A vida em
Nazaré: descobrir Deus no cotidiano
Texto: Afonso
Murad
Ícone: Pe.
Renato,SJ.
Constantemente
somos bombardeados com o ideal do ser humano como “uma celebridade”, que deve
aparecer o máximo possível. Nos perfil das redes sociais, as pessoas se mostram
jovens e bonitas. Compartilham fotos e vídeos somente de momentos alegres. Por
todo lado se estimula uma super-exposição. Nas igrejas cristãs se espalha a
visão de que a fé exige milagres e manifestações extraordinárias. A meta é o
sucesso na vida profissional, na saúde e na família. Acumular e mostrar muitos
bens de consumo! Ora, se este é o modelo do ser humano feliz, então não se
entende os longos anos silenciosos de Jesus em Nazaré, com Maria e José.
A chamada “vida
oculta” da família de Nazaré nos diz que os frutos mais saborosos da vida
necessitam de tempo para serem semeados, cultivados e amadurecidos. E há certos
tesouros da vida pessoal que não devem se tornar públicos, pois perderiam seu
encanto.
No livro O
cotidiano de Maria de Nazaré, Clodovis Boff diz que na experiência de Maria, o
lugar normal do encontro com o Divino é justamente o cotidiano. Assim, algumas
pinturas representam a Anunciação quando ela se encontra fiando a lã ou tirando
água da fonte. Ninguém podia imaginar o que se passava no reverso divino dessa
vida igual à de todo mundo. Sua existência, seu rosto e até seu nome não tinham
nada de especial no mundo em que vivia: eram comuns a tantas filhas de Israel.
Maria vivia
esse cotidiano de forma extraordinária. Personificava cada evento,
perguntando-se no fundo do coração o que Deus queria lhe dizer. A misteriosa
alquimia para transfigurar sua vida era a meditação amorosa e confiante. Mulher
reflexiva que era, repassava os acontecimentos de cada dia, num coração
impregnado de fé e de amor (Lc 2,19.51). Ela experimentou sua existência com
grande intensidade: a máxima alegria em eventos como a visitação e a
ressurreição de Jesus, e a máxima dor em fatos como a perda no templo e a morte
de Jesus na cruz.
O Papa
Francisco nos diz: “a espiritualidade cristã propõe um crescimento na
sobriedade e capacidade de se alegrar com pouco. É um regresso à simplicidade
que nos permite parar a saborear as pequenas coisas, agradecer as
possibilidades que a vida oferece sem nos apegarmos ao que temos nem
entristecermos por aquilo que não possuímos. Isto exige evitar a dinâmica do
domínio e da mera acumulação de prazeres” (Laudato Si 222). As pessoas que
saboreiam mais e vivem melhor cada momento são aquelas que deixam de petiscar
aqui e ali, sempre à procura do que não têm, e experimentam o que significa dar
apreço a cada pessoa e a cada coisa, aprendem a familiarizar com as coisas mais
simples e sabem alegrar-se com elas (nº 223).
Que Maria
de Nazaré nos ensine a desenvolver a vida simples e centrada no essencial.
Amém!