Encarnação.I
“Tomou-se verdadeiramente um de nós,
semelhante a nós em tudo, exceto no pecado.”
Nos últimos meses tenho pintado muito a imagem de
N.Senhora com o menino Jesus em várias cores e formatos e, sempre me chamou
muito a atenção este grande mistério da Encarnação. "Ele foi manifestado
na carne" (1 Tm 3,16).
Sempre me encanta esta proximidade de Deus com nossa
humanidade, Ele veio viver no meio de nós, assumiu nossa vida, nosso modo de
viver, assumiu um corpo, uma família, um povo, nasceu de uma mulher, revelou-nos
o Pai, apresentou um projeto de vida, como entender tamanha encarnação? “Tende
em vós o mesmo sentimento de Cristo Jesus: Ele tinha a condição divina, e não
considerou o ser igual a Deus como algo a que se apegar ciosamente. Mas
esvaziou-se a si mesmo, assumiu a condição de servo, tomando a semelhança
humana. E, achado em figura de homem, humilhou-se e foi obediente até a morte,
e morte de cruz!” (Fl 2,5-8).
Que deus em outras religiões se aproximou tanto de nós
como nosso Deus em Jesus Cristo? Como entender tamanho amor e cuidado com seu
povo? Acredito que mais que entender é acolher esta verdade: "Nisto
reconheceis o Espírito de Deus. Todo espírito que confessa que Jesus Cristo
veio na carne é de Deus" (1Jo 4,2). Esta é a alegre convicção da Igreja
desde o seu começo, quando canta "o grande mistério da piedade":
"Ele foi manifestado na carne" (1 Tm 3,16). E quais as consequências
em nossa vida desta encarnação de Jesus? Creio que somos também convidados a
fazer este mesmo movimento encarnatório, quer dizer, também assumirmos nossa
realidade, que é sagrada, que está cheia de Deus, cheia de seu Espírito. Como
Ele, em uma realidade concreta, cheia de desafios e contradições, cheia de
belezas e esperanças!
Interessante este processo, por isso o Filho de Deus,
ao tornar-se homem, pôde aceitar "crescer em sabedoria, em estatura e em
graça" (Lc 2,52) e também informar-se sobre aquilo que na condição humana
se deve aprender de maneira experimental. Isto correspondia à realidade de seu
rebaixamento voluntário na "condição de escravo".
Até que ponto compreendemos a força e a atualidade
desta encarnação? Que realmente significa? A que somos chamados? Lembro-me
quase que imediatamente da inspiração inaiciana: “encontrar Deus em todas as
coisas e todas as coisas em Deus.”
Tudo o que Cristo viveu foi para que pudéssemos
vivê-lo nele e para que Ele o vivesse em nós. "Por sua Encarnação, o Filho
de Deus, de certo modo, se uniu a todo homem (a toda mulher)." Nós somos
chamados a ser uma só coisa com Ele; Ele nos faz partilhar (comungar), como
membros de seu corpo, de tudo o que (Ele), por nós e como nosso modelo, viveu
em sua carne. (CIC.521)
Em minhas pinturas tenho encontrado muita consolação
na figura de Maria, que belo exemplo a ser seguido: O título a Maria como Mãe
de Deus foi confirmado no Concílio de Éfeso: “A heresia nestoriana via em
Cristo uma pessoa humana unida à pessoa divina do Filho de Deus. Diante dela,
São Cirilo de Alexandria e o III Concílio Ecumênico, reunido em Éfeso em 431,
confessaram que "o Verbo, unindo a si em sua pessoa uma carne animada por
uma alma racional, se tornou homem". A humanidade de Cristo não tem outro
sujeito senão a pessoa divina do Filho de Deus, que a assumiu e a fez sua desde
sua concepção. Por isso o Concílio de Éfeso proclamou, em 431, que Maria se
tornou de verdade Mãe de Deus pela concepção humana do Filho de Deus em seu
seio: "Mãe de Deus não porque o Verbo de Deus tirou dela sua natureza
divina, mas porque é dela que ele tem o corpo sagrado dotado de uma alma
racional, unido ao qual, na sua pessoa, se diz que o Verbo nasceu segundo a
carne". (CIC.466)
Creio que esta encarnação de Deus na realidade humana
aconteceu ao longo de toda a vida de Jesus, não somente em sua concepção e
nascimento, mas ao longo de todo seu caminho, Jesus foi se encarnando em cada
momento de sua vida, em cada gesto, em cada fala, em cada toque, em cada olhar,
e sempre abraçando, resgatando, salvando a humanidade.
Uma vez
que na união misteriosa da Encarnação "a natureza humana foi assumida, não
aniquilada", a Igreja tem sido levada, ao longo dos séculos, a confessar a
plena realidade da alma humana, com suas operações de inteligência e vontade, e
a do corpo humano de Cristo. Mas, paralelamente, teve de lembrar toda vez que a
natureza humana de Cristo pertence "in proprio" à pessoa divina do
Filho de Deus que a assumiu. Tudo o que Cristo é e o que faz nela depende do
"Um da Trindade". Por conseguinte, o Filho de Deus comunica à sua
humanidade seu próprio modo de existir pessoal na Trindade. Assim, em sua alma
como em seu corpo, Cristo exprime humanamente os modos divinos de agir da
Trindade: [O Filho de Deus] trabalhou com mãos humanas, pensou com inteligência
humana, agiu com vontade humana, amou com coração humano. Nascido da Virgem
Maria, tomou-se verdadeiramente um de nós, semelhante a nós em tudo, exceto no
pecado. (CIC.470)
Luís Renato Carvalho de
Oliveira, SJ
Bogotá – Colômbia/2017.
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