Expressionismo
Fränzi perante uma cadeira talhada (1910), de Ernst Ludwig
Kirchner, Museu Thyssen-Bornemisza, Madrid.
O Expressionismo foi um movimento artístico e cultural de
vanguarda surgido na Alemanha no início do século XX, transversal aos campos
artísticos da arquitetura, artes plásticas, literatura, música, cinema, teatro,
dança e fotografia. Manifestou-se inicialmente através da pintura, coincidindo
com o aparecimento do fauvismo francês, o que tornaria ambos os movimentos
artísticos os primeiros representantes das chamadas "vanguardas
históricas". Mais do que meramente um estilo com características em comum,
o Expressionismo é sinónimo de um amplo movimento heterogéneo, de uma atitude e
de uma nova forma de entender a arte, que aglutinou diversos artistas de várias
tendências, formações e níveis intelectuais. O movimento surge como uma reacção
ao positivismo associado aos movimentos impressionista e naturalista, propondo
uma arte pessoal e intuitiva, onde predominasse a visão interior do artista – a
"expressão" – em oposição à mera observação da realidade – a
"impressão".
O expressionismo compreende a deformação da realidade para
expressar de forma subjectiva a natureza e o ser humano, dando primazia à
expressão de sentimentos em relação à simples descrição objetiva da realidade.
Entendido desta forma, o expressionismo não tem uma época ou um espaço
geográfico definidos, e pode mesmo classificar-se como expressionista a obra de
autores tão diversos como o holandês Piet Zwiers, Matthias Grünewald, Pieter
Brueghel, o Velho, El Greco ou Francisco de Goya. Alguns historiadores, de
forma a estabelecer uma distinção entre termos, preferem o uso de
"expressionismo" – em minúsculas – como termo genérico, e
"Expressionismo" – com inicial maiúscula – para o movimento alemão.
Através de uma paleta cromática vincada e agressiva e do
recurso às temáticas da solidão e da miséria, o expressionismo é um reflexo da
angústia e ansiedade que dominavam os círculos artísticos e intelectuais da
Alemanha durante os anos anteriores à Primeira Guerra Mundial (1914-1918) e que
se prolongaria até ao fim do período entre-guerras (1918-1939). Angústia que
suscitou um desejo veemente de transformar a vida, de alargar as dimensões da
imaginação e de renovar a linguagem artística. O expressionismo defendia a
liberdade individual, o primado da subjectividade, o irracionalismo, o
arrebatamento e os temas proibidos – o excitante, diabólico, sexual, fantástico
ou perverso. Pretendeu ser o reflexo de uma visão subjectiva e emocional da
realidade, materializada através da expressividade dos meios plásticos, que
adquiriram uma dimensão metafísica, abrindo os sentidos ao mundo interior.
Muitas vezes visto como genuína expressão da alma alemã, o seu carácter
existencialista, o seu anseio metafísico e a sua visão trágica do ser humano
são características inerentes a uma concepção existencial aberta ao mundo
espiritual e às questões da vida e da morte. Fruto das peculiares
circunstâncias históricas em que surge, o expressionismo veio revelar o lado
pessimista da vida e a angústia existencialista do indivíduo, que na sociedade
moderna, industrializada, se vê alienado e isolado.
O expressionismo não foi um movimento homogéneo, coexistindo
vários polos artísticos com uma grande diversidade estilística, como a corrente
modernista (Munch), fauvista (Rouault), cubista e futurista (Die Brücke),
surrealista (Klee), ou a abstracta (Kandinsky). Embora o seu maior polo de
difusão se encontrasse na Alemanha, o expressionismo manifestou-se também por
meio de artistas provenientes de outras partes da Europa como Modigliani,
Chagall, Soutine ou Permeke, e no continente americano como, por exemplo, os
mexicanos Orozco, Rivera, Siqueiros e o brasileiro Portinari. Na Alemanha
existiram dois grupos dominantes: Die Brücke (fundado em 1905), e Der Blaue
Reiter (fundado em 1911), embora tenha havido artistas independentes e não
afiliados com nenhum dos grupos. Depois da Primeira Guerra Mundial surge a Nova
Objetividade que, embora tenha sido uma reação ao individualismo expressionista
e procurasse a função social na arte, a sua distorção das formas e o seu
intenso colorido fazem do grupo um herdeiro directo da primeira geração
expressionista.
Definição
Ecce homo (1925), de Lovis Corinth, Pinacoteca de Basileia.
A transição do século XIX para XX assistiu a inúmeras
transformações políticas, sociais e culturais. A burguesia vive um período
áureo de grande ostentação económica e influência política, a Belle Époque, que
se manifestaria nas artes através do modernismo, movimento artístico que
responde ao luxo e ostentação copiosos procurados pela nova classe dirigente.
No entanto, o receio perante a ocorrência de um novo episódio revolucionário,
face às constantes revoluções ocorridas ao longo de todo o século XIX desde a Revolução
Francesa (o último em 1871, durante a Comuna de Paris), levou a classe política
a decretar uma série de concessões sociais, como a reforma laboral, a segurança
social e o ensino básico obrigatório. A queda da taxa de analfabetismo e o
aumento da literacia traduziu-se no crescimento assinalável dos meios de
comunicação social, e numa difusão dos fenómenos culturais a uma escala e
velocidade sem precedentes que estaria na origem da cultura de massas.
O progresso tecnológico no campo das artes, sobretudo depois
da aparição da fotografia e do cinema, faz com que toda a comunidade artística
se interrogue sobre o seu papel na sociedade. A imitação da realidade deixou de
fazer sentido, uma vez que as novas técnicas tornaram o processo mais fácil,
rápido e reprodutível. As novas teorias científicas como a teoria da
relatividade de Einstein, a psicanálise de Freud ou a subjectividade do tempo
de Bergson, abriram a porta a noções subjectivas da realidade, fornecendo
elementos para que o mundo artístico se questionasse sobre as próprias
fronteiras da objectividade. A procura de novas linguagens artísticas e novas
formas de expressão traduziu-se na formação de vários movimentos de vanguarda
que exploravam uma nova relação do artista com o público. Os vanguardistas
pretendem integrar a arte com a própria sociedade e fazer da sua obra uma
expressão do inconsciente coletivo da sociedade que representava. Por sua vez,
a interacção com o espectador leva a que este se envolva na percepção e
compreensão da obra, assim como na sua difusão e mercantilização, factor que
estará na origem do crescimento exponencial das galerias de arte e dos museus.
O expressionismo integra aquilo que se convencionou designar
por "vanguardas históricas"; o imenso grupo de movimentos artísticos
surgidos desde o início do século XX anterior à I Guerra Mundial até o fim da
II Guerra Mundial em 1945. Esta designação inclui ainda, entre outros, o
fauvismo, o cubismo, o futurismo, o construtivismo, o neoplasticismo, o
dadaísmo e o surrealismo. A vanguarda está intimamente ligada ao conceito de
modernidade, caracterizado pelo fim do determinismo e da supremacia da
religião, substituídos pela razão e pela ciência, pelo objectivismo e pelo
individualismo, e pela a confiança na tecnologia, no progresso e nas próprias
capacidades do ser humano. O artista pretende desta forma colocar-se a si
próprio na linha da frente do progresso social e dar voz às ideias progressistas
através da sua obra.
O termo "expressionismo" foi utilizado pela
primeira vez pelo pintor francês Julien-Auguste Hervé, que usou a palavra
"expressionisme" para designar uma série de quadros apresentados no
Salão dos Independentes de Paris em 1901, assumindo a sua diferença em relação ao
impressionismo. O termo alemão "expressionismus" foi adaptado
directamente do francês, tendo sido referido pela primeira vez no catálogo da
XXII Exposição da Secessão de Berlim em 1911, que reunia obras de artistas
alemães e franceses. Na literatura, foi usado pela primeira vez em 1911 pelo
crítico Kurt Hiller. Já numa fase posterior, o termo "expressionismo"
foi popularizado pelo escritor Herwarth Walden, editor da revista Der Sturm (A
tormenta), que se viria a tornar o principal meio de divulgação do
expressionismo alemão. Walden usou inicialmente o termo para todas as
vanguardas surgidas entre 1910 e 1920. O seu uso de forma exclusiva para a arte
alemã de vanguarda surge a partir de uma proposta de Paul Fechter no seu livro
Der Expressionismus (1914) que, com base nas teorias de Worringer, veio a
estabelecer uma relação entre as novas manifestações artísticas e a expressão
da alma coletiva alemã.
Tirol (1914), de Franz Marc, Staatsgalerie Moderner Kunst,
Munique.
O expressionismo surge a partir de uma reacção ao
impressionismo. Ao contrário dos impressionistas, que procuravam no espaço da
tela transmitir uma "impressão" do mundo à sua volta, os
expressionistas procuravam representar o seu próprio mundo interior, uma
"expressão" dos seus próprios sentimentos. A linha e a cor são usadas
de forma emotiva e carregadas de simbolismo. Esta ruptura com a geração
precedente fez com que o expressionismo se tornasse sinónimo de arte moderna
durante os primeiros anos do século XX. O expressionismo implicou um novo
conceito da arte, entendida como uma forma de captar a existência, de
transluzir em imagens o substrato que subjaze sob a realidade aparente, de
refletir o imutável e eterno do ser humano e a natureza. Assim, o
expressionismo foi o ponto de partida de um processo de transmutação da
realidade que cristalizou no expressionismo abstrato e o informalismo. Os
expressionistas utilizavam a arte como uma forma de refletir os seus
sentimentos, o seu estado anímico, propenso pelo general à melancolia, à evocação,
a um decadentismo de corte neorromântico. Assim, a arte era uma experiência
catárquica, onde se purificavam os desafogos espirituais, a angústia vital do
artista.
Na gênese do expressionismo, um fator fundamental foi a
recusa do positivismo, do progresso cientificista, da crença nas possibilidades
ilimitadas do ser humano baseadas na ciência e a técnica. Por outro lado,
começou um novo clima de pessimismo, de ceticismo, de descontentamento, de
crítica, de perda de valores. Vislumbrava-se uma crise no desenvolvimento
humano, que efetivamente foi confirmada com o estouro da Primeira Guerra
Mundial. Também cabe destacar-se na Alemanha a recusa do regime imperialista de
Guilherme II por parte de uma minoria intelectual, afogada pelo militarismo
pangermanista do cáiser. Estes fatores propiciaram um caldo de cultura no que o
expressionismo se foi gestando progressivamente, com umas primeiras
manifestações no terreno da literatura: Frank Wedekind denunciou nas suas obras
a moral burguesa, frente à qual opunha a liberdade passional dos instintos;
Georg Trakl evadiu-se da realidade refugiando-se num mundo espiritual criado
pelo artista; Heinrich Mann foi quem mais diretamente denunciou a sociedade
guilhermina.
A aparição do expressionismo num país como a Alemanha não foi
um fato aleatório, mas é explicado pelo profundo estudo da arte durante o
século XIX pelos filósofos, artistas e teóricos alemães, do romantismo e as
múltiplas contribuições para o campo da estética de personagens como Wagner e Nietzsche,
para a estética cultural e para a obra de autores como Konrad Fiedler
("Para julgar obras de arte visual", 1876), Theodor Lipps
("Estética", 1903-1906) e Wilhelm Worringer ("Abstração e
empatia", 1908). Esta corrente teórica deixou uma profunda marca nos
artistas alemães de finais do século XIX e princípios do XX, centrada sobretudo
na necessidade de se expressar do artista (a "innerer Drang" ou
necessidade interior, princípio que assumiu posteriormente Kandinsky), bem como
a constatação de uma ruptura entre o artista e o mundo exterior, o ambiente que
o envolve, fato que o torna num ser introvertido e alienado da sociedade.
Também influiu a mudança acontecida no ambiente cultural da época, que se
afastou do gosto clássico greco-romano para admirar a arte popular, primitiva e
exótica –sobretudo da África, Oceania e Extremo Oriente–, bem como a arte
medieval e a obra de artistas como Grünewald, Brueghel e El Greco.
"O ginete circense" (1913), de Ernst Ludwig
Kirchner, Pinakothek der Moderne, Munique.
Na Alemanha, o expressionismo foi mais um conceito teórico,
uma proposta ideológica, do que um programa artístico coletivo, se bem que se
aprecia um selo estilístico comum a todos os seus membros. Frente ao
academicismo imperante nos centros artísticos oficiais, os expressionistas
agruparam-se em torno de diversos centros de difusão da nova arte,
especialmente em cidades como Berlim, Colônia, Munique, Hanôver e Dresden.
Assim mesmo, o seu trabalho difusor através de publicações, galerias e
exposições ajudaram a estender o novo estilo por toda Alemanha e, mais tarde,
toda Europa. Foi um movimento heterogêneo que, à parte da diversidade das suas
manifestações, realizadas em diversas linguagens e meios artísticos, apresentou
numerosas diferenças e até mesmo contradições no seu seio, com grande
divergência estilística e temática entre os diversos grupos que surgiram ao
longo do tempo, e até mesmo entre os próprios artistas que os integravam. Até
mesmo os limites cronológicos e geográficos desta corrente são imprecisos: se
bem que a primeira geração expressionista (Die Brücke, Der Blaue Reiter) foi a
mais emblemática, a Nova Objetividade e a exportação do movimento a outros
países implicou a sua continuidade no tempo ao menos até a Segunda Guerra
Mundial; geograficamente, se bem que o centro neurálgico deste estilo se situou
na Alemanha, pronto se estendeu por outros países europeus e inclusive do
continente americano.
Depois da Primeira Guerra Mundial o expressionismo passou na
Alemanha da pintura ao cinema e ao teatro, que utilizavam o estilo
expressionista nos seus décors, mas de modo puramente estético, desprovido do
seu significado original, da subjetividade e do pungimento próprios dos
pintores expressionistas, que se tornaram paradoxalmente em artistas malditos.
Com o advento do nazismo, o expressionismo foi considerado como "arte
degenerada" (Entartete Kunst), relacionando-o com o comunismo e tachando-o
de imoral e subversivo, ao tempo que consideraram que a sua fealdade e
inferioridade artística eram um signo da decadência da arte moderna (o
decadentismo, pela sua vez, fora um movimento artístico que teve certo
desenvolvimento). Em 1937 uma exposição foi organizada no Hofgarten de Munique
com o título precisamente de Arte degenerada, visando injuriá-lo e mostrar ao
público a baixa qualidade da arte produzida na República de Weimar. Para tal
fim foram confiscadas cerca de 16 500 obras de diversos museus, não apenas de
artistas alemães, mas de estrangeiros como Gauguin, Van Gogh, Munch, Matisse,
Picasso, Braque e Chagall. A maioria dessas obras foram vendidas posteriormente
a galeristas e marchands, sobretudo num grande leilão celebrado em Lucerna em
1939, embora cerca de 5000 dessas obras foram diretamente destruídas em março
de 1939, supondo um notável prejuízo para a arte alemã.
Após a Segunda Guerra Mundial o expressionismo desapareceu
como estilo, se bem que exercesse uma poderosa influência em muitas correntes
artísticas da segunda metade de século, como o expressionismo abstrato norte-americano
(Jackson Pollock, Mark Rothko, Willem de Kooning), o informalismo (Jean
Fautrier, Jean Dubuffet), o grupo CoBrA (Karel Appel, Asger Jorn, Corneille,
Pierre Alechinsky) e o neoexpressionismo alemão –diretamente herdeiro dos
artistas de Die Brücke e Der Blaue Reiter, o qual é patente no seu nome, e
artistas individuais como Francis Bacon, Antonio Saura, Bernard Buffet, Nicolas
de Staël e Horst Antes.
Origens e
influências
A Crucificação, tábua central do Retábulo de Issenheim
(1512-1516), de Matthias Grünewald, Museu de Unterlinden, Colmar.
Embora por expressionismo fosse conhecido nomeadamente o
movimento artístico desenvolvido na Alemanha em princípios do século XX, muitos
historiadores e críticos da arte também empregam este termo mais genericamente
para descrever o estilo de grande variedade de artistas ao longo de toda a
História. Entendida como a deformação da realidade para buscar uma expressão
mais emocional e subjetiva da natureza e do ser humano, o expressionismo é pois
extrapolável a qualquer época e espaço geográfico. Assim, com frequência
qualificou-se de expressionista a obra de diversos autores como Hieronymus
Bosch, Matthias Grünewald, Quentin Matsys, Pieter Brueghel, o Velho, El Greco,
Francisco de Goya e Honoré Daumier.
As raízes do expressionismo encontram-se em estilos como o
simbolismo e o pós-impressionismo, bem como nos Nabis e em artistas como Paul
Cézanne, Paul Gauguin e Vincent Van Gogh. Assim mesmo, têm pontos de contato
com o neoimpressionismo e o fauvismo pela sua experimentação com a cor. Os
expressionistas receberam numerosas influências: em primeiro lugar a da arte
medieval, especialmente a gótica alemã. De signo religioso e caráter
transcendente, a arte medieval punha ênfase na expressão, não nas formas: as
figuras tinham pouca corporeidade, perdendo interesse pela realidade, as
proporções, a perspectiva. Por outro lado, acentuava a expressão, sobretudo na
olhada: as personagens eram simbolizas mais que representadas. Assim, os expressionistas
inspiraram-se nos principais artistas do gótico alemão, desenvolvido através de
duas escolas fundamentais: o estilo internacional (finais do século
XIV-primeira metade do XV), representado por Conrad Soest e Stefan Lochner; e o
estilo flamengo (segunda metade do século XV), desenvolvido por Konrad Witz,
Martin Schongauer e Hans Holbein, o Velho. Também se inspiraram na escultura
gótica alemã, que salientou pela sua grande expressividade, com nomes como Veit
Stoss e Tilman Riemenschneider. Outro ponto de referência foi Matthias
Grünewald, pintor tardo-medieval que, embora conhecesse as inovações do
Renascimento, seguiu numa linha pessoal, caracterizada pela intensidade
emocional, uma expressiva distorção formal e um intenso colorido incandescente,
como na sua obra mestra, o Retábulo de Isenheim.
Outro dos referentes da arte expressionista foi a arte
primitiva, especialmente a da África e Oceania, difundida desde finais do
século XIX pelos museus etnográficos. As vanguardas artísticas encontraram na
arte primitiva uma maior liberdade de expressão, originalidade, novas formas e
materiais, uma nova concepção do volume e da cor, bem como uma maior
transcendência do objeto, pois nestas culturas não eram simples obras de arte,
mas tinham uma finalidade religiosa, mágica, totêmica, votiva, suntuária. São objetos
que expressam uma comunicação direta com a natureza e com as forças
espirituais, com cultos e rituais, sem nenhum de tipo de mediação ou
interpretação.
A igreja de Auvers-sur-Oise (1890), de Vincent Van Gogh,
Musée d'Orsay, Paris.
Mas a maior inspiração veio do pós-impressionismo,
especialmente da obra de três artistas: Paul Cézanne, que começou um processo
de desfragmentação da realidade em formas geométricas que terminou no cubismo,
reduzindo as formas a cilindros, cones e esferas, e dissolvendo o volume a
partir dos pontos mais essenciais da composição. Colocava a cor por camadas,
imbricando umas cores com outras, sem necessidade de linhas, trabalhando com
manchas. Não utilizava a perspectiva, mas a superposição de tons cálidos e
frios davam sensação de profundeza. Em segundo lugar Paul Gauguin, que
contribuiu uma nova concepção entre o plano pictórico e a profundeza do quadro,
através de cores planas e arbitrárias, que têm um valor simbólico e decorativo,
com cenas de difícil classificação, situadas entre a realidade e um mundo
onírico e mágico. A sua estadia em Taiti provocou que a sua obra derivasse em
um certo primitivismo, com influência da arte da Oceania, refletindo o mundo
interior do artista em vez de imitar a realidade. Finalmente, Vincent Van Gogh
elaborava a sua obra segundo critérios de exaltação anímica, caracterizando-se
pela falta de perspectiva, a instabilidade dos objetos e cores, roçando a
arbitrariedade, sem imitar a realidade, mas provêm do interior do artista.
Devido à sua frágil saúde mental, as suas obras são reflexo do seu estado de
ânimo, depressivo e torturado, refletindo-se em obras de pinceladas sinuosas e
cores violentas.
Cabe sublinhar a influência de dois artistas que os
expressionistas consideraram como precedentes imediatos: o norueguês Edvard
Munch, influenciado nos seus começos pelo impressionismo e o simbolismo, pronto
derivou para um estilo pessoal que seria fiel reflexo do seu interior obsessivo
e torturado, com cenas de ambiente opressivo e enigmático –centradas no sexo, a
doença e a morte–, caracterizadas pela sinuosidade da composição e um colorido
forte e arbitrário. As imagens angustiosas e desesperadas de Munch –como em O
Grito (1893), paradigma da solidão e da incomunicação– foram um dos principais
pontos de arranque do expressionismo. Igual de influente foi a obra do belga
James Ensor, que recolheu a grande tradição artística do seu país –em especial
Brueghel–, com preferência por temas populares, traduzindo-o em cenas
enigmáticas e irreverentes, de caráter absurdo e burlesco, com um senso do
humor ácido e corrosivo, centrado em figuras de vagabundos, borrachos,
esqueletos, máscaras e cenas de carnaval. Assim, "A entrada de Cristo em
Bruxelas" (1888) representa a Paixão de Jesus no meio de um desfile de
carnaval, obra que causou um grande escândalo no seu momento.
Arquitetura
Goetheanum (1923), de Rudolf Steiner, Dornach.
A arquitetura expressionista desenvolveu-se nomeadamente na
Alemanha, Países Baixos, Áustria, Checoslováquia e Dinamarca. Caracterizou-se
pelo uso de novos materiais, suscitado ocasionalmente pelo uso de formas
biomórficas ou pela ampliação de possibilidades oferecida pela fabricação
massiva de materiais de construção como o tijolo, o aço ou o vidro. Muitos
arquitetos expressionistas combateram na Primeira Guerra Mundial, e a sua
experiência, combinada com os câmbios políticos e sociais produto da Revolução
Alemã de 1918-1919, terminaram em perspectivas utópicas e um programa
socialista romântico. A arquitetura expressionista recebeu a influência do
modernismo, sobretudo da obra de arquitetos como Henry van de Velde, Joseph
Maria Olbrich e Antoni Gaudí. De caráter fortemente experimental e utópico, as
realizações dos expressionistas destacam-se pela sua monumentalidade, o emprego
do tijolo e da composição subjetiva, que outorga às suas obras certo ar de
excentricidade.
Um contribuinte teórico à arquitetura expressionista foi o
ensaio Arquitetura de cristal (1914) de Paul Scheerbart, no que ataca o
funcionalismo pela sua falta de artisticidade e defende a substituição do
tijolo pelo cristal. Assim, por exemplo, o Pavilhão de Cristal da Exposição de
Colônia de 1914, de Bruno Taut, autor que também plasmou o seu ideário por
escrito (Arquitetura alpina, 1919). A arquitetura expressionista desenvolveu-se
em diversos grupos, como a Deutscher Werkbund, Arbeitsrat für Kunst, Der Ring e
Neus Bauen, ligado este último à Nova Objetividade; também cabe destacar-se a
Escola de Amsterdam. Os principais arquitetos expressionistas foram Bruno Taut,
Walter Gropius, Erich Mendelsohn, Hans Poelzig, Hermann Finsterlin, Fritz
Höger, Hans Scharoun e Rudolf Steiner.
Deutscher
Werkbund
Pavilhão de Cristal para a Exposição de Colônia de 1914, de
Bruno Taut.
A Deutscher Werkbund (Federação alemã do trabalho) foi o
primeiro movimento arquitetônico relacionado ao expressionismo na Alemanha.
Fundada em Munique a 9 de outubro de 1907 por Hermann Muthesius, Friedrich
Naumann e Karl Schmidt, incorporou posteriormente figuras como Walter Gropius,
Bruno Taut, Hans Poelzig, Peter Behrens, Theodor Fischer, Josef Hoffmann,
Wilhelm Kreis, Adelbert Niemeyer e Richard Riemerschmidt. Herdeira do Jugendstil
e da Sezession vienesa, e inspirada no movimento Arts & Crafts, o seu
objetivo era a integração de arquitetura, indústria e artesanato através do
trabalho profissional, da educação e da publicidade, bem como introduzir o
desenho arquitetônico na modernidade e conferir-lhe um caráter industrial. As
principais características do movimento foram o uso de novos materiais como o
vidro e o aço, a importância do desenho industrial e o funcionalismo
decorativo.
A Deutscher Werkbund organizou diversas conferências
publicadas posteriormente em forma de anuários, como A arte na indústria e no
comércio (1913) e O transporte (1914). Assim mesmo, em 1914 celebraram uma
exposição em Colônia que obteve um grande sucesso e difusão internacional,
destacando-se o pavilhão de vidro e aço desenhado por Bruno Taut. O sucesso da
exposição provocou um grande auge do movimento, que passou de ter 491 membros
em 1908 a 3000 em 1929. Durante a Primeira Guerra Mundial esteve prestes a
desaparecer, mas ressurgiu em 1919 após uma convenção em Stuttgart, onde Hans
Poelzig foi eleito presidente –substituído em 1921 por Riemerschmidt–. Durante
esses anos decorreram várias controvérsias sobre se devia primar o desenho
industrial ou o artístico, ocorrendo diversas dissensões no grupo.
Na década de 1920 o movimento derivou do expressionismo e do
artesanato para o funcionalismo e a indústria, incorporando novos membros como
Ludwig Mies van der Rohe. Uma nova revista foi editada, Die Form (1922-1934),
que difundiu as novas ideias do grupo, centradas no aspecto social da
arquitetura e no desenvolvimento urbanístico. Em 1927 celebraram uma nova
exposição em Stuttgart, construindo uma grande colônia de moradias, a
Weissenhofsiedlung, com desenho de Mies van der Rohe e edifícios construídos
por Gropius, Behrens, Poelzig, Taut, etc., junto a arquitetos de fora da
Alemanha como Jacobus Johannes Pieter Oud, Le Corbusier e Victor Bourgeois.
Esta amostra foi um dos pontos de partida do novo estilo arquitetônico que
começava a surgir, conhecido como estilo internacional ou racionalismo. A
Deutscher Werkbund dissolveu-se em 1934 devido nomeadamente à crise econômica e
ao nazismo. O seu espírito influiu enormemente na Bauhaus, e inspirou a
fundação de organismos parecidos em outros países, como Suíça, Áustria, Suécia
e Grã-Bretanha.
Escola de
Amsterdam
Paralelamente à Deutscher Werkbund alemã, entre 1915 e 1930
uma notável escola arquitetônica de caráter expressionista desenvolveu-se em
Amsterdam (Países Baixos). Influenciados pelo modernismo (nomeadamente Henry
van de Velde e Antoni Gaudí) e por Hendrik Petrus Berlage, inspiraram-se nas
formas naturais, com edifícios de desenho imaginativo onde predomina o uso do
tijolo e do concreto. Os seus principais membros foram Michel de Klerk, Piet
Kramer e Johan van der Mey, que trabalharam conjuntamente múltiplas vezes,
contribuindo em grande maneira ao desenvolvimento urbanístico de Amsterdam, com
um estilo orgânico inspirado na arquitetura tradicional holandesa, destacando-se
as superfícies onduladas. As suas principais obras foram Scheepvaarthuis (Van
der Mey, 1911-1916) e Eigen Haard Estate (De Klerk, 1913-1920).
Arbeitsrat
für Kunst
Torre Einstein (1919-22), de Erich Mendelsohn, Potsdam.
O Arbeitsrat für Kunst (Conselho de trabalhadores da arte)
foi fundado em 1918 em Berlim pelo arquiteto Bruno Taut e o crítico Adolf
Behne. Surgido após o fim da Primeira Guerra Mundial, o seu objetivo era a
criação de um grupo de artistas que pudesse influir no novo governo alemão, com
vistas à regeneração da arquitetura nacional, com um claro componente utópico.
As suas obras destacam-se pelo uso do vidro e do aço, bem como pelas formas
imaginativas e carregadas de um intenso misticismo. De seguida captaram membros
provenientes da Deutscher Werkbund, como Walter Gropius, Erich Mendelsohn, Otto
Bartning e Ludwig Hilberseimer, e contaram com a colaboração de outros
artistas, como os pintores Lyonel Feininger, Erich Heckel, Karl
Schmidt-Rottluff, Emil Nolde e Max Pechstein, e os escultores Georg Kolbe,
Rudolf Belling e Gerhard Marcks. Esta variedade é explicada porque as
aspirações do grupo eram mais políticas que artísticas, visando a influir nas
decisões do novo governo em torno à arte e à arquitetura. Contudo, após os
acontecimentos de janeiro de 1919 relacionados à Liga Espartaquista, o grupo
renunciou aos seus fins políticos, dedicando-se a organizar exposições. Taut
demitiu como presidente, sendo substituído por Gropius, embora finalmente se
dissolvessem a 30 de maio de 1921.
Der Ring
Chilehaus (1923), de Fritz Höger, Hamburgo.
O grupo Der Ring (O círculo) foi fundado em Berlim em 1923
por Bruno Taut, Ludwig Mies van der Rohe, Peter Behrens, Erich Mendelsohn, Otto
Bartning, Hugo Häring e vários arquitetos mais, aos que se acrescentaram Walter
Gropius, Ludwig Hilberseimer, Hans Scharoun, Ernst May, Hans e Wassili
Luckhardt, Adolf Meyer, Martin Wagner, etc. O seu objetivo era, assim como nos
movimentos precedentes, renovar a arquitetura da sua época, pondo especial
ênfase nos aspectos sociais e urbanísticos, bem como no estudo de novos
materiais e técnicas de construção. Entre 1926 e 1930 desenvolveram um notável
trabalho de construção de moradias sociais em Berlim, com casas que se destacam
pelo aproveitamento da luz natural e a sua situação em zonas verdes,
destacando-se a Hufeisensiedlung (Colônia da Ferradura, 1925-1930), de Taut e
Wagner. Der Ring desapareceu em 1933 após o advento do nazismo.
Neues Bauen
Neues Bauen (novo edifício) foi o nome que se deu em
arquitetura à Nova Objetividade, reação directa aos excessos estilísticos da
arquitetura expressionista e o câmbio no estado de ânimo nacional, no que
predominava o componente social sobre o individual. Arquitetos como Bruno Taut,
Erich Mendelsohn e Hans Poelzig voltaram-se para o enfoque simples, funcional e
prático da Nova Objetividade. A Neues Bauen floresceu no breve período entre a
adoção do plano Dawes e o auge do nazismo, abrangendo exposições públicas como
o Weissenhof Estate, o amplo planejamento urbano e projetos de promoções
públicas de Taut e Ernst May, e os influentes experimentos da Bauhaus.
Escultura
O espírito guerreiro (1928), de Ernst Barlach,
Gethsemanekirche, Berlim.
A escultura expressionista não teve um selo estilístico
comum, sendo o produto individual de vários artistas que refletiram na sua obra
quer a temática quer a distorção formal próprias do expressionismo. Destacam-se
especialmente três nomes:
Ernst Barlach: inspirado na arte popular russa –após uma
viagem ao país eslavo em 1906– e na escultura medieval alemã, bem como em Brueghel
e Hieronymus Bosch, as suas obras têm certo ar caricaturesco, trabalhando muito
o volume, a profundeza e a articulação do movimento. Desenvolveu duas temáticas
principais: a popular (costumes quotidianos, cenas campesinas) e –sobretudo
depois da guerra– o medo, a angustia, o terror. Não imitava a realidade, mas
criava uma realidade nova, jogando com as linhas quebradas e com os ângulos,
com anatomias distanciadas do naturalismo, tendendo à geometrização. Trabalhou
preferentemente com a madeira e com o gesso, que ocasionalmente passava
posteriormente para o bronze. Entre as suas obras destacam-se:
"O fugitivo" (1920-1925), "O vingador"
(1922), "A morte na vida" (1926), "O flautista" (1928),
"O bebedor" (1933) e "Velha friorenta" (1939).[30]
Wilhelm Lehmbruck: educado em Paris, a sua obra tem um
marcado caráter classicista, se bem que deformado e estilizado, e com uma forte
carga introspetiva e emocional. Durante a sua formação em Düsseldorf evoluiu
dum naturalismo de corte sentimental, passando por um dramatismo barroco com
influência de Rodin, até um realismo influenciado por Meunier. Em 1910
instalou-se em Paris, onde acusou a influência de Maillol. Finalmente, após uma
viagem à Itália em 1912 começou uma maior geometrização e estilização da
anatomia, com certa influência medieval no alargamento das suas figuras (Mulher
ajoelhada, 1911; Jovem de pé, 1913).
Käthe Kollwitz: esposa de um médico de um bairro pobre de
Berlim, conheceu de perto a miséria humana, fato que a marcou profundamente.
Socialista e feminista, a sua obra tem um marcado componente de reivindicação
social, com esculturas, litografias e aquafortes que se destacam pela sua
crueza: A revolta dos tecedores (1907-1908), A guerra dos camponeses
(1902-1908), Homenagem a Karl Liebknecht (1919-1920).
Madre com gêmeos (1927), de Käthe Kollwitz,
Käthe-Kollwitz-Museum, Berlim.
Os membros de Die Brücke (Kirchner, Heckel, Schmidt-Rottluff)
também praticaram a escultura, a partir da sua experimentação com a xilografia,
que levou à talha da madeira, material que resultava muito conveniente para a
sua expressão intimista da realidade, pois a grosseria e o aspecto irregular
desse material, o seu aspecto bruto e inacabado, até mesmo primitivo, traziam a
perfeita expressão do seu conceito do ser humano e da natureza. Percebe-se
nestas obras a influência da arte africana e oceânica, da qual gabavam a sua
simplicidade e o seu aspecto totêmico, que transcende a arte para ser objeto de
comunicação transcendental.
Na década de 1920, a escultura derivou para a abstração,
seguindo o rumo das últimas obras de Lehmbruck, de marcada estilização
geométrica tendente à abstração. Assim, a obra de escultores como Rudolf
Belling, Oskar Schlemmer e Otto Freundlich caracterizou-se pelo abandono da
figuração para uma libertação formal e temática da escultura. Contudo, perdurou
um certo classicismo, influenciado por Maillol, na obra de Georg Kolbe,
dedicado especialmente ao despido, com figuras dinâmicas, em movimentos
rítmicos próximos do balé, com uma atitude vitalista, alegre e saudável que foi
bem recebida pelos nazis. A sua obra mais famosa foi A Manhã, exposta no
Pavilhão da Alemanha construído por Ludwig Mies van der Rohe para a Exposição
Internacional de Barcelona de 1929. Gerhard Marcks realizou uma obra igualmente
figurativa, mas mais estática e de temática mais expressiva e complexa, com
figuras de aspecto arcaico, inspiradas nas talhas medievais. Ewald Mataré
dedicou-se nomeadamente aos animais, de formas quase abstratas, seguindo o
caminho iniciado por Marc em Der Blaue Reiter. Outros escultores
expressionistas foram Bernhard Hoetger, Ernst Oldenburg e Renée Sintenis,
enquanto fora da Alemanha caberia citar o francês Antoine Bourdelle, o
britânico Jacob Epstein, o croata Ivan Meštrović, o espanhol Victorio Macho, o
holandês Lambertus Zijl, o polaco August Zamoyski e o finlandês Wäinö Aaltonen.
Pintura
Caliban, personagem de "A Tempestade" de
Shakespeare (1914), de Franz Marc, Kunstmuseum, Basileia.
A pintura desenvolveu-se nomeadamente em torno de dois grupos
artísticos: Die Brücke, fundado em Dresden em 1905, e Der Blaue Reiter, fundado
em Munique em 1911. No pós-guerra, o movimento Nova Objetividade surgiu como
contrapeso ao individualismo expressionista defendendo uma atitude mais
comprometida socialmente, embora técnica e formalmente fosse um movimento
herdeiro do expressionismo. Os elementos mais característicos das obras de arte
expressionistas são a cor, o dinamismo e o sentimento. O fundamental para os
pintores de princípios de século não era refletir o mundo de maneira realista e
fiel –justo ao contrário dos impressionistas– mas, sobretudo, expressar o seu
mundo interior. O objetivo primordial dos expressionistas era transmitir as
suas emoções e sentimentos mais profundos.
Na Alemanha, o primeiro expressionismo foi herdeiro do
idealismo pós-romântico de Arnold Böcklin e Hans von Marées, incidindo
nomeadamente no significado da obra, e dando maior relevância o desenha frente
à pincelada, bem como à composição e à estrutura do quadro. Assim mesmo, foi
primordial a influência de artistas estrangeiros como Munch, Gauguin, Cézanne e
Van Gogh, plasmada em diversas exposições organizadas em Berlim (1903), Munique
(1904) e Dresde (1905).
O expressionismo destacou-se pela grande quantidade de
agrupamentos artísticos que surgiram no seu seio, bem como pelas múltiplas
exposições celebradas em todo o território alemão entre 1910 e 1920: em 1911 a
"Nova Secessão" foi fundada em Berlim, cisão da "Secessão
berlinesa" fundada em 1898 e que presidia Max Liebermann. O seu primeiro
presidente foi Max Pechstein, e incluía a Emil Nolde e Christian Rohlfs. Mais
tarde, em 1913, surgiu a "Livre Secessão", movimento efêmero que
ficou eclipsado pelo Herbstsalon (salão de Outono) de 1913, promovido por
Herwarth Walden, onde junto aos principais expressionistas alemães expuseram
diversos artistas cubistas e futuristas, destacando-se Chagall, Léger,
Delaunay, Mondrian, Archipenko, Hans Arp e Max Ernst. Contudo, em que pese à
sua qualidade artística, a exposição foi um insucesso econômico, pelo qual a iniciativa
não foi repetida.
O expressionismo teve uma notável presença, além de em
Berlim, Munique e Dresde, na região da Renânia, donde procediam Macke,
Campendonk e Morgner, bem como outros artistas como Heinrich Nauen, Franz
Henseler e Paul Adolf Seehaus. Em 1902, o filántropo Karl Ernst Osthaus criou o
Folkwang (Sala do povo) de Hagen, com o objetivo de promover a arte moderna,
adquirindo numerosas obras de artistas expressionistas, assim como de Gauguin,
Van Gogh, Cézanne, Matisse e Munch. Assim mesmo, em Düsseldorf um grupo de
novos artistas fundaram a Sonderbund Westdeutscher Kunstfreunde und Künstler
("Liga especial de amadores da arte e artistas da Alemanha ocidental"),
que celebrou diversas exposições de 1909 a 1911, mudando-se em 1912 para
Colônia, onde, a pesar do sucesso desta última exposição, a liga foi
dissolvida.
No pós-guerra surgiu o Novembergruppe ("Grupo de
Novembro", pela revolta alemã de novembro de 1918), fundado em Berlim a 3
de dezembro de 1918 por Max Pechstein e César Klein, visando reorganizar a arte
alemã após a guerra. Entre os seus membros figuraram pintores e escultores como
Wassily Kandinsky, Paul Klee, Lyonel Feininger, Heinrich Campendonk, Otto
Freundlich e Käthe Kollwitz; arquitetos como Walter Gropius, Erich Mendelsohn e
Ludwig Mies van der Rohe; compositores como Alban Berg e Kurt Weill; e o
dramaturgo Bertolt Brecht. Mais que um grupo com um selo estilístico comum, foi
uma associação de artistas com o objetivo de expor conjuntamente, coisa que
fizeram até a sua dissolução com a chegada do nazismo.
Die Brücke
Cartaz de apresentação para uma exposição de Die Brücke na
Galeria Arnold de Dresde (1910), de Ernst Ludwig Kirchner.
Die Brücke ("A ponte") foi fundada a 7 de junho de
1905 em Dresde, formado por quatro estudantes de arquitetura da Escola Técnica
Superior de Dresde: Ernst Ludwig Kirchner, Fritz Bleyl, Erich Heckel e Karl
Schmidt-Rottluff. O nome foi ideado por Schmidt-Rottluff, simbolizando através
de uma ponte a sua pretensão de estabelecer as bases de uma arte de futuro.
Possivelmente a inspiração veio de uma frase de Assim falou Zaratustra de
Nietzsche: "A grandeza do homem é que é uma ponte e não um fim". Em
1906 uniram-se ao grupo Emil Nolde e Max Pechstein, bem como o suíço Cuno Amiet
e o holandês Lambertus Zijl; em 1907, o finlandês Akseli Gallen-Kallela; em
1908, Franz Nölken e o holandês Kees Van Dongen; e, em 1910, Otto Mueller e o
tcheco Bohumil Kubišta. Bleyl separou-se do grupo em 1907, mudando-se para a
Silésia, onde foi professor na Escola de Engenharia Civil, abandonando a
pintura. Nos seus começos, os membros de Die Brücke trabalharam numa pequena
oficina situada na Berliner Straße nº 65 de Dresde, adquirido por Heckel em
1906, que eles mesmos decoraram e mobiliaram seguindo as diretrizes do grupo.
O grupo Die Brücke buscou ligar com o público em geral,
tornando-o partícipe das atividades do grupo. Concebiram a figura do
"membro passivo" que, mediante uma assinatura anual de doze marcos,
recebiam periodicamente um boletim com as atividades do grupo, bem como
diversas gravuras (as "Brücke-Mappen"). Com o tempo, o número de
membros passivos ascendeu a sessenta e oito. Em 1906 publicaram um manifesto,
Programm, no que Kirchner expressou a sua vontade de convocar a juventude para
um projeto de arte social que transformasse o futuro. Visavam influir na
sociedade através da arte, considerando-se profetas revolucionários que
conseguiriam mudar a sociedade do seu tempo. A intenção do grupo era atrair
qualquer elemento revolucionário que quisesse unir-se; assim o expressaram numa
carta dirigida a Nolde. O seu maior interesse era destruir as velhas
convenções, assim como se estava fazendo na França. Segundo Kirchner, não
podiam pôr-se regras e a inspiração devia fluir livre e dar expressão imediata
às pressões emocionais do artista. A carga de crítica social que imprimiram à
sua obra valiou os ataques da crítica conservadora que os tachou de serem um perigo
para a juventude alemã.
Os artistas de Die Brücke eram influenciados pelo movimento
Arts & Crafts, bem como pelo Jugendstil e os Nabis, e artistas como Van
Gogh, Gauguin e Munch. Também se inspiraram no gótico alemão e na arte
africana, sobretudo após os estudos realizados por Kirchner das xilografias de
Dürer e da arte africana do Museu Etnológico de Dresde. Também estavam
interessados pela literatura russa, especialmente Dostoievski. Em 1908, após
uma exposição de Matisse em Berlim, expressaram igualmente a sua admiração
pelos fauvistas, com os que compartilhavam a simplicidade da composição, o
maneirismo das formas e o intenso contraste de cores. Ambos partiam do
pós-impressionismo, recusando a imitação e destacando-se a autonomia da cor.
Contudo, variam os temas: os expressionistas eram mais angustiosos, marginais,
desagradáveis, e destacavam mais o sexo do que os fauvistas. Rejeitavam o
academicismo e aludiam à "liberdade máxima de expressão". Mais do que
um programa estilístico próprio, o seu nexo era a recusa do realismo e do
impressionismo, e a sua procura de um projeto artístico que envolvesse a arte
com a vida, para o que experimentaram com diversas técnicas artísticas como o
mural, a xilografia e a ebanesteria, à parte da pintura e da escultura.
Duas garotas na erva (1926), de Otto Mueller, Staatsgalerie
Moderner Kunst, Munique.
Die Brücke outorgou especial importância às obras gráficas: o
seu principal meio de expressão foi a xilografia, técnica que permitia plasmar
a sua concepção da arte diretamente, deixando um aspecto inacabado, bruto,
selvagem, próximo do primitivismo que tanto admiravam. Estes gravados em
madeira apresentam superfícies irregulares, que não dissimulam e aproveitam
expressivamente, aplicando manchas de cor e destacando-se a sinuosidade das
formas. Também utilizaram a litografia, a água-tinta e a aquaforte, que
costumam ser de um reduzido cromatismo e simplificação estilística. Die Brücke
defendia a expressão direta e instintiva do impulso criador do artista, sem
normas nem regras, recusando totalmente qualquer tipo de regulamentação
acadêmica. Como disse Kirchner: "o pintor transforma em obra de arte a concepção
da sua experiência".
Aos membros de Die Brücke interessava-lhes um tipo de
temática centrada na vida e a natureza, refletida de jeito espontânea e
instintiva, pelo qual os seus principais temas são o despido –quer no interior
ou no exterior–, bem como cenas de circo e music hall, onde encontram a máxima
intensidade que podem extrair da vida. Esta temática foi sintetizada em obras
sobre banhistas, que os seus membros realizaram preferentemente entre 1909 e
1911 nas suas estadias nos lagos próximos a Dresde: Alsen, Dangast, Nidden,
Fehmarn, Hiddensee, Moritzburg, etc. São obras nas quais expressam um naturismo
sem rodeios, um sentimento quase panteísta de comunhão com a natureza, al mesmo
tempo que tecnicamente vão depurando a sua paleta, num processo de deformação
subjetiva da forma e da cor, que adquire um significado simbólico.
Em 1911 a maioria de artistas do grupo instalaram-se em
Berlim, iniciando a sua carreira em solitário. Na capital alemã receberam a
influência do cubismo e do futurismo, patente na esquematização das formas e no
uso de tons mais frios a partir de então. A sua paleta tornou-se mais obscura e
a sua temática mais desolada, melancólica, pessimista, perdendo o selo
estilístico comum que tinham em Dresde para percorrer caminhos cada vez mais
divergentes, iniciando cada um o seu. Uma das maiores exposições na que
participaram os membros de Die Brücke foi a Sonderbund de Colônia de 1912, na
que Kirchner e Heckel receberam a encomenda de decorarem uma capela, que teve
um grande sucesso. Ainda assim, em 1913 aconteceu a dissolução formal do grupo,
devido à recusa que provocou nos seus companheiros a publicação da história do
grupo (Crônica da sociedade artística de Die Brücke) por parte de Kirchner, na
qual se outorgava uma especial relevância que não foi admitida pelo restante de
membros.
Os
principais membros do grupo foram:
Três banhistas (1913), de Ernst Ludwig Kirchner, Galeria de
Arte de Nova Gales do Sul.
Ernst
Ludwig Kirchner: grande desenhista –o seu pai era professor de
desenho–, desde a sua visita a uma exposição de xilografia de Dürer em 1898 começou
a fazer gravados em madeira, material no que também realizou talhas de
influência africana, com um acabamento irregular, sem polir, destacando-se os
componentes sexuais. Utilizava cores primárias, como os fauvistas, com certa
influência de Matisse, mas com linhas quebradas, violentas –ao contrário das
arredondadas de Matisse–, em ângulos fechados, agudos. As figuras são
estilizadas, com um alargamento de influência gótica. Desde a sua mudança para
Berlim em 1910 realizou composições mais esquemáticas, com linhas cortantes e
zonas inacabadas, e certa distorção formal. Progressivamente a sua pincelada
tornou-se mais nervosa, agressiva, com linhas superpostas, composição mais
geométrica, com formas angulosas inspiradas na decomposição cubista. Desde 1914
começou a padecer transtornos mentais e, durante a guerra, sofreu uma doença
respiratória, fatores que influíram na sua obra. Em 1937 os seus trabalhos
foram confiscados pelos nazistas, suicidando-se no ano seguinte.
Erich
Heckel: a sua obra nutriu-se da influência direta de Van
Gogh, ao que conheceu em 1905 na Galeria Arnold de Dresde. Entre 1906 e 1907
realizou uma série de quadros de composição vangoghiana, de pinceladas curtas e
cores intensas –predominantemente o amarelo–, com pasta densa. Mais tarde
evoluiu para temáticas mais expressionistas, como o sexo, a solidão e a
incomunicação. Também trabalhou com a madeira, em obras lineais, sem
perspectiva, com influência gótica e cubista. Foi um dos expressionistas mais
ligados à corrente romântica alemã, o que se reflete na sua visão utópica das
classes marginais, pelas quais expressa um sentimento de solidariedade e
reivindicação. Desde 1909 viajou pela Europa, que o pôs em contato tanto com a
arte antiga quanto com as novas vanguardas, especialmente com o fauvismo e com
o cubismo, dos quais adotou a organização espacial e o colorido intenso e
subjetivo. Nas suas obras tende a descuidar o aspecto figurativo e descritivo
das suas composições para ressaltar o conteúdo emotivo e simbólico, com
pinceladas densas que fazem que a cor ocupe todo o espaço, sem outorgar
importância ao desenho ou a composição.
Karl
Schmidt-Rottluff: nos seus começos praticou o
macropontilhismo, para passar a um expressionismo de figuras esquemáticas e
rostos cortantes, de pincelada solta e de cores intensas. Recebeu certa
influência de Picasso na sua etapa azul, bem como de Munch e da arte africana
e, desde 1911, do cubismo, palpável na simplificação das formas que aplicou às
suas obras desde então. Dotado de uma grande mestria para a aquarela, sabia
dosificar bem as cores e distribuir os chiaroscuros, enquanto na pintura
aplicava pinceladas densas e espessas, com claro precedente em Van Gogh. Também
realizou talhas em madeira, às vezes policromada, com influência africana –rostos
alongados, olhos amendoados–.
Emil Nolde:
ligado a Die Brücke durante 1906-1907, trabalhou em solitário, desligado de
tendências –não se considerava um expressionista, mas um "artista
alemão"–. Dedicado em princípio à pintura de paisagens, temas florais e
animais, sentia predileção por Rembrandt e por Goya. Em princípios de século
empregava a técnica divisionista, com empaste muito grosso e pinceladas curtas,
e com forte descarrega cromática, de influência pós-impressionista. Durante a
sua estadia em Die Brücke abandonou o processo de imitação da realidade,
denotando na sua obra uma inquietude interior, uma tensão vital, uma crispação
que se reflete no pulso interno da obra. Começou então os temas religiosos,
centrando-se na Paixão de Jesus Cristo, com influência de Grünewald, Brueghel e
Hieronymus Bosch, com rostos desfigurados, um profundo sentimento de angústia e
uma grande exaltação da cor (A última ceia, 1909; Pentecostes, 1909; Santa
Maria Egipcíaca, 1912).
Otto
Mueller: grande admirador da arte egípcia, realizou obras
sobre paisagens e nus com formas esquemáticas e angulosas, nos quais se percebe
a influência de Cézanne e de Picasso. Os seus nus costumam localizar-se em
paisagens naturais, evidenciando a influência da natureza exótica de Gauguin. O
seu desenho é limpo e fluido, afastado do estilo áspero e gestual dos outros
expressionistas, com uma composição de superfícies planas e suaves linhas
curvas, criando uma atmosfera de fantasia idílica. As suas figuras delgadas e
esbeltas estão inspiradas em Cranach, de cuja Vênus tinha uma reprodução no seu
estudo. São nus de grande simplicidade e naturalidade, sem traços de provocação
ou sensualidade, expressando uma perfeição ideal, a nostálgia de um paraíso
perdido, em que o ser humano vivia em comunhão com a natureza.
Max
Pechstein: de formação acadêmica, estudou Belas Artes em Dresde.
Em uma viagem à Itália em 1907 entusiasmou-se com a arte etrusca e com os
mosaicos de Ravena, enquanto na sua seguinte estadia em Paris entrou em contato
com o fauvismo. Em 1910 foi fundador com Nolde e Georg Tappert da Nova Secessão
berlinesa, da qual foi o seu primeiro presidente. Em 1914 realizou uma viagem
pela Oceania, recebendo como tantos outros artistas da época a influência da
arte primitiva e exótico. As suas obras costumam ser paisagens solitárias e
agrestes, geralmente de Nidden, uma população da costa báltica que era o seu
lugar de veraneio.
Der Blaue
Reiter
Os grandes cavalos azuis (1911), de Franz Marc, Walker Art
Center, Minneapolis.
Der Blaue Reiter (O Ginete Azul) surgiu em Munique em 1911,
agrupando Wassily Kandinsky, Franz Marc, August Macke, Paul Klee, Gabriele
Münter, Alfred Kubin, Alexej von Jawlensky, Lyonel Feininger, Heinrich
Campendonk e Marianne von Werefkin. O nome do grupo foi escolhido por Marc e
Kandinsky tomando café num terraço, após uma conversação onde coincidiram no
seu gosto pelos cavalos e pela cor azul, embora seja de sublinhar que Kandinsky
já pintara um quadro com o título O Ginete Azul em 1903 (Coleção E.G. Bührlle,
Zurique). De novo, mais que um selo estilístico comum compartilhavam uma visão
da arte, na que imperava a liberdade criadora do artista e a expressão pessoal
e subjetiva das suas obras. Der Blaue Reiter não foi uma escola nem um
movimento, mas um agrupamento de artistas com inquietudes similares, centrados
num conceito da arte não como imitação, mas como expressão do interior do
artista.
Der Blaue Reiter foi uma cisão do grupo Neue
Künstlervereinigung München ("Nova Asociación de Artistas de
Munique"), fundada em 1909, da qual era presidente Kandinsky, e que
incluía ademais Marc, Jawlensky, Werefkin, Kubin, Klee, Münter, os irmãos David
e Vladimir Burliuk, Alexander Kanoldt, Adolf Erbslöh, Karl Hofer, etc. Contudo,
divergências estéticas originaram o abandono de Kandinsky, Marc, Kubin e Münter,
fundando o novo grupo. Der Blaue Reiter tinha poucos pontos em comum com Die
Brücke, coincidindo basicamente na sua oposição ao impressionismo e ao
positivismo; porém, frente à atitude temperamental de Die Brücke, frente à sua
plasmação quase fisiológica da emotividade, Der Blaue Reiter tinha uma atitude
mais refinada e espiritual, visando a captar a essência da realidade através da
purificação dos instintos. Assim, em vez de utilizar a deformação física, optam
pela sua total depuração, chegando assim à abstração. A sua poética foi
definida como um expressionismo lírico, no qual a evasão não se encaminhava
para o mundo selvagem mas para o espiritual da natureza e do mundo interior.
Os membros do grupo mostraram o seu interesse pelo
misticismo, pelo simbolismo e pelas formas da arte que consideravam mais
genuínas: a primitiva, a popular, a infantil e a de doentes mentais. Der Blaue
Reiter destacou-se pelo uso da aquarela, frente à gravura utilizada
nomeadamente por Die Brücke. Também cabe destacar-se a importância outorgada à
música, que acostuma assimilar-se à cor, o que facilitou a transição de uma
arte figurativa para uma mais abstrata. De igual forma, nos seus ensaios
teóricos mostraram a sua predileção pela forma abstrata, na que viam um grande
conteúdo simbólico e psicológico, teoria que ampliou Kandinsky na sua obra Do
espiritual na arte (1912), na que procura uma síntese entre a inteligência e a
emotividade, defendendo que a arte se comunica com o nosso espírito interior, e
que as obras artísticas podem ser tão expressivas quanto a música. Kandinsky
expressa um conceito místico da arte, com influência da teosofia e da filosofia
oriental: a arte é expressão do espírito, sendo as formas artísticas reflexo
dele. Como no mundo das ideias de Platão, as formas e sons ligam com o mundo
espiritual através da sensibilidade, da percepção. Para Kandinsky, a arte é uma
linguagem universal, acessível a qualquer ser humano. O caminho da pintura
devia ser desde a pesada realidade material até a abstração da visão pura, com
a cor como meio, por isso desenvolveu toda uma complexa teoria da cor: em A
Pintura como arte pura (1913) sustém que a pintura é já um ente separado, um
mundo em si mesmo, uma nova forma do ser, que age sobre o espectador através da
vista e que provoca nele profundas experiências espirituais.
São Jorge (1912), de August Macke, Kolumba Museum, Colônia.
Der Blaue Reiter organizou diversas exposições: a primeira
foi na Galeria Thannhäuser de Munique, inaugurada a 18 de dezembro de 1911 com
o nome I Ausstellung der Redaktion des Blauen Reiter ("I Exposição dos
Diretores do Ginete Azul"). Foi a mais homogênea, pois havia uma clara
influência mútua entre todos os componentes do grupo, dissipada mais adiante
por uma maior individualidade de todos os seus membros. Expuseram obras Macke,
Kandinsky, Marc, Campendonk e Münter e, como convidados, Arnold Schönberg
–compositor mas autor também de obras pictóricas–, Albert Bloch, David e
Vladimir Burliuk, Robert Delaunay e o Aduaneiro Rousseau. A segunda exposição
decorreu na Galeria Hans Goltz em março de 1912, dedicada a aquarelas e obras
gráficas, confrontando o expressionismo alemão com o cubismo francês e o
suprematismo russo. A última grande exposição aconteceu em 1913 na sede de Der
Sturm em Berlim, em paralelo ao primeiro "Salão de Outono" celebrado
na Alemanha.
Um dos maiores quadros do grupo foi a publicação do Almanaque
(maio de 1912), por ocasião da exposição organizada em Colônia pelo Sonderbund.
Foi realizado em colaboração com o galerista Heinrich von Tannhäuser e com Hugo
von Tschudi, diretor dos museus de Baviera. Junto a numerosas ilustrações,
recolhia diversos textos dos membros do grupo, dedicados à arte moderna e com
numerosas referências à arte primitiva e exótica. A teoria pictórica do grupo
era mostrada, centrada na importância da cor e na perda da composição realista
e do caráter imitativo da arte, frente a uma maior liberdade criativa e uma
expressão mais subjetiva da realidade. Falava-se igualmente dos pioneiros do
movimento (Van Gogh, Gauguin, Cézanne, Rousseau), no que se incluía tanto aos
membros de Die Brücke e Der Blaue Reiter como a Matisse, Picasso e Delaunay.
Também se incluiu a música, com referências a Schönberg, Webern e Berg.
Der Blaue Reiter teve o seu final com a Primeira Guerra
Mundial, na que faleceram Marc e Macke, enquanto Kandinsky teve de voltar para
a Rússia. Em 1924 Kandinsky e Klee, junto a Lyonel Feininger e Alexej von
Jawlensky, fundaram Die Blaue Vier" (Os Quatro Azuis") no seio da
Bauhaus, expondo conjuntamente a sua obra por dez anos.
Os
principais representantes de Der Blaue Reiter foram:
O moinho encantado (1913), de Franz Marc, Art Institute of
Chicago, Chicago.
Wassily
Kandinsky: de vocação tardia, estudou direito, economia e
política antes de se passar à pintura, após visitar uma exposição
impressionista em 1895. Estabelecido em Munique, começou no
Jugendstil,conjugando-o com elementos da tradição russa. Em 1901 fundou o grupo
Sociedade Artística Phalanx, e abriu a sua própria escola. Durante 1906—1909
teve um período fauvista, para passar posteriormente ao expressionismo. Desde
1908 a sua obra foi perdendo o aspecto temático e figurativo para ganhar em
expressividade e colorido, iniciando progressivamente o caminho para a
abstração, e desde 1910 criou quadros nos quais a importância da obra residia
na forma e na cor, criando planos pictóricos por confrontação de cores. A sua
abstração era aberta, com um foco no centro, empurrando com uma força
centrífuga, derivando as linhas e manchas para fora, com grande riqueza formal
e cromática. O próprio Kandinsky distinguia a sua obra entre "impressões",
reflexo direto da natureza exterior (que seria a sua obra até 1910);
"improvisações", expressão de signo interno, de caráter espontâneo e
de natureza espiritual (abstração expressionista, 1910-1921); e
"composições", expressão igualmente interna mais elaborada e formada
devagar (abstração construtiva, desde 1921).
Franz Marc:
estudante de teologia, durante uma viagem pela Europa entre 1902 e 1906 decidiu
tornar-se pintor. Imbuído de um grande misticismo, considerava-se um pintor
"expressivo", visando a expressar o seu "eu interior". A
sua obra foi bastante monotemática, dedicando-se aos animais, especialmente os
cavalos. Contudo, os seus tratamentos eram variados, com contrastes muito
violentos de cor, sem perspectiva linear. Recebeu a influência de Degas –que
também fez uma série sobre cavalos–, bem como do orfismo de Delaunay e das
atmosferas boiantes de Chagall. Para Marc, a arte era uma forma de captar a
essência das coisas, o que traduziu numa visão mística e panteísta da natureza,
que plasmou sobretudo nos animais, que para ele tinham um significado
simbólico, representando conceitos como o amor ou a morte. Nas suas
representações de animais a cor era igualmente simbólico, destacando-se o azul,
a cor mais espiritual. As figuras eram simples, esquemáticas, tendendo à
geometrização após o seu contato com o cubismo. Contudo, desenganado também dos
animais, começou como Kandinsky o caminho para a abstração, carreira que
truncada com a sua morte na contenda mundial.
August
Macke: em 1906 visitou Bélgica e Holanda, onde recebeu a
influência de Rembrandt –empaste grosso, contrastes acusados–; em 1907, em
Londres, entusiasmou-se com os pré-rafaelitas; igualmente, em 1908 em Paris
contatou com o fauvismo. Desde então abandonou a tradição e renovou temáticas e
coloridos, trabalhando com cores claras e cálidas. Depois receberia a
influência do cubismo: restrição cromática, linhas geométricas, figuras
esquematizadas, contrastes sombra-luz. Por último chegou à arte abstrata,
influenciado por Kandinsky e Delaunay: fazia uma abstração racional,
geométrica, com manchas lineais de cor e composições baseadas em planos
geométricos coloreados. Nas suas últimas obras –após uma viagem pelo norte da
África– voltou ao colorido forte e os contrastes exagerados, com um certo ar
surrealista. Inspirava-se em temas cotidianos, em ambientes geralmente urbanos,
com um ar lírico, alegre, sereno, com cores de expressão simbólica como em
Marc.
Paul Klee: de
formação musical, em 1898 passou à pintura, denotando como Kandinsky um senso
pictórico de evanescência musical, tendente à abstração, e com um ar onírico
que o levaria para o surrealismo. Iniciado no Jugendstil, e com influência de
Böcklin, Redon, Van Gogh, Ensor e Kubin, visava como este último atingir um
estado intermédio entre a realidade e a fantasia ideal. Mais tarde, após uma
viagem para Paris em 1912 onde conheceu a Picasso e Delaunay, interessou-se
mais pela cor e as suas possibilidades compositivas. Em uma viagem para África
em 1914 com Macke reafirmou a sua visão da cor como elemento dinamizador do
quadro, que seria a base das suas composições, onde perdura a forma figurativa
combinada com uma certa atmosfera abstrata, em curiosas combinações que seriam
um dos seus selos estilísticos mais reconhecíveis. Klee recriou na sua obra um
mundo fantástico e irônico, próximo do das crianças ou os loucos, que acercará
o universo dos surrealistas –com numerosos pontos de contato entre a sua obra e
a de Joan Miró–.
Alexej von
Jawlensky: militar russo, abandonou a sua carreira para se
dedicar à arte, instalando-se em Munique em 1896 com Marianne von Werefkin. Em
1902 viajou para Paris, travando amizade com Matisse, com quem trabalhou um
tempo e com quem se iniciou no colorido fauve. Dedicou-se nomeadamente ao retrato,
inspirado nos ícones da arte tradicional russa, com figuras em atitude
hierática, de grande tamanho e esquematismo compositivo. Trabalhava com grandes
superfícies de cor, com um colorido violento, delimitado por fortes traços
pretos. Durante a guerra refugiou-se na Suíça, onde realizou retratos próximos
do cubismo, com rostos ovais, de nariz alongado e olhos assimétricos. Mais
tarde, por influência de Kandinsky, aproximou-se à abstração, com retratos
reduzidos a formas geométricas, de cores intensas e cálidas.
Autorretrato (1910), de Marianne von Werefkin, Städtische
Galerie im Lenbachhaus, Munique.
Lyonel
Feininger: norte-americano de origem alemão, em 1888 viajou para
Alemanha para estudar música, passando posteriormente à pintura. Nos seus começos
trabalhou como caricaturista para vários jornais. Recebeu a influência do
cubismo órfico de Delaunay, patente no geometrismo das suas paisagens urbanas,
de formas angulosas e inquietantes, parecidas às de O gabinete do doutor
Caligari –em cujos decoradores provavelmente influiu–. As suas personagens são
caricaturescas, de grande tamanho –às vezes chegando à mesma altura dos
edifícios–, construídas por superposição de planos de cor. Professor da Bauhaus
de 1919 a 1933, em 1938, por causa do nazismo, retornou para o seu Nova York
natal.
Gabriele
Münter: estudou em Düsseldorf e Munique, ingressando na
Sociedade Artística Phalanx, no que conheceu a Kandinsky, com o que iniciou uma
relação e passou longas temporadas na localidade de Murnau. Ali pintou numerosas
paisagens nas quais desvelava uma grande emotividade e um grande domínio da
cor, com influência da arte popular bávara, o que se denota nas linhas simples,
cores claras e luminosas e uma cuidada distribuição das massas. Recebeu de
Jawlensky a justaposição de manchas brilhantes de cor com nítidos contornos,
que se tornariam no seu principal selo artístico. Entre 1915 e 1927 deixou de
pintar, após a sua ruptura com Kandinsky.
Heinrich
Campendonk: influenciado pelo cubismo órfico e a arte popular e
primitiva, criou um tipo de obras de signo primitivista, com desenho de grande
rigidez, figuras hieráticas e composições deshierarquizadas. Nas suas obras tem
um papel determinante o contraste de cores, com uma pincelada herdeira do
impressionismo. Mais tarde, por influência de Marc, a cor ganhou independência
a respeito do objeto, adquirindo um maior valor expressivo, e decompondo o
espaço à maneira cubista. Superpunha as cores em camadas transparentes,
realizando composições livres nas quais os objetos parecem boiar sobre a
superfície do quadro. Assim como em Marc, a sua temática focou-se num conceito
idealizado da comunhão entre o homem e a natureza.
Alfred
Kubin: escritor, desenhista e ilustrador, a sua obra
baseou-se num mundo fantasmagórico de monstros, de aspecto excitante e
alucinante, refletindo a sua obsessão pela morte. Influenciado por Max Klinger,
trabalhou nomeadamente como ilustrador, em desenhos em branco e preto de ar
decadentista com reminiscências de Goya, Blake e Félicien Rops. As suas cenas
enquadravam-se em ambientes crepusculares, fantasmagóricos, que recordam
igualmente a Odilon Redon, com um estilo caligráfico, às vezes roçando a
abstração. Os seus imagens fantásticas, mórbidas, com referências ao sexo e a
morte, foram precursoras do surrealismo. Também foi escritor, cuja principal
obra, O outro lado (1909), pôde ter influenciado sobre Kafka.
Marianne
von Werefkin: pertencente a uma família aristocrata russa, recebeu
classes de Ilya Repin em São Petersburgo. Em 1896 mudou-se para Munique com
Jawlensky, com o que iniciara uma relação, dedicando-se mais à difusão da obra
deste que à sua própria. Nesta cidade criou um salão de notável fama como
tertúlia artística, chegando a influir em Franz Marc a nível teórico. Em 1905,
após algumas divergências com Jawlensky, voltou a pintar. Esse ano viajou para
França, recebendo a influência dos nabis e os futuristas. As suas obras são de
um colorido brilhante, cheio de contrastes, com preponderância da linha na
composição, à qual a cor fica subordinada. A temática é fortemente simbólica,
destacando-se as suas enigmáticas paisagens com procissões de mortos.
Neue
Sachlichkeit
Martha (1925), de Georg Schrimpf, Pinakothek der Moderne,
Munique.
O grupo Neue Sachlichkeit (Nova Objetividade) surgiu após a
Primeira Guerra Mundial como um movimento de reação frente ao expressionismo,
retornando à figuração realista e à plasmação objetiva da realidade
circundante, com uma marcada componente social e reivindicativa. Desenvolvido
entre 1918 e 1933, desapareceu com o advento do nazismo. O ambiente de
pessimismo que trouxe o pós-guerra propiciou o abandono por parte de alguns
artistas do expressionismo mais espiritual e subjetivo, de procura de novas
linguagens artísticas, por uma arte mais comprometida, mais realista e
objetiva, dura, direta, útil para o desenvolvimento da sociedade, uma arte
revolucionária na sua temática, se bem que não na forma. Os artistas
separaram-se da abstração, refletindo sobre a arte figurativa e recusando toda
atividade que não atendesse os problemas da diligente realidade do pós-guerra.
Encarnaram este grupo Otto Dix, George Grosz, Max Beckmann, Conrad Felixmüller,
Christian Schad, Rudolf Schlichter, Ludwig Meidner, Karl Hofer e John
Heartfield.
Frente à introspeção psicológica do expressionismo, o
individualismo de Die Brücke ou o espiritualismo de Der Blaue Reiter, a Nova
Objetividade propôs o retorno ao realismo e à plasmação objetiva do mundo circundante,
com uma temática mais social e comprometida politicamente. Contudo, não
renunciaram aos sucessos técnicos e estéticos da arte de vanguarda, como o
colorido fauvista e expressionista, a "visão simultânea" futurista ou
a aplicação da fotomontagem à pintura e à gravura do verismo. A recuperação da
figuração foi uma consequência comum no espaço no final da guerra: para além da
Nova Objetividade, surgiu na França o purismo e na Itália a pintura metafísica,
precursora do surrealismo. Mas, na Nova Objetividade, este realismo é mais
comprometido que em outros países, com obras de denúncia social que visam
desmascarar a sociedade burguesa do seu tempo, denunciar o estamento político e
militar que os levou ao desastre da guerra. Se bem que a Nova Objetividade
opôs-se ao expressionismo por ser um estilo espiritual e individualista,
manteve por outro lado a sua essência formal, pois o seu caráter grotesco, de
deformação da realidade, de caricaturamento da vida, transladou-se à temática
social abordada pelos novos artistas do pós-guerra.
A "Nova Objetividade" surgiu como recusa do
Novembergruppe, cuja falta de compromisso social rejeitavam. Assim, em 1921, um
grupo de artistas dadaístas –entre os quais se encontravam George Grosz, Otto
Dix, Rudolf Schlichter e Hanna Höch.– apresentaram-se como "Oposição ao
Grupo de Novembro", redigindo uma Carta aberta a este. O termo "Nova
Objetividade" foi concebido pelo crítico Gustav Friedrich Hartlaub para a
exposição Nova Objetividade. Pintura alemã desde o expressionismo, celebrada em
1925 na Kunsthalle de Mannheim. Segundo palavras de Hartlaub: "o objetivo
é superar as mesquindades estéticas da forma através de uma nova objetividade
nascida do desgosto para a sociedade burguesa da exploração".
Em paralelo à Nova Objetividade surgiu o denominado
"realismo mágico", nome proposto igualmente por Hartlaub em 1922 mais
difundido sobretudo por Franz Roh no seu livro Pós-expressionismo. Realismo
mágico (1925). O realismo mágico situou-se mais à direita da Nova Objetividade –embora
fosse igualmente eliminado pelos nazis–, e representava uma linha mais pessoal
e subjetiva que o grupo de Grosz e Dix. Frente à violência e dramatismo dos
seus coetâneos objetivos, os realistas mágicos elaboraram uma obra mais
acalmada e intemporal, mais sereia e evocadora, transmissora de uma quietude
que visava a pacificar os ânimos após a guerra. O seu estilo era próximo do da
pintura metafísica italiana, visando a captar a transcendência dos objetos para
além do mundo visível. Entre as suas figuras destacaram-se Georg Schrimpf,
Alexander Kanoldt, Anton Räderscheidt, Carl Grossberg e Georg Scholz.
Os
principais expoentes da Nova Objetividade foram:
George
Grosz: procedente do dadaísmo, interessado pela arte
popular. Mostrou desde novo na sua obra um intenso desgosto pela vida, que se
tornou após a guerra em indignação. Na sua obra analisou fria e metodicamente a
sociedade do seu tempo, desmistificando as classes dirigentes para mostrar o
seu lado mais cruel e despótico. Carregou especialmente contra o exército, a
burguesia e o clero, em séries como O rosto da classe dominante (1921) ou Ecce
Homo (1927), em cenas onde predomina a violência e o sexo. As suas personagens
costumam ser mutilados de guerra, assassinos, suicidas, burgueses ricos e
rechonchudos, prostitutas, vagabundos, em figuras sucintas, silhuetadas em
poucos traços, como bonecos. Tecnicamente, empregou recursos de outros estilos,
como o espaço geometrizante do cubismo ou a captação do movimento do futurismo.
Otto Dix:
iniciado no realismo tradicional, com influência de Hodler, Cranach e Durero,
em Dix a temática social, patética, direta e macabra da Nova Objetividade
ficava enfatizada pela representação realista e minuciosa, quase diáfana, das
suas cenas urbanas, povoadas pelo mesmo tipo de personagens que retratava
Grosz: assassinos, aleijados, prostitutas, burgueses e mendigos. Expôs fria e
metodicamente os horrores da guerra, as carniçarias e matanças que presenciou
como soldado: assim, na série A Guerra (1924), inspirou-se na obra de Goya e de
Callot.
Max
Beckmann: de formação acadêmica e começos próximos do
impressionismo, o horror da guerra levou-o, como aos seus companheiros, a
plasmar cruamente a realidade que o envolvia. Acusou então a influência de
antigos mestres como Grünewald, Brueghel e Hieronymus Bosch, junto a novas
contribuições como o cubismo, do qual tomou o seu conceito de espaço, que se
torna na sua obra em um espaço agoniante, quase claustrofóbico, no qual as
figuras têm um aspecto de solidez escultórica, com contornos muito delimitados.
Na sua série O inferno (1919) fez um retrato dramático do Berlim do pós-guerra,
com cenas de grande violência, com personagens torturados, que berram e se
retorcem de dor.
Conrad
Felixmüller: fervente opositor da guerra, durante a contenda
assumiu a arte como compromisso político. Ligado ao círculo de Pfemfert, editor
da revista Die Aktion, moveu-se no ambiente antimilitarista de Berlim, que
recusava o esteticismo na arte, defendendo uma arte comprometida e de
finalidade social. Influenciado pelo colorido de Die Brücke e pela decomposição
cubista, simplificou o espaço como formas angulares e quadriláteros, que ele
denominava "cubismo sintético". A sua temática focou-se em operários
e nas classes sociais mais desfavorecidas, com um forte componente de denúncia.
Christian
Schad: membro do grupo dadaísta de Zurique (1915-1920), onde
trabalhou com papel fotográfico –as suas "schadografias"–, dedicou-se
posteriormente ao retrato, em retratos frios e desapassionados, estritamente
objetivos, quase desumanizados, estudando com olhada sóbria e científica as
personagens que retrata, reduzidas a simples objetos, sós e isoladas, sem
capacidade de se comunicarem.
Ludwig
Meidner: membro do grupo Die Pathetiker (Os Patéticos) junto a
Jakob Steinhardt e Richard Janthur, o seu principal tema foi a cidade, a
paisagem urbana, que mostrou em cenas abigarradas, sem espaço, com grandes
multidões e edifícios angulosos de precário equilíbrio, num ambiente opressivo,
angustioso. Na sua série Paisagens apocalípticas (1912-1920) retratou cidades
destruídas, que ardem ou estouram, em vistas panorâmicas que mostram mais
friamente o horror da guerra.
Karl Hofer:
iniciado num certo classicismo próximo a Hans von Marées, estudou em Roma e
Paris, onde o surpreendeu a guerra e foi feito prisioneiro durante três anos,
fato que marcou profundamente o desenvolvimento da sua obra, com figuras
atormentadas, de gestos vacilantes, em atitude estática, enquadradas em
desenhos claros, de cores frias e pincelada pulcra e impessoal. As suas figuras
são solitárias, de aspecto pensativo, melancólico, denunciando a hipocrisia e a
loucura da vida moderna (O casal, 1925; Homens com tochas, 1925; O quarto
preto, 1930).
Outros
artistas
Mãe ajoelhada com criança (1907), de Paula Modersohn-Becker,
Alte Nationalgalerie, Staatliche Museem zu Berlin, Berlim.
Alguns artistas não se adscreveram a nenhum grupo,
desenvolvendo de jeito pessoal um expressionismo fortemente intuitivo, de
diversas tendências e estilos:
Paula
Modersohn-Becker: estudou em Bremen e Hamburgo,
instalando-se posteriormente na colônia de artistas de Worpswede (1897),
enquadrada então num paisagismo próximo da Escola de Barbizon. Contudo, o seu
interesse por Rembrandt e pelos pintores alemães medievais levaram para a
procura de uma arte mais expressiva. Influenciada pelo pós-impressionismo, bem
como por Nietzsche e Rilke, começou a empregar nas suas obras cores e formas
aplicados simbolicamente. Numas visitas a Paris entre 1900 e 1906 recebeu a
influência de Cézanne, Gauguin e Maillol, combinando de um modo pessoal as
formas tridimensionais de Cézanne e os desenhos lineais de Gauguin,
nomeadamente em retratos e cenas maternas, bem como nus, evocadores de uma nova
concepção na relação do corpo com a natureza.
Lovis
Corinth: formado no impressionismo –do qual foi uma das
principais figuras na Alemanha, junto a Max Liebermann e Max Slevogt–, derivou
na sua maturação para o expressionismo com uma série de obras de introspeção
psicológica, com uma temática centrada no erótico e macabro. Após um ataque
cerebral que padeceu em 1911 e que paralisou a sua mão direita, aprendeu a
pintar com a esquerda. Se bem que seguiu ancorado na impressão óptica como
método de criação das suas obras, cobrou um crescente protagonismo a
expressividade, culminando em O Cristo vermelho (1922), cena religiosa de
notável angústia próxima às visões de Nolde.
Christian
Rohlfs: de formação acadêmica, dedicou-se nomeadamente à
paisagem em estilo realista, até terminar no expressionismo quase em cinquenta
anos de idade. O fato determinante para a mudança pôde ser a sua contratação em
1901 como professor da escola-museu Folkwang de Hagen, na qual pôde contatar
com as melhores obras da arte moderna internacional. Assim, a partir de 1902
começou a aplicar a cor mais sistematicamente, à maneira pontilhista, com um
colorido luminoso. Recebeu mais tarde a influência de Van Gogh, com paisagens
de pincelada rítmica e pastosa, em faixas onduladas, sem profundeza.
Finalmente, após uma exposição de Die Brücke no Folkwang em 1907, provou novas
técnicas, como a xilografia e o linóleo, com acentuados contornos pretos. A sua
temática era variada, embora focada em temas bíblicos e da mitologia nórdica.
Wilhelm
Morgner: aluno de Georg Tappert, pintor vinculado à colônia de
Worpswede, cujo paisagismo lírico influiu-no em primeiro lugar, evoluiu mais
tarde a um estilo mais pessoal e expressivo, influenciado pelo cubismo órfico,
onde ganham importância as linhas de cor, com pinceladas pontilhistas que se
justapõem formando algo parecido com um tapiz. Ao acentuar a cor e a linha,
abandonou a profundeza, em composições planas nas que os objetos se situam em
paralelo, e as figuras costumam serem representadas de perfil. Desde 1912
ganhou importância na sua obra a temática religiosa, em composições quase
abstratas, com linhas simples traçadas com a cor.
O grupo de
Viena
Casal de mulheres (1915), de Egon Schiele, Magyar
Szépmüvészeti Múzeum, Budapeste.
Em Áustria, os expressionistas receberam a influência do
modernismo alemão (Jugendstil) e austríaco (Sezession), bem como dos
simbolistas Gustav Klimt e Ferdinand Hodler. O expressionismo austríaco
destacou-se pela tensão da composição gráfica, deformando a realidade
subjetivamente, com uma temática nomeadamente erótica –representada por
Schiele– ou psicológica –representada por Kokoschka–. Em contraste com o
impressionismo e a arte acadêmica do século XIX preponderante na Áustria do
novo século, os novos artistas austríacos seguiram a estela de Klimt, à procura
de uma maior expressividade, refletindo nas suas obras uma temática existencial
de grande fundo filosófico e psicológico, focado na vida e a morte, a doença e
o dor, o sexo e o amor.
Os seus principais representantes foram Egon Schiele, Oskar
Kokoschka, Richard Gerstl, Max Oppenheimer, Albert Paris von Gütersloh e
Herbert Boeckl, além de Alfred Kubin, membro de Der Blaue Reiter. Caberia
destacar-se a obra de dois artistas:
Egon
Schiele: discípulo de Klimt, a sua obra girou em uma temática
baseada na sexualidade, a solidão e a incomunicação, com certo ar de
voyeurismo, com obras explícitas pelas quais até mesmo esteve preso, acusado de
pornografia. Dedicado nomeadamente ao desenho, outorgou um papel essencial à
linha, com a que baseou as suas composições, com figuras estilizadas imersas
num espaço opressivo, tenso. Recriou uma tipologia humana reiterativa, com um
cânone alongado, esquemático, afastado do naturalismo, com cores vivas,
exaltadas, destacando-se o caráter linear, o contorno.
Oskar
Kokoschka: recebeu a influência de Van Gogh e do passado
clássico, nomeadamente o barroco (Rembrandt) e a escola veneziana (Tintoretto,
Veronese). Também esteve ligado à figura de Klimt, bem como do arquiteto Adolf
Loos. Contudo, criou o seu próprio estilo pessoal, visionário e atormentado, em
composições nas quais o espaço cobra grande protagonismo, um espaço denso,
sinuoso, no qual se vem submergidas as figuras, que aboiam nele imersas numa
corrente centrífuga que produz um movimento espiral. A sua temática costumava
ser o amor, a sexualidade e a morte, dedicando-se também por vezes ao retrato e
à paisagem. As suas primeiras obras tinham um estilo medieval e simbolista
próximo dos Nabis ou da época azul de Picasso. Desde 1906, em que conheceu a
obra de Van Gogh, começou num tipo de retrato de corte psicológico, que visava
a refletir o desequilíbrio emocional do retratado, com supremacia da linha
sobre a cor. As suas obras mais puramente expressionistas destacam-se pelas
figuras retorcidas, de expressão torturada e apaixonamento romântico, como A
esposa do vento (1914). Desde os anos 1920 dedicou-se mais à paisagem, com um
certo aspecto barroco, de pincelada mais leve e cores mais brilhantes.
Escola de
Paris
Nu deitado (1919), de Amedeo Modigliani, Museum of Modern
Art, Nova York.
Denomina-se Escola de Paris a um grupo heterodoxo de artistas
que trabalharam em Paris no período entre-guerras (1905—1940), ligados a
diversos estilos artísticos como o pós-impressionismo, o expressionismo, o
cubismo e o surrealismo. O termo abrange uma grande variedade de artistas,
tanto franceses quanto estrangeiros que residiam na capital francesa no
intervalo entre as duas guerras mundiais. Naquela época, Paris era um fértil centro
de criação e difusão artística, tanto pelo seu ambiente político, cultural e
econômico, quanto por ser a origem de diversos movimentos da vanguarda, como o
fauvismo e o cubismo, além de ser lugar de residência de grandes mestres como
Picasso, Braque, Matisse e Léger. Também era um remarcável centro de
colecionismo e de galerias de arte. A maioria de artistas residia nos bairros
de Montmartre e Montparnasse, e caracterizava-se pela sua vida mísera e boêmia.
Na Escola de Paris houve uma grande diversidade estilística,
se bem que a maioria estiveram ligados com maior ou menor intensidade ao
expressionismo, embora interpretado de jeito pessoal e heterodoxo: artistas
como Amedeo Modigliani, Chaïm Soutine, Jules Pascin e Maurice Utrillo foram
conhecidos como Les maudits ("Os malditos"), pela sua arte boêmia e
torturada, reflexo de um ambiente notâmbulo, miserável e desesperado. Por outro
lado, Marc Chagall representa um expressionismo mais vitalista, mais dinâmico e
colorista, sintetizando a sua iconografia russa natal com o colorido fauvista e
com o espaço cubista.
Os membros
mais destacados da escola foram:
Amedeo
Modigliani: instalou-se em Montmartre em 1906, onde se reunia em
"O coelho ágil" com Picasso, Max Jacob, Apollinaire, Soutine, etc.
Influenciado pelo simbolismo e pelo maneirismo (Pontormo, Parmigianino),
dedicou-se nomeadamente à paisagem, o retrato e o nu, com figuras alongadas
inspiradas nos mestres italianos do Cinquecento. Hedonista, procurava a
felicidade, o agradável, pelo qual não lhe interessava a corrente destrutiva
nietzscheana do expressionismo alemão. Nas suas obras sublinhava com força o
contorno, de linhas fluidas, herdeiras do arabesco modernista, enquanto o
espaço se formava por justaposição de planos de cor. Os seus retratos eram de
grande introspeção psicológica, ao que contribuía uma certa deformação e a
transmissão desse ar melancólico e desolado próprio da sua visão boêmia e
angustiada da vida. Dedicou-se também à escultura, com influência de Brâncuşi,
bem como maneirista e africana, com obras simétricas, alongadas, frontais,
próximas à escultura arcaica grega.
Marc
Chagall: instalado em Paris em 1909, realizou obras de caráter
onírico, próximas a um certo surrealismo, distorcendo a realidade ao seu
capricho. Empregava uma gama de cor exaltada, principal nexo de união com o
expressionismo alemão –embora ele não se considerasse expressionista–, em temas
populares e religiosos, com desproporção e falta de interesse pela
hierarquização na narração dos fatos. Influenciado pelo fauvismo, o cubismo e o
futurismo, as suas cenas encontram-se num espaço irreal, alheio a regras de
perspectiva ou de escala, num mundo no que evoca as suas lembranças infantis e
os temas populares russos e judeus, misturados com o mundo dos sonhos, com a
música e com a poesia. Tomou de Delaunay a transparência de planos e cores, bem
como a criação de espaço através da cor e da simultaneidade temporária mediante
a justaposição de imagens. Entre 1914 e 1922 voltou para a Rússia, onde foi
comissário cultural na Escola de Belas-Artes de Vitebsk. De volta para Paris, evoluiu
para o surrealismo.
Georges
Rouault: ligado em princípio ao simbolismo –foi discípulo de
Gustave Moreau– e ao fauvismo, a sua temática de índole moral –centrada no
religioso– e o seu colorido obscuro acercaram-no ao expressionismo. As suas
obras mais emblemáticas foram as de nus femininos, com um ar amargo e
desagradável, com figuras lânguidas e esbranquiçadas (Odaliscas, 1907); cenas
circenses, nomeadamente de palhaços, com ar caricaturesco, sublinhando
notavelmente os contornos (Cabeça de um palhaço trágico, 1904); e cenas
religiosas, com desenho mais abstrato e colorido mais intenso (A Paixão, 1943).
A obra de Rouault –especialmente as obras religiosas– tinha uma forte carga de
denúncia social, de increpação para os vícios e defeitos da sociedade burguesa;
até mesmo numa temática como a circense enfatizava o seu lado mais negativo e
deprimente, sem concessões cômicas ou sentimentais, com um aspecto sórdido e
cruel. Sentia predileção pelo guache e pela aquarela, com tons obscuros e
superfícies salpicadas, em camadas superpostas de pigmentos translúcidos, com
um grafismo de linhas quebradas que enfatizava a expressividade da composição.
Cena de café, de Jules Pascin, Museum of Fine Arts, Boston.
Jules
Pascin: de origem búlgara e ascendência judaica, instalou-se
em Paris após breves estadias em Berlim, Viena e Praga; em 1914 transladou-se
aos Estados Unidos, voltando para Paris em 1928 até o seu suicídio dois anos
depois. A sua obra expressava o desarraigo e a alienação do desterrado, bem
como as obsessões sexuais que marcaram desde a sua adolescência. Nos seus
inícios mostrou a influência do fauvismo e do cubismo, bem como de
Toulouse-Lautrec e Degas nos nus. Tinha uma delicada técnica, com uma linha
finamente sugestionada e uma cor de tons iridescentes, mostrando nos seus
despidos um ar lânguido e evanescente.
Chaïm
Soutine: russo de família judaica, instalou-se em Paris em
1911. A sua personalidade violenta e autodestrutiva provocava uma relação
apaixonada com a sua obra, levando-o muitas vezes a romper os seus quadros, e
refletindo-se numa pincelada forte e incontrolada e uma temática angustiosa e
desolada, como no seu Boi aberto de cima a baixo (1925), inspirado no Boi esfolado
de Rembrandt. Pintor impulsivo e espontâneo, tinha uma necessidade irrefreável
de plasmar imediatamente na tela a sua emotividade interior, motivo pelo qual
as suas obras carecem de qualquer preparação prévia. Influenciado por
Rembrandt, El Greco e Tintoretto, o seu colorido é intenso, expressando com a
direção das pinceladas os sentimentos do artista. Assim mesmo, segue o rasto de
Van Gogh na impulsividade do gesto pictórico, sobretudo nas suas paisagens.
Maurice
Utrillo: artista boêmio e torturado, a sua atividade artística
foi paralela à sua adição ao álcool. De obra autodidata e com certo aspecto
naïf, dedicou-se nomeadamente à paisagem urbana, retratando magistralmente o
ambiente popular do bairro de Montmartre, enfatizando o seu aspecto de solidão
e opressão, refletido com uma técnica depurada e linear, de certa herança
impressionista.
Outros artistas que desenvolveram a sua obra no seio da
Escola de Paris foram Lasar Segall, Emmanuel Mané-Katz, Pinchus Krémègne, Moïse
Kisling, Michel Kikoïne e o japonês Tsuguharu Foujita.
Outros
países
Fertilidade, de Frits Van den Berghe, Kunstmuseum aan Zee,
Oostende.
Bélgica:
o expressionismo belga foi herdeiro do simbolismo primitivista, acusando
igualmente uma forte influência do pintor renascentista flamengo Pieter
Brueghel, o Velho, bem como a de James Ensor, mestre dos expressionistas
belgas. O primeiro grupo surgiu em 1914 na colônia de artistas de
Sint-Martens-Latem, integrado por Albert Servaes, Gustave Van de Woestijne,
Gustave De Smet, Frits Van den Berghe e Constant Permeke. Contudo, a guerra
dispersou o grupo: Permeke refugiou-se na Grã-Bretanha, e De Smet e Van den
Berghe em Holanda. Fora do seu ambiente receberam numerosas influências,
nomeadamente do cubismo e da arte africana. Passada a guerra, o expressionismo
belga reviveu com notável força, sobretudo em torno à revista Selection e à
galeria do mesmo nome, em Bruxelas. As influências do momento foram a do
cubismo e da Escola de Paris, plasmadas num certo ar monumental e um enfoque
social tendente ao ruralismo, com cenas costumbristas inspiradas nos clássicos
flamengos. O movimento perdurou praticamente até o começo da Segunda Guerra
Mundial, se bem que com um contínuo declínio desde 1930.
Brasil:
neste país temos a presença de Cândido Portinari, pintor de renome universal.
De família pobre, estudou na Escola Nacional de Belas Artes de Rio de Janeiro.
Em 1929 viajou para Europa, estabelecendo-se em Paris após percorrer Espanha, a
Itália e Inglaterra, para voltar em 1931. Com influência de Picasso, na sua
obra expressou o mundo dos pobres e desfavorecidos, dos operários e os
agricultores. Outro nome a destacar-se seria o de Anita Malfatti, considerada a
introdutora das vanguardas europeias e norte-americanas no Brasil. Em 1910
viajou para Berlim, onde estudou com Lovis Corinth. A sua obra caracterizou-se
pelas cores violentas, em retratos, nus, paisagens e cenas populares. Desde
1925 abandonou o expressionismo e começou uma carreira mais convencional. O
xilógrafo carioca Oswaldo Goeldi, também é um representante do Expressionismo
no Brasil juntamente com Lívio Abramo e Lasar Segall. Na Europa frequentou
diversos ateliês onde aprimorou suas habilidades, aproximando-se da
xilogravura, técnica muito difundida pelos Expressionistas Alemães da Die
Brücke. Na década de 30 lançou o Álbum 10 Gravuras em Madeira de Oswaldo Goeldi
e foi prolífico gravador, tendo trabalho quase exclusivamente com a Xilogravura
até sua morte em 1961.
Hipnotizador (1912), de Bohumil Kubišta, Galerie výtvarných
uměni, Ostrava.
Checoslováquia:
país surgido após a Primeira Guerra Mundial com a desmembração do Império
Austro-Húngaro, as vanguardas chegaram com atraso, o que se traduziu numa certa
mistura de estilos, decorrendo um expressionismo fortemente misturado com o
cubismo. Os seus principais representantes foram Bohumil Kubišta, Emil Filla e
Antonín Procházka. A obra de Filla é uma profunda reflexão sobre a guerra
–ficou fortemente pontuado pela sua experiência no campo de concentração de
Buchenwald–, com uma grande influência da pintura holandesa do século XVII.
Procházka expressou a beleza e a poesia dos objetos mundanos, que visava
transcender extraindo de eles uma visão idealizada mas muito descritiva,
empregando com frequência a técnica da encáustica. Kubišta, influenciado por
Van Gogh e Cézanne, foi membro temporariamente de Die Brücke. De formação
autodidata e interessado pela filosofia e a óptica, estudou as cores e a
construção geométrica da pintura. A sua obra evoluiu desde 1911 a um estilo
mais influenciado pelo cubismo.
Equador:
cabe sublinhar a obra de Oswaldo Guayasamín. Estudou na Escola de Belas Artes
de Quito. Entre 1942 e 1943 viajou pelos Estados Unidos e México, onde foi
ajudante de Orozco. Um ano depois viajou por diversos países da América Latina,
entre eles Peru, Brasil, Chile, Argentina e Uruguai, encontrando em todos eles
uma sociedade indígena oprimida, temática que, desde então, apareceu sempre nas
suas obras. Nas suas pinturas posteriores figurativas tratou temas sociais,
simplificando as formas. A sua obra refletiu o dor e a miséria que suporta a
maior parte da humanidade, denunciando a violência que lhe tocou viver ao ser
humano no século XX, pontuado pelas guerras mundiais, os genocídios, os campos
de concentração, as ditaduras e as torturas. Tem murais em Quito, Madrid
(Aeroporto de Barajas), Paris (Sede da UNESCO), etc.
Espanha:
neste país, como na maioria de países mediterrâneos, o expressionismo teve
relativo sucesso. Contudo, foi praticado por diversos artistas isolados,
destacando-se a figura de José Gutiérrez Solana: a sua pintura refletiu uma
visão subjetiva, pessimista e degradada da Espanha, similar à da Geração de 98.
À parte da influência que em ele exerceram os pintores do tenebrismo barroco,
em especial Juan de Valdés Leal, tanto pela sua temática lúgubre e desenganada
quanto pelas composições de acusado claro-obscuro é patente a influência das
"Pinturas negras" de Francisco de Goya ou do romântico Eugenio Lucas.
Na sua pintura destacou a miséria de uma Espanha sórdida e grotesca, mediante o
uso de uma pincelada densa e de traço grosso na formação das suas figuras.
Outros artistas enquadrados com certa intensidade no expressionismo foram
Ignacio Zuloaga, Rafael Zabaleta, Eugenio Hermoso, Benjamín Palencia e José
María López Mezquita, bem como a obra tardia do pintor modernista catalão
Isidre Nonell. Alguns expertos também observam certo expressionismo no Guernica
de Picasso.
Estados
Unidos: destacou-se Edward Hopper, membro da Escola Ashcan,
caracterizada pelas suas representações de temática social nas grandes cidades,
especialmente Nova Iorque. A sua pintura caracterizou-se por um peculiar e
rebuscado jogo entre luzes e sombras, pela descrição dos interiores e pela
representação da solidão, que implica um aspecto de incomunicação. Outro nome a
sublinhar seria o de Max Weber, pintor de origem russa, que estudou no Pratt
Institute de Brooklyn e em Paris (1905-1908), onde recebeu a influência de
Cézanne. As suas primeiras obras foram de signo cubista e expressionista
(Restaurante chinês, 1915, Museu Whitney de Arte Americana, Nova Iorque),
evoluindo desde 1917 para a abstração, destacando-se pelo colorido brilhante,
as distorções violentas e um forte tom emocional. Além disso, os Estados Unidos
acolheram numerosos artistas expressionistas que emigraram por causa do
nazismo, pelo qual este movimento cobrou aí um grande auge, exercendo uma
poderosa influência entre os novos artistas, o qual se viu refletido no
surgimento do expressionismo abstrato norte-americano.
Finlândia:
destaca-se a obra de Akseli Gallen-Kallela, pintor adscrito por um tempo ao
grupo Die Brücke. As suas primeiras pinturas estiveram impregnadas de
romantismo, mas após a morte da sua filha realizou trabalhos mais agressivos,
tais como a Defesa do Sampo, A vingança de Joujahainen ou A mãe de
Lemminkainen. A sua obra focou-se no folclore finlandês, com um senso
reivindicativo da sua cultura frente à ingerência russa. Outro importante
expoente foi Tyko Sallinen: estudou arte em Helsínquia, residindo em Paris
entre 1909 e 1914, onde recebeu a influência do fauvismo. A sua temática
focou-se na paisagem carélia e na vida rural, com cores brilhantes de traço
forte. Foi membro do Novembergruppe.
França:
posteriormente à Escola de Paris, desenvolveu-se na França entre 1920 e 1930 um
"expressionismo francês" focado na obra de três artistas: Marcel
Gromaire, Édouard Goerg e Amédée de La Patellière. Este grupo viu-se
influenciado pelo cubismo, desenvolvendo um estilo mais sóbrio e conteúdo que o
expressionismo alemão, com múltiplos pontos de contato com a escola flamenga.
Também cabe salientar a figura individual de Gene Paul, pintor autodidata
influenciado por Van Gogh e Cézanne, bem como por Velázquez, Goya e El Greco.
As suas obras caracterizaram-se pelas pinceladas gestuais, composições
atrevidas, perspectivas forçadas, uso de diagonais e zigue-zagues, e áreas
planas de cor. Ao contrário de outros expressionistas da época, como Soutine e
Rouault, as suas obras estão cheias de optimismo, impulsionado pela sua paixão
pela vida e pelo desejo de superar a sua deficiência –foi ferido durante a
guerra–. Pelo dinamismo e pelo movimento inerente nas suas pinturas, alguns
críticos consideram Gene Paul um precursor do expressionismo abstrato.
Cedro solitário (1907), de Tivadar Kosztka Csontváry,
Csontváry Museum, Pécs.
Hungria:
destaca-se a figura de Tivadar Kosztka Csontváry. Farmacêutico de profissão,
aos vinte e sete anos começou na pintura após uma visão mística que lhe revelou
que seria um grande pintor. Desde 1890 realizou uma longa viagem pelo
Mediterrâneo (Dalmácia, Itália e Grécia), pelo norte da África e pelo Oriente
Médio (Líbano, Palestina, Egito e Síria). Embora a sua arte começasse a ser
reconhecida, o seu caráter solitário, a sua progressiva esquizofrenia e os seus
delírios religiosos levaram-no a afastar-se da sociedade. Pintou mais de um
centenar de imagens, destacando-se o seu emblemático Cedro solitário (1907). A
sua arte ligou com o pós-impressionismo e o expressionismo, embora fosse um autodidata
e o seu estilo seja dificilmente classificável. Passou à História como um dos
mais importantes pintores húngaros.
Itália:
o expressionismo não teve grande implantação, apenas na obra de determinados
artistas individuais, geralmente influenciado pelo futurismo, estilo
predominante na Itália de princípios de século. Lorenzo Viani, de filiação
anarquista, retratou na sua obra a vida das pessoas humildes, os pobres, os
deserdados, com uma linguagem antiacadêmica, tosca, violenta, refletindo um
mundo de rebelião e sofrimento. Ottone Rosai passou por uma etapa futurista
para terminar no expressionismo, refletindo na sua obra motivos populares
florentinos, com personagens tristes, melancólicos, encerrados em si mesmos.
Mario Sironi também evoluiu do futurismo para refletir desde 1920 um
expressionismo focado na paisagem urbana, em cenas de cidades industriais que
absorvem o indivíduo, refletido por figuras solitárias de operários imersos nos
palcos de grandes fábricas e bairros industriais cruzados por trens, camiões e
bondes. Scipione (pseudônimo de Gino Bronchi) criou cenas fantásticas, de corte
romântico, com influência de Van Gogh e El Greco, com uma pincelada nervosa,
fluidos arabescos e perspectivas abruptas.
México:
neste país o expressionismo esteve estreitamente ligado à revolução,
destacando-se o aspecto social da obra, geralmente em formatos de grande
tamanho, como o mural. Assim mesmo, teve grande importância a temática
folclórica e indigenista. O muralismo foi um estilo de vocação sócio-política
que enfatizava o conteúdo reivindicativo da sua temática, centrada nas classes
pobres e desfavorecidas, com formatos monumentais de grande expressividade,
trabalhando sobre uma superfície de concreto ou sobre a fachada de um edifício.
Os seus máximos expoentes foram José Clemente Orozco, Diego Rivera, David
Alfaro Siqueiros e Rufino Tamayo. O expressionismo também influiu na obra
pessoal e inclassificável de Frida Kahlo.
Países
Baixos: neste país a pintura expressionista não se
desenvolveu tanto como a arquitetura, representada pela notável Escola de
Amsterdão, e foi um movimento heterogêneo que acusou diversas influências, se
bem que a principal fosse a de Van Gogh. Em Bergen surgiu uma escola formada
por Jan Sluyters, Leo Gestel e Charley Toorop, que de seguida se orientou para
a Nova Objetividade alemã. Em 1918 o grupo De Ploeg (A Carreta) foi criado em
Groninga, formado por Jan Wiegers e Hendrik Nicolaas Werkman, próximos a Die
Brücke mas com tendência à abstração. Outros artistas a destacar-se foram
Hermam Kruyder, próximo a Der Blaue Reiter e os artistas flamengos, e Hendrik
Chabot, com um estilo similar a Permeke. Cabe destacar-se também a Kees Van
Dongen, membro ocasional de Die Brücke, pintor proveniente do fauvismo
especializado em nus e retratos femininos.
Kiki de Montparnasse (1920), de Gustaw Gwozdecki.
Polônia:
destaca-se a figura de Henryk Gotlib, pintor profundamente influenciado por
Rembrandt. Viveu em Paris de 1923 a 1929, participando nas exposições do salão
de Outono e do salão dos Independentes. Entre 1933 e 1938 realizou estadias na
Itália, Grécia e Espanha, estabelecendo-se definitivamente em Londres no começo
da Segunda Guerra Mundial. Pertenceu ao grupo vanguardista polaco Formiści, que
se opunha à arte acadêmica e naturalista, com um estilo no que destacava a
deformação da natureza, a subordinação das formas, a abolição de um único ponto
de vista e um colorido crudo. Outro membro de Formiści foi Gustaw Gwozdecki,
que também morou em Paris (1903-1916) e Nova Iorque, excelente retratista que
praticou a pintura a óleo, bem como o desenho, o guache e a gravura.
Suécia:
o seu principal representante foi a pintora Sigrid Hjertén. Estudou artesanato
e desenho em Estocolmo, graduando-se como professora de desenho. Passou um tempo
em Paris, recebendo a influência de Matisse e de Cézanne, o que se demonstra na
utilização da cor em contraste com contornos muito simplificados, procurando as
formas e as cores que possam transmitir as suas emoções. Em 1912 realizou a sua
primeira exposição em Estocolmo, participando desde então em numerosas
exposições tanto na Suécia quanto no estrangeiro. Na sua obra descreveu o papel
que desempenhava como artista, mulher e mãe, diferentes identidades em mundos
diferentes. Entre 1920 e 1932 morou em Paris, começando a manifestar-se a sua
dolência esquizofrênica, o que se denotou na sua obra, com cores mais obscuras
e composições retesas, refletindo o seu sentimento de angústia e abandono. De
volta ao seu país, desde 1938 viveu hospitalizada.
Suíça:
neste país o expressionismo acusou a influência de Hodler e de Böcklin, dois
destacados artistas da geração anterior. O expressionismo chegou à Suíça com um
pouco de atraso frente à sua vizinha Alemanha: em 1912 realizou-se uma
exposição em Zurique com obras de Paul Klee, Der Blaue Reiter, de Matisse e do
grupo Der Moderne Bund, fundado em 1910 em Lucerna por Hans Arp, Walter Helbig
e Oskar Lüthy. Durante a Primeira Guerra Mundial muitos artistas
estabeleceram-se na Suíça, contribuindo para a difusão do expressionismo.
Diversos grupos de artistas foram assim criados, como Röt-Blau
("Vermelho-Azul"), fundado em 1925 por Hermann Scherer, Albert
Müller, Paul Camenisch e Werner Neuhaus; Der Schritt Weiter (A passagem falsa),
fundado em Berna em 1931; Gruppe 33, surgido em Basileia em 1933; e Dreigestirn
("Tríade"), formado por Fritz Eduard Pauli, Ignaz Epper e Johann
Robert Schürch.[117] O principal representante do expressionismo suíço foi Paul
Klee, membro destacado de Der Blaue Reiter, junto a Cuno Amiet, que foi membro
de Die Brücke. Amiet provinha do simbolismo –cujo espírito manteve até mesmo
durante a sua etapa expressionista–; na sua obra é palpável um sentimento
vitalista de ar bucólico, com um cromatismo reduzido propenso às vezes à
monocromia.
Literatura
Número de Die Aktion de 1914 com uma ilustração de Egon
Schiele.
A literatura expressionista desenvolveu-se em três fases
principais: de 1910 a 1914, de 1914 a 1918 –coincidindo com a guerra– e de 1918
a 1925. Aparecem como temas destacados –assim como na pintura– a guerra, a
urbe, o medo, a loucura, o amor, o delírio, a natureza e a perda da identidade
individual. Nenhum outro movimento até a data apostara de igual maneira pela
deformidade, a doença e a loucura como o motivo das suas obras. Os escritores
expressionistas criticaram a sociedade burguesa da sua época, o militarismo do
governo do cáiser, a alienação do indivíduo na era industrial e a repressão
familiar, moral e religiosa, pelo qual se sentiam vazios, sós, entediados, numa
profunda crise existencial. O escritor apresenta a realidade do seu ponto de
vista interior, expressando sentimentos e emoções mais do que impressões
sensitivas. Já não se imita a realidade, não se analisam causas nem fatos, mas
o autor busca a essência das coisas, mostrando a sua particular visão. Assim,
deformam a realidade mostrando o seu aspecto mais terrível e descarnado,
adentrando-se em temáticas até então proibidas, como a sexualidade, a doença e
a morte, ou enfatizando aspectos como o sinistro, o macabro, o grotesco.
Formalmente, recorrem a um tom épico, exaltado, patético, renunciando à
gramática e às relações sintáticas lógicas, com uma linguagem precisa, crua,
concentrada. Procuram a significação interna do mundo, abstraindo-o numa espécie
de romantismo trágico que vai do misticismo socializante de Werfel ao absurdo
existencial de Kafka. O mundo visível é uma prisão que impede atingir a
essência das coisas; se tem de superar as barreiras do tempo e do espaço, à
procura da realidade mais "expressiva".
Os principais precursores da literatura expressionista foram
Georg Büchner, Frank Wedekind e o sueco August Strindberg. Büchner foi um dos
principais renovadores do drama moderno, com obras como A morte de Danton
(Dantons Tod, 1835) e Woyzeck (1836), que se destacam pela introspeção
psicológica das personagens, a reivindicação social das classes desfavorecidas
e uma linguagem entre culta e coloquial, misturando aspectos cômicos, trágicos
e satíricos. Wedekind evoluiu do naturalismo para um tipo de obra de tom
expressionista, pela sua crítica à burguesia, a rapidez da ação, os reduzidos
diálogos e os efeitos cênicos, em obras como O despertar da Primavera
(Frühlings Erwachen, 1891), O espírito da terra (Erdgeist, 1895) e A caixa de
Pandora (Die Büchse der Pandora, 1902). Strindberg inaugurou com Camino de
Damasco (Till Damaskus, 1898) a técnica estacional seguida pelo drama
expressionista, consistente em mostrar a ação por estações, períodos que
determinam a vida das personagens, num senso circular, pois as suas personagens
intentam resolver as suas problemas sem o lograr.
O expressionismo foi difundido por revistas como Der Sturm e
Die Aktion, bem como o círculo literário Der Neue Club, fundado em 1909 por
Kurt Hiller e Erwin Loewenson, reunindo-se no Neopathetisches Cabaret de
Berlim, no qual realizavam leituras de poesia e davam conferências. Mais tarde
Hiller, por desavenças com Loewenson, fundou o cabaré literário GNU (1911), que
desempenhou o papel de plataforma para difundir a obra de novos escritores. Der
Sturm apareceu em Berlim em 1910, editada por Herwarth Walden, sendo centro
difusor da arte, da literatura e da música expressionistas, contando também com
uma editorial, uma livraria e uma galeria artística. Die Aktion foi fundada em
1911 em Berlim por Franz Pfemfert, com uma linha mais comprometida
politicamente, sendo um órgão da esquerda alemã. Outras revistas
expressionistas foram Der Brenner (1910-1954), Die weißen Blätter (1913-1920) e
Das junge Deutschland (1918-1920).
A Primeira Guerra Mundial implicou uma forte comoção para a
literatura expressionista: enquanto alguns autores consideraram a guerra como
uma força arrasadora e renovadora que acabaria com a sociedade burguesa, para
outros o conflito cobrou tintes negativos, plasmando na sua obra os horrores da
guerra. No pós-guerra, e em paralelo ao movimento da Nova Objetividade, a
literatura adquiriu maior compromisso social e de denúncia da sociedade
burguesa e militarista que levou a Alemanha ao desastre da guerra. As obras
literárias desta época adquiriram um ar documental, de reportagem social,
perceptível em obras como A montanha mágica (1924) de Thomas Mann e Berlim
Alexanderplatz (1929) de Alfred Döblin.
Narrativa
Franz Kafka.
A narrativa expressionista implicou uma profunda renovação a
respeito da prosa tradicional, tanto temática como estilisticamente, supondo
uma contribuição imprescindível ao desenvolvimento do romance moderna tanto
alemã como europeia. Os autores expressionistas procuravam uma nova forma de
captar a realidade, a evolução social e cultural da era industrial. Portanto,
rejeitaram o encadeamento argumental, a sucessão espaço-tempo e a relação
causa-efeito próprios da literatura realista de raiz positivista. Por outro
lado, introduziram a simultaneidade, quebrando a sucessão cronológica e
rejeitando a lógica discursiva, com um estilo que amostra mas não explica, no
que o próprio autor é apenas um observador da ação, na qual as personagens
evoluem autonomamente. Na prosa expressionista a realidade interior é destacada
sobre a exterior, a visão do protagonista, a sua análise psicológica e
existencial, na qual as personagens expõem a sua situação no mundo, a sua
identidade, com um sentimento de alienação que provoca condutas desordenadas,
psicóticas, violentas, irreflexivas, sem lógica nem coerência. Esta visão
plasmou-se em uma linguagem dinâmica, concisa, elíptica, simultânea,
concentrada, sintaticamente deformada.
Existiram duas correntes fundamentais na prosa
expressionista: uma reflexiva e experimental, abstrata e subjetivizadora,
representada por Carl Einstein, Gottfried Benn e Albert Ehrenstein; e outra
naturalista e objetivadora, desenvolvida por Alfred Döblin, Georg Heym e
Kasimir Edschmid. Figura à parte a obra pessoal e dificilmente classificável de
Franz Kafka, que expressou na sua obra o absurdo da existência, em romances
como A metamorfose (Die Verwandlung, 1915), O processo (Der Prozeß, 1925), O
Castelo (Das Schloß, 1926) e Amerika (Der Verschollene, 1927). Kafka mostrou
mediante parábolas a solidão e alienação do ser humano moderno, a sua
desorientação na sociedade urbana e industrial, a sua insegurança e
desesperação, a sua impotência frente de poderes desconhecidos que regem o seu
destino. O seu estilo é ilógico, descontínuo, labiríntico, com vazios que o
leitor deve completar.
Poesia
Retrato de Rilke (1906), de Paula Modersohn-Becker, Sammlung
Ludwig Roselius, Bremem.
A lírica expressionista desenvolveu-se notavelmente nos anos
anteriores à contenda mundial, com uma temática ampla e variada, centrada,
sobretudo, na realidade urbana, mas renovadora a respeito da poesia
tradicional, assumindo uma estética do feio, o perverso, o deforme, o grotesco,
o apocalíptico, o desolado, como nova forma de expressão da linguagem
expressionista. Os novos temas tratados pelos poetas alemães são a vida na
grande cidade, a solidão e a incomunicação, a loucura, a alienação, a angústia,
o vazio existencial, a doença e a morte, o sexo e a premonição da guerra.
Vários destes autores, conscientes da decadência da sociedade e da sua
necessidade de renovação, utilizaram uma linguagem profética, idealista,
utópica, um certo messianismo que propugnava outorgar um novo senso à vida, uma
regeneração do ser humano, uma maior fraternidade universal.
Estilisticamente, a linguagem expressionista é concisa,
penetrante, despida, com um tom patético e desolado, antepondo a expressividade
à comunicação, sem regras linguísticas nem sintáticas. Buscam o essencial da
linguagem, libertar a palavra, remarcando a força rítmica da linguagem mediante
a deformação linguística, a substantivação de verbos e adjetivos e a introdução
de neologismos. Ainda que muitos expressionistas tenham mantido a métrica e a
rima tradicionais, sendo o soneto um dos seus principais meios de composição,
também recorreram ao ritmo livre e à estrofe polimétrica. Por outro lado,
alguns poetas como August Stramm produziram uma escrita realmente inovadora,
abolindo as regras de sintaxe e a pontuação. Outro efeito da dinâmica linguagem
expressionista foi o simultaneísmo, a percepção do espaço e do tempo como algo
subjetivo, heterogêneo, atomizado, inconexo, uma apresentação simultânea de
imagens e acontecimentos. Entre os principais poetas expressionistas estiveram
Franz Werfel, Georg Trakl, Gottfried Benn, Georg Heym, Johannes R. Beiter, Else
Lasker-Schüler, Ernst Stadler, August Stramm e Jakob van Hoddis. A lírica
expressionista confluiu ou teve influência sobre poetas como Rainer Maria
Rilke.
Teatro
Bertolt Brecht.
O drama expressionista opôs-se à representação fidedigna da
realidade própria do naturalismo, renunciando à imitação do mundo exterior e
visando a refletir a essência das coisas, através de uma visão subjetiva e
idealizada do ser humano. Os dramaturgos expressionistas visavam a fazer do
teatro um mediador entre a filosofia e a vida, transmitirem novos ideais,
renovar a sociedade moral e ideologicamente. Para isso realizaram uma profunda
renovação dos recursos dramáticos e cênicos, seguindo o modelo estacional de
Strindberg e perdendo o conceito de espaço e tempo, enfatizando por outro lado
a evolução psicológica da personagem, que mais que indivíduo é um símbolo, a
encarnação dos ideais de libertação e superação do novo homem que transformará
a sociedade. São personagens tipificados, sem personalidade própria, que
encarnam determinados roles sociais, nomeados pela sua função: pais, mães,
operários, soldados, mendigos, jardineiros, comerciantes. O teatro
expressionista pôs ênfase na liberdade individual, na expressão subjetiva, o
irracionalismo e a temática proibida. A sua posta em cena buscava uma atmosfera
de introspeção, de pesquisa psicológica da realidade. Utilizavam uma linguagem
concisa, sóbria, exaltada, patética, dinâmica, com tendência ao monólogo, forma
idônea de mostrar o interior do personagem. Também ganhou importância a
gesticulação, a mímica, os silêncios, os balbucios, as exclamações, que
cumpriam igualmente uma função simbólica. Igual simbolismo adquiriu a
cenografia, outorgando especial relevância a luz e a cor, e recorrendo à música
e até mesmo a projeções cinematográficas para potenciar a obra.
O teatro foi um meio idôneo para a plasmação emocional do
expressionismo, pois o seu caráter multiartístico, que combinava a palavra com
a imagem e a ação, era ideal para os artistas expressionistas, fosse qual for a
sua especialidade. Assim, além do teatro, naquela época proliferaram os
cabarés, que uniam representação teatral e música, como em Die Fledermaus (O
Morcego), em Viena; Die Brille (Os Óculos), em Berlim; e Die elf Scharfrichter
(Os Onze Verdugos), em Munique. No teatro expressionista predominou a temática
sexual e psicanalítica, talvez por influência de Freud, cuja obra A
interpretação dos sonhos apareceu em 1900. Assim mesmo, os protagonistas
costumavam serem seres angustiados, solitários, torturados, isolados do mundo e
despojados de todo tipo de convencionalismo e aparência social. O sexo
representava violência e frustração, a vida sofrimento e angustia.
Os principais dramaturgos expressionistas foram Georg Kaiser,
Fritz von Unruh, Reinhard Sorge, Ernst Toller, Walter Hasenclever, Carl
Sternheim, Ernst Barlach, Hugo von Hofmannsthal e Ferdinand Bruckner. Cabe
sublinhar também a figura do produtor e diretor teatral Max Reinhardt, diretor
do Deutsches Theater, que se destacou pelas inovações técnicas e estéticas que
aplicou à cenografia expressionista: experimentou com a iluminação, criando
jogos de luzes e sombras, concentrando a iluminação num sítio ou personagem
para captar a atenção do espectador, ou fazendo variar a intensidade das luzes,
que se entrecruzam ou opunham. A sua estética teatral foi adaptada posteriormente
ao cinema, sendo um dos traços distintivos do cinema expressionista alemão.
Finalmente, caberia assinalar que no expressionismo se formaram duas figuras de
grande relevância no teatro moderno internacional: o diretor Erwin Piscator,
criador de uma nova forma de fazer teatro que denominou "teatro
político", experimentando uma forma de espetáculo didático que aplicou
mais tarde Brecht no Berliner Ensemble. Em 1927 criou o seu próprio teatro
(Piscatorbühne), no que aplicou os princípios ideológicos e cênicos do teatro
político. Bertolt Brecht foi o criador do "teatro épico", assim
designado em contraste com o teatro dramático. Quebrou com a tradição do
naturalismo e do neorromantismo, transformando radicalmente tanto o senso do
texto literário quanto a forma de o espetáculo ser apresentado, e tentando que
o público deixasse de ser um simples espectador-receptor para desenvolver um
papel ativo.
Música
O expressionismo outorgou muita importância à música, ligada
estreitamente à arte sobretudo no grupo Der Blaue Reiter: para estes artistas,
a arte é comunicação entre indivíduos, por meio da alma, sem necessidade de um
elemento externo. O artista tem de ser criador de signos, sem a mediação de uma
linguagem. A música expressionista, seguindo o espírito das vanguardas, visava
a desligar a música dos fenômenos objetivos externos, sendo instrumento
unicamente da atividade criadora do compositor e refletindo nomeadamente o seu
estado anímico, fora de toda regra e toda convenção, tendendo à esquematização
e às construções lineais, em paralelo à geometrização das vanguardas pictóricas
do momento.
A música expressionista procurou a criação de uma nova
linguagem musical, libertando a música, sem tonalidade, deixando que as notas
fluíssem livremente, sem intervenção do compositor. Na música clássica, a
harmonia era baseada na cadência tônica-subdominante-dominante-tônica, sem
dentro de uma tonalidade suceder notas estranhas à escala. Contudo, desde
Wagner, a sonoridade adquiriu maior relevância a respeito da harmonia, ganhando
importância as doze notas da escala. Assim, Arnold Schönberg criou o
dodecafonismo, sistema baseado nos doze tons da escala cromática –as sete notas
da escala tradicional mais os cinco semítonos–,utilizados em qualquer ordem,
mas em séries, sem repetir uma nota antes de as outras sonarem. Assim é evitada
a polarização, a atração a centros tonais. A série dodecafônica é uma estrutura
imaginária, sem tema nem ritmo. Cada série tem 48 combinações, por inversão,
retrogradação ou inversão da retrogradação, e começando por cada nota, o que
produz uma série quase infinita de combinações. A destruição da hierarquia na
escala musical é equivalente, na pintura, à eliminação da perspectiva espacial
renascentista efetuada igualmente pelas vanguardas pictóricas. O dodecafonismo
foi seguido pelo ultracromatismo, que ampliou a escala musical a graus
inferiores ao semitono –quartos ou sextos de tom–, como na obra de Alois Hába e
Ferruccio Busoni.
Entre os músicos expressionistas destacaram-se especialmente
Arnold Schönberg, Alban Berg e Anton Webern, trio que formou a chamada Segunda
Escola de Viena:
Arnold Schönberg.
Arnold
Schönberg: formou-se quando em Viena havia um caloroso debate entre
wagnerianos e brahmsianos, inclinando-se depressa por novas formas de expressão
renovadoras da linguagem musical. As suas primeiras obras foram um insucesso de
público, como o poema sinfônico Pelleas und Melisande (1903), sobre o texto de
Maeterlinck, se bem que acrescentaram a sua fama entre os novos músicos, mais
afins à vanguarda. Com a Kammersymphonie (1906) e os Lieder (1909), sobre
textos de Stefan George, começou a acercar-se à que seria a sua linguagem
definitiva, pontuada pela atonalidade, a assimetria rítmica e a dissolução
tímbrea, que terminarão no dodecafonismo. Conseguiu os seus primeiros sucessos
com os Gurrelieder (1911) e Pierrot Lunaire (1912), aos quais seguiu uma pausa
devida à guerra. Mais adiante, a sua obra ressurgiu com uma composição já
totalmente dodecafônica: Quinteto para instrumentos de vento (1924), Terceiro
quarteto para corda (1927), Variações (1926-1928), etc.
Anton
Webern: circunscrito a obras de pequeno calibre, não teve
muito reconhecimento em vida, se bem que a sua obra fosse profundamente
vanguardista e inovadora. Mais místico e decadente que Schönberg, Webern foi um
músico dodecafônico profundo: ao contrário de Schönberg, que não serializava os
ritmos mas apenas a altura dos sons, Webern sim o fazia, destacando-se as áreas
estruturais, com uma música nua, etérea, atemporal; assim como Schönberg tinha
uma estrutura clássica sob o sistema dodecafônico, Webern criou uma música
totalmente nova, sem referências ao passado. Webern rompeu a melodia, cada nota
era feita por um instrumento diferente, numa espécie de pontilhismo musical,
numa tentativa de serialização tímbrea, destacando-se o espaço antes do tempo. Entre
as suas obras destacam-se Bagatelas (1913), Trio para cordas (1927), A luz dos
olhos (1935) e Variações para piano (1936).
Alban Berg:
aluno de Schönberg entre 1904 e 1910, tinha, no entanto, um conceito mais
amplo, complexo e articulado da forma e do timbre do que o seu mestre. Nos seus
começos foi influenciado por Schumann, Wagner e Brahms, conservando sempre a
sua obra um marcado tom romântico e dramático. Berg usou o dodecafonismo
livremente, alterando as ortodoxas regras que pôs inicialmente Schönberg,
dando-lhe uma particular cor tonal. Entre as suas obras destacam-se as óperas
Wozzeck (1925) e Lulu (1935), além de Suite lírica para quarteto de corda
(1926) e Concerto para violino e orquestra (À memória de um anjo) (1935).
Com a Nova Objetividade e a sua visão mais realista e social
da arte surgiu o conceito de Gebrauschmusik (música utilitária), baseada no
conceito de consumo de massas para elaborar obras de construção simples e
acessíveis para todo o mundo. Eram obras de marcado caráter popular,
influenciadas pelo cabaret e pelo jazz, como o Balé triádico (Triadisches
Ballet, 1922) de Oskar Schlemmer, que conjugava teatro, música, cenografia e
coreografia. Um dos seus máximos expoentes foi Paul Hindemith, um dos primeiros
compositores em criar faixas sonoras para cinema, bem como pequenas peças para
afeicionados e colegiais e obras cômicas como Novidades do dia (Neues vom Tage,
1929). Outro expoente foi Kurt Weill, colaborador de Brecht em diversas obras
como Die Dreigroschenoper ("A Ópera dos Três Vinténs", 1928), na qual
a música popular, de ar cabareteiro e ritmos dançáveis, contribui para
distanciar a música do drama e quebrar a ilusão cênica, remarcando o seu
caráter de ficção.
Ópera
A ópera expressionista desenvolveu-se em paralelo às novas
vias de estudo pela música atonal ideada por Schönberg. O espírito renovador da
mudança de século, que levou todas as artes a uma ruptura com o passado e a
buscarem um novo impulso criador, conduziu este compositor austríaco a criar um
sistema onde todas as notas tivessem o mesmo valor e a harmonia fosse
substituída pela progressão de tons. Schönberg compôs duas óperas nesse
contexto: Moses und Aron (composta desde 1926 e inacabada) e De hoje a manhã
(Von Heute auf Morgen, 1930). Mas sem dúvida a grande ópera do atonalismo foi
Wozzeck (1925), de Alban Berg, baseada na obra teatral de Georg Büchner, ópera
romântica enquanto a temática mais de complexa estrutura musical,
experimentando com todos os recursos musicais disponíveis desde o classicismo
até a vanguarda, do tonal ao atonal, do recitativo a música, da música popular
à música sofisticada de contraponto dissonante. Obra de forte expressão
psicológica, ao tratar de um demente angustiado por imagens paranoicas a música
torna-se também demencial, expressando simbolicamente o interior de uma pessoa
desquiciada, os mais profundos resquícios do inconsciente. Na sua segunda
ópera, Lulu, baseada em duas dramas de Wedekind, Berg abandonou o
expressionismo atonal e mudou para o dodecafonismo.
Um dos principais antecedentes da ópera expressionista foi Os
Marcados (Die Gezeichneten, 1918), de Franz Schreker, ópera de grande
complexidade que requeria uma orquestra de 120 músicos. Baseada num drama
renascentista italiano, era uma obra de temática sombria e torturada,
plenamente imersa no espírito deprimente do pós-guerra. A música era inovadora,
radical, de sonoridade enigmática, com uma coloratura instrumental audaz e
brilhante. Em 1927 Ernst Krenek estreou a sua ópera Jonny ataca (Jonny spielt
auf), que conseguiu um notável sucesso e foi a ópera mais representada do
momento. Com grande influência do jazz, Krenek experimentou com as principais
tendências musicais da época: neorromantismo, neoclassicismo, atonalidade, dodecafonismo.
Considerado como "músico degenerado", em 1938 refugiou-se nos Estados
Unidos, ao tempo que os nazis inauguravam a exposição Entartete Musik (Música
degenerada) em Düsseldorf –em paralelo à amostra de arte degenerada, Entartete
Kunst–, onde atacavam a música atonal, o jazz e as obras de músicos judeus.
Outro grande sucesso foi a ópera O Mistério de Heliane (Das Wunder der Heliane,
1927), de Erich Wolfgang Korngold, obra de certo erotismo com uma esquisita
partitura concebida em escala épica que creia uma grande dificuldade para os
intérpretes. Outras óperas deste autor foram Die Tote Stadt, Der Ring des
Polykrates e Violanta. Com a instauração do Anschluss em 1938, Korngold emigrou
para os Estados Unidos.
Erwin Schulhoff compôs em 1928 a sua ópera Flammen, versão do
clássico Don Juan, com cenografia de Zdeněk Pesánek, pioneiro da arte cinética.
Obra de corte fantástico, percebe-se certa influência do teatro chinês, no que
cabe todo o inimaginável, decorrendo todo tipo de situações paradoxais e absurdas.
Schulhoff abandonou assim as regras teatrais aristotélicas vigentes até então
no teatro e a ópera para um novo conceito de posta em cena, que entende o
teatro como um jogo, um espetáculo, uma fantasia que transborda a realidade e
leva a um mundo de sonhos. Combinando diferentes estilos, Schulhoff afastou-se
da tradicional ópera alemã iniciada com Wagner e culminada no Wozzeck de Berg,
acercando-se por outro lado à ópera francesa, em obras como o Pelléas et
Mélisande de Debussy ou o Cristóvão Colombo de Milhaud.
Berthold Goldschmidt, professor de direção de orquestra da
Berlin Hochschule für Musik, adaptou em 1930 "O Magnífico Cornudo"
(Der gewaltige Hanrei) de Crommelynck, estreada em 1932, se bem que a sua
condição de judeu provocou que fosse imediatamente retirada, emigrando então
para a Grã-Bretanha. Finalmente, Viktor Ullmann desenvolveu a sua obra no campo
de concentração de Theresienstadt (Terezín), onde os nazis provaram um sistema
de "ghetto modelo" para desviar a atenção do extermínio de judeus que
estavam realizando. Com uma grande dose de autogoverno, os reclusos podiam
exercer atividades artísticas, podendo assim compor a sua ópera Der Kaiser Von
Atlantis (1944). Admirador de Schönberg e da "atonalidade romântica"
de Berg, Ullmann criou uma obra de grande riqueza musical inspirada tanto na
tradição como nas principais inovações da música de vanguarda, com uma temática
relativa à morte de grande tradição na literatura musical alemã. Contudo, antes
do seu estreio foi proibida pelas SS, que encontrou certa similaridade entre o
protagonista e a figura de Hitler, e o autor foi enviado ao campo de Auschwitz.
Dança
Ballet russo (1912), de August Macke, Kunsthalle, Bremen.
A dança expressionista surgiu no contexto de inovação que o
novo espírito vanguardista contribuiu para a arte, sendo reflexo de uma nova
forma de entender a expressão artística. Como nas demais disciplinas
artísticas, a dança expressionista implicou uma ruptura com o passado –neste
caso o ballet clássico–, buscando novas formas de expressão baseadas na
liberdade do gesto corporal, liberto das ataduras da métrica e do ritmo, onde
adquire maior relevância a auto-expressão corporal e a relação com o espaço. Em
paralelo à reivindicação naturista que ocorre na arte expressionista –sobretudo
em Die Brücke–, a dança expressionista reivindicou a liberdade corporal, ao
mesmo tempo que as novas teorias psicológicas de Freud influíram numa maior
introspeção na mente do artista, o que se traduziu numa tentativa da dança de
expressar o interior, de libertar o ser humano das suas repressões.
A dança expressionista coincidiu com Der Blaue Reiter no seu
conceito espiritualista do mundo, visando a captar a essência da realidade e
transcendê-la. Rejeitavam o conceito clássico de beleza, o que se expressa num
dinamismo mais abrupto e áspero que o da dança clássica. Ao mesmo tempo,
aceitavam o aspecto mais negativo do ser humano, o que subjaz no seu
inconsciente mas que é parte indissolúvel do mesmo. A dança expressionista não
evitou mostrar o lado mais obscuro do indivíduo, a sua fragilidade, o seu
sofrimento, o seu desamparo. Isto traduz-se numa corporalidade mais contraída,
numa expressividade que inclui todo o corpo, ou até mesmo na preferência por
dançar descalços, o que implica um maior contato com a realidade, com a
natureza.
A dança expressionista foi denominada também "dança
abstrata", pois implicou uma libertação do movimento, afastado da métrica
e do ritmo, paralelo ao abandono da figuração por parte da pintura, ao mesmo
tempo que a sua pretensão de expressar mediante o movimento ideias ou estados
de ânimo coincidiu com a expressão espiritual da obra abstrata de Kandinsky.
Contudo, a presença ineludível do corpo humano provocou uma certa contradição
na denominação de uma corrente "abstrata" dentro da dança.
Um dos máximos teóricos da dança expressionista foi o
coreógrafo Rudolf von Laban, que criou um sistema que visava a integrar corpo e
alma, pondo ênfase na energia que emanam os corpos, e analisando o movimento e
a sua relação com o espaço. As contribuições de Laban permitiram aos dançarinos
uma nova multidirecionalidade em relação ao espaço circundante, ao mesmo tempo
que o movimento se libertou do ritmo, outorgando igual relevância ao silêncio
do que à música. Laban visava igualmente escapar da gravidade buscando
deliberadamente a perda de equilíbrio. Assim mesmo, tentou afastar-se do
aspecto rígido do ballet clássico promovendo o movimento natural e dinâmico do
bailarino.
A principal musa da dança expressionista foi a dançarina Mary
Wigman, que estudou com Laban e teve estreitos contatos com o grupo Die Brücke,
enquanto, durante a Primeira Guerra Mundial, relacionou-se ao grupo dadaísta de
Zurique. Para ela, a dança era uma expressão do interior do indivíduo, fazendo
especial insistência na expressividade frente à forma. Assim outorgava especial
importância à gestualidade, ligada com frequência à improvisação, bem como ao
uso de máscaras para acentuar a expressividade do rosto. Os seus movimentos
eram livres, espontâneos, provando novas formas de se movimentar pelo palco,
arrastando-se ou deslizando-se, ou movimentando partes do corpo em atitude
estática, como na dança oriental. Baseava-se no princípio de tensão-relaxação,
o que procurava maior dinamismo ao movimento. Criou coreografias realizadas
inteiramente sem música, ao mesmo tempo que se libertava das ataduras do
espaço, que em vez de envolver e pegar ao dançarino se converteu numa projeção do
seu movimento, perseguindo aquele anseio romântico de se fundir com o universo.
Depois da guerra, a dança teve uma época de grande auge, pois
o aumento de um público visando esquecer os desastres da guerra comportou uma
grande proliferação de teatros e cabarés. Coreógrafos e dançarinos
expressionistas começaram a viajar por todo o mundo, difundindo os seus
sucessos e ideais e ajudando ao crescimento e consolidação da dança moderna. No
entanto, a crise econômica e o advento do nazismo levaram ao declínio da dança
expressionista. Contudo, as suas contribuições seguiram vigentes na obra de
coreógrafos como Kurt Jooss e bailarinas como Pina Bausch, chegando a sua
influência até a atualidade e evidenciando a contribuição essencial da dança
expressionista para a dança contemporânea.
Cinema
O gabinete do doutor Caligari (1919), de Robert Wiene.
O expressionismo não chegou ao cinema até passada a Primeira
Guerra Mundial, quando já praticamente desaparecera como corrente artística,
sendo substituída pela Nova Objetividade. Contudo, a expressividade emocional e
a distorção formal do expressionismo tiveram uma perfeita tradução à linguagem
cinematográfica, sobretudo graças à contribuição do teatro expressionista,
cujas inovações cênicas foram adaptadas com grande sucesso no cinema. O cinema
expressionista passou por diversas etapas: do expressionismo puro –chamado por
vezes "caligarismo"– evoluiu para um certo neorromantismo (Murnau), e
deste para o realismo crítico (Pabst, Siodmak, Lupu Pick), para terminar no
sincretismo de Lang e no naturalismo idealista do Kammerspielfilm. Entre os
principais cineastas expressionistas caberia destacar-se Robert Wiene, Paul
Wegener, Friedrich Wilhelm Murnau, Fritz Lang, Georg Wilhelm Pabst, Paul Leni,
Josef von Sternberg, Ernst Lubitsch, Lupu Pick, Robert Siodmak, Arthur Robison
e Ewald André Dupont.
O cinema expressionista alemão impôs na pantalha um estilo
subjetivista, que oferecia em imagens uma deformação expressiva da realidade,
traduzida em termos dramáticos mediante a distorção de decorados, maquilhagens,
assim como a conseguinte recriação de atmosferas terroríficas ou, pelo menos,
inquietantes. O cinema expressionista caracterizou-se pela sua recorrência ao
simbolismo das formas, deliberadamente distorcidas com o apoio dos diferentes
elementos plásticos. A estética expressionista tomou as suas temas de gêneros
como à fantasia e ao terror, reflexo moral do angustioso desequilíbrio social e
político que agitou a República de Weimar aqueles anos. Com forte influência do
romantismo, o cinema expressionista refletiu uma visão do homem característica
da alma "fáustica" alemã: amostra a natureza dual do homem, a sua
fascinação pelo mal, a fatalidade da vida sujeita na marra do destino. Podemos
assinalar como finalidade do cinema expressionista o traduzir simbolicamente,
mediante linhas, formas ou volumes, a mentalidade das personagens, o seu estado
de ânimo, as suas intenções, de modo que a decoração apareça como a tradução
plástica do seu drama. Este simbolismo suscitava reações psíquicas
aproximadamente conscientes que orientavam o espírito do espectador.
O cinema alemão contava com uma importante indústria desde o
final do século XIX, sendo Hamburgo a sede da primeira Exposição Internacional
da Indústria Cinematográfica em 1908. Contudo, antes da guerra o nível
artístico das suas produções era mais bem baixo, com produções genéricas
orientadas ao consumo familiar, adscritas ao ambiente burguês e conservador da
sociedade guilhermina. Tão somente a partir de 1913 começaram a ser realizadas
produções de maior relevo artístico, com maior uso de exteriores e melhores
decorados, desenvolvendo a iluminação e a montagem. Durante a guerra a produção
nacional foi potenciada, com obras tanto de gênero quanto de autor,
destacando-se a obra de Paul Wegener, iniciador do cinema fantástico, gênero
habitualmente considerado o mais tipicamente expressionista. Em 1917 foi criado
por ordem de Hindenburg –seguindo uma ideia do general Ludendorff– a UFA
(Universum Film Aktien Gesellschaft), apoiada pelo Deutsche Bank e a indústria
alemã, para promover o cinema alemão fora das suas fronteiras.[139] O selo UFA
caracterizou-se por uma série de inovações técnicas, como a iluminação focal,
os efeitos especiais –como a sobreimpressão–, os movimentos de câmara –como a
"câmara desencadeada"–, o desenho de decorados, etc. Era um cinema de
estudo, com um marcado componente de pré-produção, que assegurava um claro
controle do diretor sobretudo os elementos que incorriam no filme. Por outro
lado, a sua montagem lenta e pausada, as suas elipses temporárias, criavam uma
sensação de subjetividade, de introspeção psicológica e emocional.
As primeiras obras do cinema expressionista nutriram-se de
lendas e antigas narrações de corte fantástico e misterioso, quando não
terrorífico e alucinante: O estudante de Praga (Paul Wegener e Stellan Rye,
1913), sobre um novo que vende a sua imagem refletida nos espelhos, baseada no
Peter Schlemihl de Chamisso; O Golem (Paul Wegener e Henrik Galeem, 1914),
sobre um homem de barro criado por um rabino judeu; Homunculus (Otto Rippert,
1916), precursora nos contrastes em branco e preto, os choques de luz e sombra.
O gabinete do doutor Caligari (Robert Wiene, 1919), sobre uma série de
assassinatos cometidos por um sonâmbulo, converteu-se na obra mestra do cinema
expressionista, pela recriação de um ambiente opressivo e angustioso, com
decorados de aspecto estranhamente anguloso e geométrico –paredes inclinadas,
janelas em forma de flecha, portas cuneiformes, chaminés oblíquas–, iluminação
de efeitos dramáticos –inspirada no teatro de Max Reinhardt–, e maquilhagem e vestuário
que salientam o ar misterioso que envolve todo o filme.
Paradoxalmente, Caligari foi mais o final de um processo que
o começo de um cinema expressionista, pois o seu caráter experimental era
dificilmente assimilável por uma indústria que buscava produtos mais
comerciais. As produções posteriores continuaram com maior ou menor intensidade
a base argumental de Caligari, com histórias geralmente baseadas em conflitos
familiares e uma narração efetuada com flashbacks, e uma montagem oblíqua e anacrônica,
especulativa, fazendo que o espectador interprete a história; por outro lado,
perderam o espírito artístico de Caligari, a sua revolucionária cenografia, a
sua expressividade visual, em favor de um maior naturalismo e plasmação mais
objetiva da realidade.
Ao primeiro expressionismo, de caráter teatral –o chamado
"caligarismo"–, seguiu um novo cinema –o de Lang, Murnau, Wegener,
etc– que se inspirava mais no romantismo fantástico, deixando o expressionismo
literário ou pictórico. Estes autores buscavam uma aplicação direta do
expressionismo ao filme, deixando os decorados artificiais e inspirando-se mais
na natureza. Assim surgiu o Kammerspielfilm, orientado para um estudo
naturalista e psicológico da realidade cotidiana, com personagens normais, mas
tomando do expressionismo a simbologia dos objetos e a estilização dramática. O
Kammerspielfim era baseado num realismo poético, aplicando a uma realidade
imaginária um simbolismo que permite atingir o senso dessa realidade. A sua
estética baseava-se num respeito, embora não total, das unidades de tempo,
local e ação, numa grande linearidade e simplicidade argumental, que fazia
desnecessária a inserção de rótulos explicativos, e na sobriedade
interpretativa. A simplicidade dramática e o respeito pelas unidades permitiam
criar umas atmosferas fechadas e opressivas, nas quais se movimentariam os
protagonistas.
Na década de 1920 aconteceram os principais sucessos do
cinema expressionista alemão: Ana Bolena (Lubitsch, 1920), As três luzes (Lang,
1921), Nosferatu, Eine Symphonie des Grauens (Murnau, 1922), O doutor Mabuse
(Lang, 1922), Sombras (Robison, 1923), Sylvester (Pick, 1923), Os Nibelungos
(Lang, 1923-1924), O homem das figuras de cera (Leni, 1924), As mãos de Orlac
(Wiene, 1924), O último (Murnau, 1924), Bajo a máscara do prazer (Pabst, 1925),
Tartufo (Murnau, 1925), Varieté (Dupont, 1925), Fausto (Murnau, 1926), O amor
de Jeanne Nei (Pabst, 1927), Metropolis (Lang, 1927), A caixa de Pandora
(Pabst, 1929), O anjo azul (Sternberg, 1930), M, o vampiro de Düsseldorf (Lang,
1931).
Desde 1927, coincidindo com a introdução do cinema sonoro,
uma câmbio de direção na UFA comportou um novo rumo para o cinema alemão, de
corte mais comercial, visando a imitar o sucesso conseguido pelo cinema
americano produzido por Hollywood. Para então a maioria de diretores
estabeleceram-se em Hollywood ou Londres, o que comportou o fim do cinema
expressionista como tal, substituído por um cinema cada vez mais germanista que
pronto foi instrumento de propaganda do regime nazi. Contudo, a estética
expressionista incorporou-se ao cinema moderno através da obra de diretores
como Carl Theodor Dreyer, Carol Reed, Orson Welles e Andrzej Wajda.
Fotografia
A fotografia expressionista desenvolveu-se nomeadamente
durante a República de Weimar, constituindo um dos principais focos da
fotografia europeia de vanguarda. A nova sociedade alemã do pós-guerra, no seu
afã quase utópico de regenerar o país após os desastres da guerra, recorreu a
uma técnica relativamente nova como a fotografia para romper com a tradição
burguesa e construir um novo modelo social baseado na colaboração entre classes
sociais. A fotografia da década de 1920 seria herdeira das fotomontagens
antibelicistas criadas pelos dadaístas durante a contenda, e aproveitaria a
experiência de fotógrafos procedentes do leste que pararam na Alemanha após a
guerra, o que levaria para a elaboração de um tipo de fotografia de grande
qualidade tanto técnica como artística.
Assim mesmo, em paralelo à Nova Objetividade surgida após a
guerra, a fotografia tornou-se um meio privilegiado de captar a realidade sem
rodeios, sem manipulação, conjugando a estética com a precisão documental. Os
fotógrafos alemães criaram um tipo de fotografia baseada na nitidez da imagem e
da utilização da luz como meio expressivo, modelando as formas e destacando-se
as texturas. Este tipo de fotografia teve ressonância internacional, gerando
movimentos paralelos como a photographie pure francesa e a straight photography
norte-americana. Houve um grande auge durante esta época da imprensa gráfica e
as publicações, tanto de revistas como de livros ilustrados. A conjunção de
fotografia e tipografia levou a criação do chamado "foto-tipo", com
um desenho racionalista inspirado na Bauhaus. Também tomou importância a
publicação de livros e revistas especializados em fotografia e em desenho
gráfico, como Der Querschnitt, Gebrauchsgraphik e Das Deutsche Lichtbild, bem
como as exposições, como a grande demonstração Film und Foto, celebrada em 1929
em Stuttgart por iniciativa da Deutscher Werkbund, da qual surgiu o ensaio de
Franz Roh Foto-Auge.
O mais destacado fotógrafo expressionista foi August Sander:
estudante de pintura, mudou para a fotografia, abrindo um estudo de retrato em
Colônia. Dedicou-se ao retrato, criando um projeto quase enciclopédico que
visava a catalogar objetivamente o alemão da República de Weimar, retratando
personagens de qualquer estamento social, partindo da premissa de que o
indivíduo é fruto das circunstâncias históricas. Em 1929 apareceu o primeiro
tomo de O rosto do nosso tempo (Antlitz der Zeit), do qual não surgiram mais ao
ser vetado pelos nazistas, que não gostavam da imagem da Alemanha captada por
Sander, ao que destruíram 40 000 negativos. Os retratos de Sander eram frios,
objetivos, científicos, desapaixonados, mas por esse motivo resultavam de uma
grande eloquência pessoal, sublinhando a sua individualidade.
Outros destacados fotógrafos foram: Karl Blossfeldt,
professor de forja numa escola de artes aplicadas, em 1890 começou na
fotografia nomeadamente para obter modelos para os seus trabalhos em metal, especializando-se
em fotografia de vegetais, recopilando o seu trabalho em 1928 com o título
Formas originais da arte (Urformem der Kunst). Albert Renger-Patzsch estudou
química em Dresde, começando na fotografia, da qual deu classes na
Folkwangschule de Essen. Especializou-se na fotografia publicitária, publicando
vários livros sobre o mundo técnico e industrial: em 1927 publicou Die
Halligen, sobre paisagens e gentes das ilhas da Frísia oriental, e em 1928 O
mundo é formoso (Die Welt ist schön). Hans Finsler, especializado em
naturezas-mortas; estudou arquitetura e história da arte, sendo professor em
Halle an der Saale de 1922 a 1932. Criou em Zurique o departamento fotográfico
da Kunst Gewerbeschule, onde se formaram numerosos fotógrafos, como Werner Bischof
e René Burri. Werner Mantz estudou na Bayerische Staatslehranstalt für
Photographie de Munique, especializando-se na fotografia da arquitetura,
ilustrando as principais construções do racionalismo. Entre 1937 e 1938
retratou o mundo dos mineiros em Maastricht. Willy Zielke, de origem polonesa,
estudou fotografia em Munique. Dedicou-se nomeadamente à evolução social e
industrial da Alemanha, rodando um documentário sobre o desemprego operário
(Arbeitlos, 1932), que foi proibido pelos nazistas.
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