Pantocrator.I
O Tipo
Iconográfico do Pantocrátor
Introdução
O tipo
iconográfico de Cristo Pantocrator é um dos mais significativos da iconografia
oriental, e também o mais difundido, a ponto de se tornar quase o único tipo de
Cristo que se encontra não só nas cúpulas e nas absides das igrejas, mas também
sobre selos, moedas, marfins, evangeliários e outros objetos litúrgicos; é
encontrado nas cenas históricas que representam Cristo nos diversos momentos da
sua vida de adulto, nos diversos milagres que constelam a sua missão na
Palestina da época; é encontrado sobretudo em inúmeros ícones oferecidos à veneração
dos fiéis nas iconostases das igrejas e nas casas particulares. Quer esteja
presente em mosaico, em afresco ou em ícones grandes ou pequenos, o tipo
transmite, ao menos do século VI em diante, a mesma e idêntica figura de
Cristo, reconhecível mesmo quando faltam as inscrições que normalmente devem
acompanhá-la; e isso até os nossos dias.
O Cristo
representado em todos os ícones é o Cristo adulto, com trinta anos de idade
mais ou menos. Distingue-se pela mesma estatura do corpo, os mesmos traços
somáticos - em especial os do rosto -, as mesmas roupas: todos esses traços que
convergem num retrato ressaltam a sua figura histórica real; outros traços,
como os símbolos e as inscrições, têm valor de retrato espiritual que põem em
destaque a sua realidade de pessoa atualmente viva, transfigurada, divina e
salvífica.
O ícone
transmite, assim, o dogma cristológico das duas naturezas humana e divina -
unidas na única Pessoa do Verbo: Filho de Deus e Deus ele próprio,
consubstancial ao Pai.
Significado
do nome
A esse tipo
de imagem de Cristo é dado o nome genérico de «Pantocrator» tão rico de
significados. O termo grego, traduzido geralmente por «Onipotente», mas que é
melhor traduzir pela expressão «Oniregente», ou «Aquele que tudo rege», é um
termo que se encontra já na literatura pagã. É encontrado na versão grega dos
Setenta que o retoma para traduzir a expressão «Sabaoth», conferindo-lhe o
significado de Deus «Dominador de todas as potências terrestres e celestes».
No Novo
Testamento, o termo se encontra referido preponderantemente ao Pai, mas já no
Apocalipse refere-se indiretamente também ao Verbo encarnado, Redentor e Juiz
universal (cf. Ap 11, 17; 21, 22). Nas suas Cartas, os apóstolos Pedro e Paulo
propõem o tema do domínio absoluto de Cristo sobre toda a criação. «Jesus
Cristo» - escreve Pedro -, «tendo subido ao céu, está à direita de Deus,
estando-lhe sujeitos os anjos, as Dominações e as Potestades» 1Pd 3, 22). São
Paulo, por sua vez, fala da «submissão de todas as coisas» (1Cor 15, 28) ao
Cristo ressuscitado, afirmando que «para isto Cristo morreu e reviveu: para ser
o Senhor dos mortos e dos vivos» (Rm 14, 9).
Os Padres
da Igreja, que retomam o termo no início do símbolo niceno-constantinopolitano,
aprofundam seu significado e ao mesmo tempo justificam a sua atribuição ao
Filho. Gregório de Nissa, por exemplo, assim explica a riqueza de conteúdos do
termo:
«Quando
ouvimos o termo 'Pantocrator', 'Aquele que tudo rege', compreendemos com a
mente que Deus mantém no ser todas as coisas: tanto as de natureza inteligível
como as de natureza material. Por isso ele contém o universo; por isso tem nas
mãos os confins da terra; pelo mesmo motivo ele avalia os céus com o palmo (d,
1s 40,12); por isso ele mede o mar com a mão; e também por isso abrange em si toda
criatura inteligível, a fim de que todas as coisas permaneçam no ser, contidas
por meio do poder que tudo abraça...»
E
acrescenta:
«Quem é
aquele no qual todas as coisas foram criadas e no qual tudo permanece, em quem
vivemos, nos movemos e somos? Quem possui em si mesmo tudo isto que é do Pai?
Não sabemos ainda, por tudo que foi dito, que aquele que é Deus sobre todas as
coisas, como diz são Paulo, é nosso Senhor Jesus Cristo? Ele tem nas mãos todas
as coisas do Pai, como ele mesmo diz; ele abrange absolutamente tudo com o seu
amplíssimo palmo; ele rege todas as coisas que abrange e ninguém as tira da mão
daquele que tudo rege. Se, pois, ele possui tudo e rege o que possui, quem é
ele senão o Pantocrator, aquele que tudo rege.»
Padre
Carmelo Capizzi, que escreveu a monografia mais completa sobre o Pantocrator,
resume assim o pensamento dos Padres a respeito do termo:
«A
Patrística, fundando-se sobre dados do Antigo e do Novo Testamento e utilizando
algumas noções e expressões da filo helenística, determinou o conceito de
Pantocrator, vendo nesse epíteto divino quatro elementos conceituais: a
'onidominação', a 'onicompreensão', a 'onicontinência', e a 'onipresença'.
Deus, em outras palavras, é Pantocrator porque 'domina sobre toda a criação',
'conserva tudo no ser', 'abrangendo e contendo tudo em si' e, por conseguinte,
'penetrando e enchendo tudo de si', através da sua onipotência. Além disso, a
Patrística tem o mérito de ter ampliado o sujeito de atribuição de Pantocrator,
passando de Deus indistintamente e Deus Pai a uma atribuição consciente e
justificada ao Filho como Logos somente, ao Filho como Logos encarnado e ao
Espírito Santo. Essa extensão foi fundada na identidade de natureza das três
Pessoas divinas, da qual se originava uma verdade que foi formulada
incisivamente por Santo Atanásio: "O mesmo Pai pelo Verbo no Espírito tudo
opera e concede».
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