
·         A primeira, que o amor deve consistir mais em obras do que em palavras  (EE  230 ) ;
·         “A segunda, que o amor consiste na comunhão mútua, isto é, quem ama dá e comunica o que tem ou pode a quem ama  e igualmente, por sua vez, o amado ao que ama. ( EE  231).

Oração preparatória: - consiste em pedir a graça a Deus nosso Senhor para que todas a minhas intenções, ações e operações, sejam dirigidas unicamente ao serviço e louvor  de sua Divina Majestade” ( EE  46).

Preâmbulos:
Os preâmbulos, como sempre, são a composição de lugar e a petição da graça para o exercício. Ambos vão  nos dar a entender muito claramente quais os objetivos de Santo Inácio para esta contemplação.
·   Composição de lugar: - “ consiste aqui em ver como você está diante de Deus nosso Senhor, dos anjos e santos que intercedem por você... “Lá está também a Mãe amorosa e gloriosa, Mãe dele e sua também! Lá estão tantos de seus parentes e amigos! Todos vencedores no Cristo vencedor!   (EE  232 ).
·   “...  pedir o que quero”: será aqui pedir conhecimento interno de tantos bens recebidos para que eu, reconhecendo-os inteiramente, possa em tudo amar e servir à sua divina Majestade” ( EE  233 ).

Santo Inácio nos propõem quatro passos para a Contemplação para alcançar Amor:

1. A Memória - Os dons recebidos de Deus (EE 234).

Este primeiro passo está intimamente relacionado com a 1ª Semana dos Exercícios... Fala das bênçãos e prodigalidades divinas: a Criação, a Redenção, o que Deus fez por mim, o que ele me deu, o seu grande desejo de dar-se a si próprio.
Trazer á memória todos os dons recebidos como: a Criação, a Redenção, os dons particulares: vida, família, amigos, acontecimentos, experiências... Recordando com muito afeto quanto Deus nosso Senhor fez por mim: recordar as pessoas que me ajudaram a encontrar Deus; os acontecimentos que me revelaram Deus; alguns lugares, paisagens que me falaram de Deus; algumas experiências que me fizeram sentir Deus em meu coração.
Precisamos “levantar os olhos das pedras do caminho” e apreciar a “chuva de graças”! São como raios que nos unem mais ao sol; como águas que nos vêm da fonte limpa.
         Considerar de minha parte o que devo oferecer e dar a sua divina Majestade, meus bens e a mim mesmo/a, como presente, com toda afeição.
Deste conhecimento interno de tanto bem recebido, surgirá, “com toda a afeição”, o oferecimento de mim mesmo/a :
 ‘Tomai, Senhor, e recebei toda a minha liberdade, a minha memória também, o meu entendimento e toda a minha vontade, tudo o que tenho e possuo Vós me destes com amor. Todos os dons que me destes com gratidão vos devolvo. Disponde deles Senhor, segundo a vossa vontade... Dai-me somente: o vosso amor vossa graça,  isto me basta nada mais quero pedir.” (EE 234).
Agradecer a Deus. Com Maria repetir seu canto: o “Magnificat”.
“Suscipe”: dizer a Deus que tudo o que é meu é dele.
Aprender com ele a amar os irmãos, sem buscar meu interesse, “amando primeiro” como Cristo.
Colocar à disposição dos outros os dons recebidos (1 Pd 4, 10 ).
         Quando alguém guarda uma profunda mágoa por seu passado, ou nunca experimentou a gratuidade do amor humano, ou tem algum problema de aceitação de si mesmo/a, dificilmente vai poder agradecer os benefícios recebidos.
        
2. A Presença - Deus se faz presente a mim em todas as coisas          (EE 235).

O segundo passo da CAA se relaciona com a Segunda Semana dos Exercícios... A Santíssima Trindade está presente em todos os seres, dando ser, viver, sentir, entender e amar.
Deus não se contenta com plenificar-nos de dons. Deus não só dá os seus presentes, mas vive neles. Não fica alheio ao que criou. Ele não despacha pelo “correio” e fica distante. Ele, ao contrário, está presente no dom; habita em todas  as criaturas... das mais imponentes e das que nos parecem sem utilidade e até desprezíveis...  faz crescer as plantas... dá sensibilidade aos animais... inteligência aos seres humanos. Habita em mim. Ele é quem me dá ser, vida, sentidos, inteligência... e me adota como filho, no Filho Jesus...  e faz do meu corpo templo do Espírito...

E me constitui pedra viva sobre o fundamento que é o Cristo, a pedra que é Pedro, na edificação espiritual, a Igreja, que vai ser expandida na Jerusalém celeste, cujas portas serão abertas para uma multidão mais numerosa do que as areias do mar, do que as estrelas do céu...
Essa presença de Deus se manifesta de muitos modos para aquele/a que crê. Cristo fica presente na Eucaristia, como aquele que se dá e que leva as pessoas a comungarem com ele, assumindo o compromisso de se darem a seus irmãos.
Perceber como na minha comunidade posso tornar-me presente aos outros. Na proporção do meu amor novo, identificar-me com a vida dos que mais sofrem necessidades, como Jesus.
É importante perceber que o sujeito da contemplação sou novamente eu. A consideração de Deus presente nas criaturas vai ascendendo como por uma escada: “Nos elementos... Nas plantas... Nos animais... Nos homens... Em mim...”, considerar como Deus está presente em mim é o que Santo Inácio pretende neste exercício.
Santo Inácio introduz como Deus faz de mim, templo seu. O mundo todo está em Deus. A Criação seria a contração de Deus como se Deus se contrai como uma mulher que dá à luz. Tudo isso exige uma resposta: - Tomai, Senhor, e recebei...
Um coração dilatado, não pensa em si mesmo é capaz de se abrir ao que Deus quer que se faça. “Rezem para que se abra uma porta à nossa palavra para que possamos anunciar o mistério de Cristo” (Col 4, 3). Quando eu estou fechado a realidade também se fecha.

3.      A Ação - O Senhor trabalha por mim (EE 236).

O terceiro passo da CAA, nos lembra a Terceira Semana dos EE., Cristo  sofre e morre por nós ( EE 197 ).
Considerar como Deus por mim trabalha e age em todas as coisas criadas sobre a terra. A presença de Deus é ativa. O amor de Deus trabalha por mim em Jesus Cristo. Deus não só é Vida, mas é presença que impulsiona a Vida. Deus não é um expectador da história, presente na arquibancada do Universo. Ele se engaja  e age na história.
A  palavra “trabalho” é sempre relacionada com o sofrimento.
Esse ponto de vista quer mostrar a habitação de Deus na criação é um habitar trabalhador.  A presença de Deus no mundo é laboriosa.
Contemplar o trabalho de Deus nas coisas criadas por minha causa. É no amor criativo da Trindade que age nas criaturas e opera em benefício dos que são capazes de conhecer esse amor: nós. Ver como Deus me sustenta, como me veste, cuida da minha saúde, revela-me a verdade, ordenando a ação de uns para o bem de outros. Maravilha da providência e do amor de Deus.
É em Cristo que a Trindade age mais evidentemente entre nós... Cristo Senhor, continua agindo como cabeça de seu Corpo, a Igreja, presente neste mundo vivificando-nos por seu Espírito.
Contemplar como eu me encontro nesse grande trabalho, recebendo inúmeros dons por meio da ação de Cristo em meus irmãos, que  com sua palavra e seu exemplo fazem o bem para minha salvação.

Contemplar como eu recebo também o poder de fazer o bem a meus irmãos e trabalhar para a salvação dos outros. Cristo se comunica aos outros pelo meu trabalho, pela minha palavra, pelo meu exemplo, pela minha paciência.

O terceiro passo da contemplação aponta na direção do Espírito. Fala-nos do “trabalho” de Deus, do Espírito que dá a vida. O “trabalho” do Espírito consiste em  nos mover, conduzir, levar-nos aos tempos e lugares onde nossa presença é necessária para construir o Reino de Deus. É obra do Espírito  mover-nos internamente, desinstalar-nos, converte-nos,  transformar nossos corações de terra em corações de carne
 (Ez 11,19).
Qual a minha resposta a um Deus que trabalha?
Renovar minha oblação, minha entrega, etc. Não procurar a oração como refúgio, como fuga, etc.


4.     A Participação – Todos os bens descem do alto (EE  237).

Tudo desce do alto: o limitado poder humano vem do Poder dele... assim como a justiça... a bondade... a piedade... a prudência... a misericórdia... a fé... a esperança..., a caridade sincera e sem fingimento. Nosso Deus é a Fonte de todo o bem, beleza, vitalidade... É o vivificador... o Santificador... o Salvador... o Restaurador... o Inovador.
“Olhar como todos os bens e dons descem do alto; tais como do sol descem os raios, da fonte as águas, etc.”
No quarto passo, contemplamos a presença de Deus através das criaturas. Podemos relacionar este 4º passo, com a Quarta Semana , o Senhor Ressuscitado, no seu papel de Consolador  comunicando o Espírito Santo, que nos abre o entendimento.,
O Deus presente e que age nos seus dons é um Deus que ama. A sua ação é libertadora. Deus quer se revelar, se comunicar, se doar. Seu ser transparece no seu agir. Ele inicia um diálogo com o homem e espera deste uma resposta “a sua imagem e semelhança”: resposta humana, livre, gratuita. Resposta de amor.

A vocação da pessoa humana é ser imagem e semelhança de Deus, isto é, “ser dom”; “estar presente” no dom; ser presença “ativa e criadora; deixar  “transparecer” em nós o amor de Deus. A fonte, a origem, é só Deus. Deus é fonte sempre.
Não podemos medir a nossa eficácia pastoral com critérios empresariais. Não importa quantos sejam nossos trabalhos pastorais ou ainda o lugar que ocupemos na Igreja: todo o nosso trabalho se resume em sermos “imagens de Cristo”, em sermos o bastante transparentes, de tal modo que outros – sem preconceitos, mas também sem precisarem ser adivinhos – possam descobrir a Cristo em nosso rosto, nosso jeito e nossas ações. Isto é o único importante – o jeito concreto de ser outro Cristo, isto é segui-lo.
Quem foi  “alcançado” pelo amor de Deus mergulha-se no oceano do acatamento reverencial.
A resposta a Deus só pode ser da mesma qualidade e sabor do dom recebido. A gente pode ser também dom: estar presente em tudo o que fazemos com o nosso toque pessoal e criativo, entregando-nos a nós mesmos com dedicação e alegria.
Inácio formulou uma bela oração.  Nós também podemos formular a nossa:
“ Tomai, Senhor , e recebei toda a minha liberdade, ...”
A pedagogia do “Ad Amorem”, CAA abre nossos olhos para contemplar e buscar Deus em todas as coisas e viver sempre na sua presença. O fruto último dos EE  é viver
a mística inaciana que  pode ser assim resumida :
- Ser contemplativo na ação.
- Amar Deus em todas as coisas e todas as coisas em Deus.





Salmo : Tudo é Dom do Amor

Manuel Eduardo Iglesias, SJ


A gente, Senhor, pode passar pela vida
como cego
se não enxergar o AMOR;
como surdo
se não escutar tua voz.

Dá-me, Senhor,
capacidade de ver e escutar!
Quem sou eu? Sou aquele que
poderia não ter existido, e existo.
Sou puro dom gratuito.

- O sol que me alegra,
a natureza que me sustenta,
o ar que eu respiro,
são dons que não mereço.

- Os pais que tenho,
os amigos e os colegas,
os sábios e os artistas,
são dons que me enriquecem.
- O Cristo, a fé, a Igreja,
Maria e os Santos,
A Eucaristia e o mundo,
são dons inesperados.

- O grande, Senhor, é que:
No sol,
nos amigos,
no Cristo,
na vida...
Tu estás presente,
Tu ages dia e noite,
Tu me dizes, lá dentro:
Eu te amo!

                                            Aminha vocação é
SER DOM, Senhor,
Para os outros, para ti.
Assim, através do meu dom,
Outros escutarão o que lhes dizes:
EU TE AMO!

        CEI-ITAICI
Curso de Capacitação para Orientadores de Exercícios Espirituais
1ª Etapa  -  09 a 18 de julho de 2010!
Ir. Teresa Cristina Potrick, ISJ
                           
    Bibliografia

Ø  Inácio de Loyola, Santo -  Exercícios Espirituais -  Apresentação, tradução e notas  do Centro de Espiritualidade Inaciana de Itaici –. Pg.  91 – 94 – Ed. Loyola, São Paulo, Brasil, 2000.

Ø  Iglesias, Manuel Eduardo SJ  -  Um retiro com São João e o Êxodo .pg.-82 – 84;

      Ed. Loyola .

Ø  Iglesias, Manuel Eduardo SJ – Um retiro com o Peregrino  – pg. 127 – 132 . Ed. Loyola

Ø    Antoncich, Ricardo SJ, - Quando rezarem digam: “Pai-Nosso...” – pg. 259-269.  Ed. Loyola.

Ø  Paiva, Raul SJ – Da Ceia ao Pai-Nosso – pg. 146 – 148.  Ed. Loyola

Ø  Almeida, D. Luciano Mendes , SJ – Servir por amor – pg. 165 – 174.  Ed Loyola.

Ø  Palaoro, Adroaldo, SJ  -  A Experiêmcia  Espiritual de Santo Inácio e a dinâmica interna dos

Exercícios – pg. 114 – 116 . Ed. Loyola.

Ø  Futrell, JohnCarroll, SJ – Cowan. CSJ, Marian  - Como dar um Retiro Inaciano.  Pg. 129 -130.

Ed. Loyola.

Ø  Herra, Javier Saravia, SJ -  Um Camino de amor Y Servicio . Centro Ignaciano de Espiritulidad

Guadalajara, Jal. México.

Ø  Revista: CEI_ITAICI – Navarro, Maria Ângeles – Dezembro/ 1997 : Nº 30 –– pg. 54 – 62.

Ø  Vazquez, Ulpiano, SJ – Meus apontamentos sobre: contemplação para Alcançar amor.  CEI- ITAICI.



sexta-feira, 21 de outubro de 2016

Carta aos Hebreus


Carta aos Hebreus

Apesar de ser habitualmente conhecido como “Carta”, este escrito do Novo Testamento não apresenta um início de carácter epistolar, mais parecendo o exórdio de um sermão (1,1-4). Tem um tom oratório, e o autor nunca aparece a dizer que escreve, mas sempre a dizer que fala (2,5; 5,11; 6,9; 8,1; 9,5; 11,32). Só nos últimos versículos (13,22-25) é que temos um final de Carta precedido por uma frase solene (13,20-21), que funciona como peroração. Considera-se, por isso, que estamos diante de um sermão destinado a ser pronunciado oralmente (1,1-13,21) e de um pequeno bilhete (13,22-25), que lhe foi acrescentado. Trata-se, então, mais de um discurso do que de uma Carta em sentido próprio.

DESTINATÁRIOS

Não encontramos no texto nenhuma referência aos Hebreus como destinatários, e nada indica que o grego em que está escrito seja uma tradução do hebraico. É, portanto, difícil dizer quais os seus destinatários, embora o título «aos Hebreus» seja muito antigo (séc. II).
Pode facilmente admitir-se que fosse dirigida a judeo-cristãos, saudosos do culto judaico que antes praticavam. O título parece justificar-se ainda mais, se tivermos em conta o conteúdo da Carta, pois ela pressupõe leitores bem conhecedores do culto e da liturgia judaica.

AUTOR, LOCAL E DATA

São igualmente imprecisos o autor, o local e a data da sua composição. As Igrejas do Oriente consideraram-na sempre como uma Carta paulina, apesar de muitos reconhecerem as suas diferenças em relação às outras Cartas de Paulo, sobretudo no que se refere à forma literária, à linguagem e estilo, à maneira de citar o AT e mesmo quanto à doutrina. A Igreja do Ocidente negou-lhe a autoria paulina até ao séc. IV e pôs, por vezes, em questão a sua condição de escrito inspirado e canónico.

A questão continuou controversa ao longo da história da exegese católica e protestante, mas actualmente é quase unânime a negação da autenticidade paulina. No entanto, admite-se que a Carta aos Hebreus tenha tido origem num companheiro ou discípulo de Paulo, pois há vários pontos de convergência entre ela e a doutrina do Apóstolo: a paixão de Cristo como obediência voluntária, a ineficácia da Lei antiga, a dimensão sacrificial e sacerdotal da redenção e alguns aspectos da cristologia. Trata-se, sem dúvida, de um sermão cristão, cuja origem remonta à Igreja Apostólica, e constitui, por isso, parte integrante da Palavra de Deus.

Há apenas um dado que pode apontar-nos para o lugar de composição. Trata-se de 13,24: «Os da Itália saúdam-vos.» Mas trata-se de uma expressão que nada ajuda, por ser muito vaga e se prestar a várias localizações.

Quanto à data de composição, não pode aceitar-se uma época muito tardia, pois Clemente de Roma cita-a por volta do ano 95. Por outro lado, a relativa afinidade entre a sua teologia e a das Cartas do cativeiro (Ef, Cl, Flm), aponta para uma data próxima do martírio de Paulo, situado pelo ano 67. Uma vez que o autor se refere à liturgia do templo de Jerusalém como uma realidade ainda actual, tudo parece convergir para que os últimos anos antes da destruição de Jerusalém e do Templo, ocorrida no ano 70, sejam a data mais provável da sua composição.

ESTRUTURA E CONTEÚDO

Não é fácil encontrar uma única estrutura para este livro. No entanto, propomos a seguinte:

Prólogo (1,1-4).
I. O Filho de Deus é superior aos anjos (1,5-2,18): prova escriturística (1,5-14); exortação (2,1-4); Cristo, irmão dos homens (2,5-18).
II. Jesus, Sumo Sacerdote fiel e misericordioso (3,1-5,10): fidelidade de Moisés e fidelidade de Jesus (3,1-6); entrada no repouso de Deus, pela fé (3,7-4,13); Jesus, Sumo Sacerdote misericordioso (4,14-5,10).
III. Sacerdócio de Jesus Cristo (5,11-10,18): normas de vida cristã (5,11-6,12); promessa e juramento de Deus (6,13-20).
1. Cristo é superior aos sacerdotes levitas (7,1-28): Melquisedec (7,1-10); sacerdote segundo a ordem de Melquisedec (7,11-28).
2. Sumo Sacerdote de uma nova aliança (8,1-9,28): o novo santuário e a nova aliança (8,1-13); insuficiência do culto antigo (9,1-10); o sacrifício de Cristo é definitivo (9,11-14); Cristo, o mediador da nova aliança pelo seu sangue (9,15-22); o perdão dos pecados pelo sacrifício de Cristo (9,23-28).
3. Recapitulação: sacrifício de Cristo superior ao de Moisés (10,1-18): ineficácia dos sacrifícios antigos (10,1-10); eficácia do sacrifício de Cristo (10,11-18).

IV. A fé perseverante (10,19-12,29): apelo a evitar a apostasia (10,19-39); a fé exemplar dos antepassados (11,1-40); o exemplo de Jesus (12,1-13); fidelidade à vocação cristã (12,14-29).
Apêndice (13,1-25): últimas recomendações (13,1-19); bênção e saudação final (13,20-25).

TEOLOGIA

Este escrito estabelece uma relação entre o Antigo e o Novo Testamento numa perspectiva cristológica. O tema central é o sacerdócio de Cristo e o culto cristão. A novidade é grande: uma pessoa, Jesus Cristo, Filho de Deus e irmão dos homens, é o Sumo Sacerdote superior a Moisés e comparável à figura misteriosa de Melquisedec. Pela sua morte e glorificação, Ele é o mediador entre Deus e os homens; o seu sacrifício substitui todos os sacrifícios antigos, que já não têm capacidade para elevar o homem até Deus. Pela sua morte, Cristo realiza o perdão dos pecados uma vez por todas, estabelece uma aliança nova e eterna com a humanidade e inaugura um novo culto, imagem do culto celeste.

A Carta apresenta várias vezes a Igreja como povo de Deus a caminho, e os cristãos, como alguém que partilha o destino de Cristo e é convidado a entrar no seu repouso. Há um itinerário cristão a percorrer, que passa pela conversão, pela fé perseverante, pela aprendizagem da Palavra de Deus e por uma vivência da caridade fraterna.

O cristão é aquele que se une a Cristo através da sua própria existência e não deve separar o culto da vida. Através de Cristo, o cristão oferece continuamente a Deus um sacrifício de louvor, no qual inclui toda a sua vida e particularmente o seu serviço aos outros e a sua caridade. Precisa de manter-se integrado na comunidade cristã, de escutar a Palavra e de se manter em comunhão com os responsáveis, pois não pode chegar a Deus sem estar unido a Cristo e aos irmãos.

A oferta de Cristo ao Pai «uma vez para sempre» (10,10.14; ver 9,26.28) constitui o grande acontecimento escatológico. Por meio deste gesto histórico cumpriu-se o plano salvífico de Deus, embora continue a caminhada histórica da humanidade até à sua entrada na glória. Quando todos os inimigos forem submetidos a Cristo e for vencida a morte e todas as forças históricas, teremos então a realização do último acto da História salvífica.





Carta a Tito


Carta a Tito

Tito foi, juntamente com Timóteo, um dos principais colaboradores de Paulo. De origem grega, aderiu à fé, provavelmente através de Paulo, durante a primeira viagem missionária deste. Certo é que o acompanhou a Jerusalém, para a assembleia apostólica, constituindo um exemplo vivo da decisão tomada de não impor os costumes judaicos aos cristãos oriundos do mundo pagão, pois, embora sendo grego, não foi obrigado a circuncidar-se (Gl 2,1.3).

AÇÃO DE TITO

Na sua colaboração com Paulo, foram-lhe confiadas tarefas delicadas como a organização da colecta em favor das igrejas da Judeia (2 Cor 8,6-17) e, provavelmente, a pacificação da comunidade de Corinto e a reconciliação entre esta e o próprio Paulo (2 Cor 2,1-13).
Paulo refere-se a ele sempre em termos muito elogiosos (2 Cor 7,6-7.13-16; 12,18). Segundo 2 Tm 4,10, foi-lhe ainda confiada uma missão na Dalmácia. A presente Carta dá-o como “bispo” de Creta (Tt 1,5), onde, segundo a tradição, exerceu o ministério até ao fim dos seus dias. É estranho que os Actos dos Apóstolos, que mencionam várias vezes Timóteo, não façam nenhuma referência a Tito. Nunca foi apresentada uma explicação convincente para o facto, sugerindo alguns que Tito é o redactor das passagens “nós” dos Actos (Act 16,10-17; 20,5-21,18; 27,1-28,16).

AUTENTICIDADE

A maioria dos exegetas contesta a autenticidade paulina da Carta a Tito, quer pelo vocabulário utilizado, que se afasta bastante do que encontramos nas autênticas Cartas de Paulo, quer pelos problemas tratados, que fazem supor uma fase de desenvolvimento da Igreja posterior à época apostólica.

Além disso, a Carta encontra-se redigida num tom muito impessoal, com excepção do título de «meu verdadeiro filho» que se encontra na saudação (1,4), longe, pois, das afectuosas referências de Paulo a Tito noutras Cartas.

DIVISÃO E CONTEÚDO

A Carta pode estruturar-se do modo seguinte:
Saudação inicial (1,1-4);
Orientações a Tito sobre os critérios de escolha dos responsáveis das comunidades (1,5-9);
Aviso contra os falsos mestres (1,10-16);
Ensinamentos sobre o modo de comportamento de várias categorias de crentes (2,1-15);
Elenco de deveres sociais (3,1-11);
Recomendações de carácter pessoal (3,12-14);
Saudação final (3,15).



Carta a Filemón


Carta a Filémon

Pelo tema e pelo tom afectuoso, esta é certamente uma Carta autêntica de Paulo (v.19). Filémon era um cristão de elevada posição social, convertido por Paulo, e tinha como escravo um outro cristão, Onésimo. Este, tendo fugido ao seu senhor, refugiou-se junto de Paulo (v.10), que o refere em Cl 4,9 como «irmão fiel e querido». Este facto era motivo de graves penas civis, tanto para o escravo como para quem o acolhia.

Paulo, prescindindo da questão legal, envia-o ao seu senhor com o presente “bilhete” e pede a Filémon que acolha de novo, não como escravo, mas «como irmão querido» (v.16), um irmão na fé. Mais: como se fosse o próprio Paulo (v.17).

LUGAR

Pelo que é dito no v.1, a Carta terá sido escrita num dos cativeiros de Paulo (Roma, Éfeso ou Cesareia), nos últimos anos da sua vida (ver v.9-10.13.18). Os companheiros referidos aqui (v.23-24) são os mencionados em Cl 4,7-17.

DIVISÃO E CONTEÚDO

Esta tem a estrutura normal das Cartas de Paulo:
Apresentação e saudação: v.1-3;
Acção de graças: v.4-7;
Corpo da Carta: v.8-22;
Saudação final: v.23-25.

TEOLOGIA

Como noutras ocasiões em que trata a questão da escravatura, Paulo não se preocupa em mudar a estrutura social em vigor (1 Cor 7,20-24; Ef 6,5-9; Cl 3,22-4,1). O que ele faz é prescindir disso e deslocar o problema para a questão do amor fraterno, mais profunda que a questão legal em vigor, pois, em Cristo, «não há escravo nem livre» (Gl 3,28).

Daí em diante, Filémon deve tratar o (antigo) escravo Onésimo como irmão, porque Paulo está disposto a recompensá-lo monetariamente, isto é, a resgatar Onésimo.

Com isto, Paulo, embora não se oponha frontalmente à escravatura, tão-pouco a aprova; e afirma que o amor fraterno, centro do Evangelho de Cristo, é que levará à eliminação da escravatura.